Cinegrafista é 1º repórter morto em protestos no país; 117 foram agredidos
O cinegrafista Santiago Ilídio Andrade, da “TV Bandeirantes”, cuja morte encefálica foi declarada na manhã desta segunda-feira (10), foi o primeiro profissional da imprensa a morrer durante as manifestações de rua que ocorrem em todo o país desde 2013. Embora esta seja a única morte relatada, a violência contra repórteres, cinegrafistas e fotógrafos, durante e fora dos protestos, tem sido constante.
A Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) analisou 70 casos de agressão deliberada contra jornalistas, que ocorreram entre junho e outubro do ano passado, no pico das manifestações. O estudo recebeu denúncia de 117 casos no total, mas apenas 70 foram considerados "agressões deliberadas", quando os ataques são realizados a despeito da identificação das vítimas como profissionais da imprensa. E 22 jornalistas não foram encontrados para relatar suas experiências.
Segundo o relatório, forças de segurança responderam por 58 ataques (sendo 56 por parte de policiais militares de diversos Estados). Outros 15 casos de agressão foram perpetrados por manifestantes. A capital com maior número de ocorrências foi o Rio de Janeiro, com cinco no total. O repórter do UOL Gustavo Maia é um dos jornalistas agredidos. As agressões incluem intimidação, violência física, tentativa de atropelamento, ataque de cães policiais, furto ou dano de equipamentos (não incluídos carros de reportagem ou sedes de empresas de comunicação) e prisão.
O fotógrafo carioca Douglas Shineidr, do "Jornal do Brasil Online", é uma das vítimas da violência. Em meados de 2013, ele foi atingido por um estilhaço de bala durante a cobertura de protestos no centro do Rio de Janeiro.
"A manifestação estava tranquila até a polícia chegar com bombas de efeito moral, de gás, para despistar os manifestantes, que começaram a revidar com pedras. No meio da fumaça das bombas, fui atingido por spray de pimenta e fiquei desnorteado. Foi quando senti um impacto na minha perna”, contou. “Fui para um lugar fresco, respirar e vi um corte na minha perna, como se fosse uma queimadura e uns estilhaços. Na hora da adrenalina a gente mal sente."
Brasil: inseguro para jornalistas
Apesar da crescente violência contra jornalistas durante as manifestações, fora delas, o Brasil também está longe de ser um território considerado seguro para os profissionais da área. Foram cinco mortes apenas no ano passado, segundo a ONG Repórteres sem Fronteiras. Para termos de comparação, o país com o maior número de vítimas é a Síria, com dez mortes no mesmo período. O Brasil, no entanto, está apenas duas mortes abaixo dos quintos colocados (Paquistão e Somália, empatados com sete fatalidades). Até 2013, o país figurava entre os cinco primeiros no mundo.
Shineidr, que conhecia Andrade, se lembra de ter testemunhado diversos episódios de violência contra jornalistas durante a cobertura das manifestações em 2013. "A maioria das provocações contra os jornalistas eram de manifestantes, não da polícia. Eles ameaçavam, gritavam, botavam a gente para correr mesmo. Eu vi muito jornalista, fotógrafo, correndo, todo mundo com medo”, afirma. “Os rojões, a gente não sabe de onde vem, como vem, mas estamos lá, no meio do fogo cruzado, vulneráveis."
Em nota, a Abraji lamentou a morte do cinegrafista e afirma que, desde junho de 2013, “alerta para a escalada de violência e violações contra profissionais da imprensa. A violência sistemática contra profissionais da imprensa constitui atentado à liberdade de expressão. É preciso que o Estado (Executivo e Judiciário) identifique, julgue e puna os responsáveis pelos ataques".
Entenda o caso
O cinegrafista Santiago Ilídio Andrade foi ferido durante a cobertura dos protestos na última quinta-feira (6), no centro do Rio de Janeiro. No mesmo dia, passou por uma neurocirurgia para estancar o sangramento e estabilizar a pressão intracraniana. Na manhã desta segunda-feira foi declarada sua morte encefálica.
O estudante Fábio Raposo, que aparece em imagens segurando o artefato que atingiu Santiago, foi preso pela Polícia Civil e indiciado por homicídio qualificado. Se condenado, ele pode receber uma pena de mais de 30 anos de prisão.
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