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A cada manifestação, MPL e Polícia Militar mudam de estratégia

MPL marcou para terça-feira nova manifestação contra reajuste das tarifas de transporte coletivo -  Alex Falcão/Futura Press/Folhapress
MPL marcou para terça-feira nova manifestação contra reajuste das tarifas de transporte coletivo Imagem: Alex Falcão/Futura Press/Folhapress

Flávio Costa*

Do UOL, em São Paulo

16/01/2016 06h00

Em cada um dos três atos contra o aumento da tarifa de transporte coletivo em São Paulo ocorridos em janeiro, o Movimento Passe Livre e a Polícia Militar mudaram suas estratégias. No primeiro grande protesto da sexta-feira (8) houve confronto entre black blocs e policiais militares. O segundo, da terça-feira (12), foi marcado por cenas de repressão policial. Já na última de quinta-feira (14), não houve violência durante as passeatas. O principal caso de tumulto foi registrado apenas após o fim do protesto já na dispersão da passeata da avenida Paulista, quando oito pessoas foram presas sob acusação de vandalismo na estação do metrô Consolação.

Até o último protesto, o MPL só revelava os trajetos minutos antes do começo de cada passeata, postura adotada pela organização desde as grandes mobilizações iniciadas em junho de 2013. Porém, dessa vez, a organização decidiu divulgar no Facebook os percursos das passeatas que começaram no Theatro Municipal (centro) e no largo da Batata (zona oeste), apesar de não informar oficialmente à polícia. O movimento também decidiu fazer duas grandes concentrações com passeatas para diferentes direções, ao contrário dos dois primeiros. 

"Nossa decisão de divulgar o trajeto era para deixar claro que se a manifestação não seguisse seu caminho seria por culpa exclusiva da Polícia Militar, que já havia impedido, de maneira autoritária, a realização dos atos anteriores" disse o estudante de ciências sociais Matheus Preis, integrante do MPL responsável por negociar o andamento das passeatas com os representantes da PM.

No ato de terça (12), que acabou com várias bombas disparadas pela PM e a passeata não chegou a ocorrer, os black blocs estavam mais contidos que no primeiro ato, quando eles puxavam de maneira mais ostensiva a passeata. Essa diferença se deveu também à própria ação da polícia que não deixava manifestantes se aproximarem da concentração na praça dos Ciclistas e intensificou as revistas.

Por parte da Polícia Militar, era possível perceber a mudança de postura na quinta-feira, com os policiais mais contidos. Além de não interferirem no trajeto divulgado pelo MPL, os policiais militares evitavam, por diversas vezes, o confronto físico com os integrantes da linha de frente da manifestação.

"A vanguarda e retaguarda da PM mantinham uma distância considerável dos manifestantes. Os agentes da Caep (Companhia de Ações Especiais, conhecida como "Tropa do Braço") ladeavam o protesto, mas permitiam o fluxo lateral de pessoas e não demonstravam uma atitude de combate", afirma Josias Filho, da organização civil Observadores Legais, que monitora desde 2014 o comportamento das forças de seguranças em manifestações de rua.

Por outro lado, poucos militantes mostravam uma postura de confronto na quinta-feira. No primeiro ato, no dia 8, era possível notar que os blacks blocs constituíam a linha de frente das manifestações, usando ostensivamente máscaras e roupas com símbolos de grupos radicais. Pelo menos cinco deles improvisavam escudos feitos com portas de guarda-roupas de madeira.

Já no dia 12 (segundo ato), eles se limitaram a usar máscaras e roupas de tom escuro.

PM deteve 30 pessoas

Nos protestos dos dias 8 e 12, trinta pessoas foram detidas pela Polícia Militar. O MPL marcou o primeiro ato para a véspera do reajuste da tarifa. A passeata começou no Theatro Municipal e foi interrompida cerca de 40 minutos depois na avenida 23 de maio, quando um grupo de blacks blocs pulou para a pista no sentido norte, que estava liberada para carros.

Neste momento, policiais militares saíram de sua formação e dispararam bombas de gás lacrimogêneo. Os blacks blocs revidaram com pedras. Os confrontos se estenderam pelo centro da cidade e resultaram na prisão de 17 pessoas.

O segundo ato na última terça-feira (12) não chegou propriamente a acontecer. A passeata começaria na praça do Ciclista, entroncamento da avenida Paulista com avenida Rebouças e com a rua da Consolação. Porém a Polícia Militar organizou um "envelopamento" dos manifestantes ao cercar todas as ruas do local com objetivo de levá-los na direção da Consolação.
 
 
Quem estava de máscara, mochila ou mesmo de rosto pintado era revistado pelos policiais militares e, por vezes, impedidos de juntar ao protesto. A atitude da Polícia Militar em relação aos profissionais de imprensa era de visível hostilidade. Nove jornalistas acabaram feridos.
 
Enquanto, as lideranças do MPL insistiam em seguir para avenida Rebouças, PMs dispersaram com bombas e balas de borracha as duas mil pessoas reunidas, sob alegação de que os blacks blocs tentaram furar o bloqueio policial. 
 
A partir daí houve perseguição da PM em carros e motos pelas ruas do centro e do bairro de Higienópolis. Treze pessoas foram presas e pelo menos 40 ficaram feridas.
 
Para o doutor em Filosofia e professor da USP (Universidade de São Paulo), Pablo Ortellado, que acompanha e pesquisa os protestos do MPL, houve realmente uma mudança significativa principalmente entre os dois primeiros atos do movimento este mês e os dois últimos.
 
“Nas duas primeiras manifestações, a ação da PM foi muito violenta, ameaçadora. Essa atitude desencadeou muitos tumultos na região do centro”, disse. Segundo Ortellado, a ação “flagrantemente abusiva” da PM na terça-feira e a consequente repercussão negativa fez com que a corporação tivesse um comportamento diferente na quinta, sem “violência explícita” – ele lembra, no entanto, que houve denúncias de abusos em abordagens realizadas após a dispersão do protesto no Butantã.
 
Quanto ao MPL, o professor lembra que o movimento sempre teve a estratégia de fazer manifestações grandes, ocupando as ruas como forma de pressionar o poder público.
 
Responsável pela operação da PM durante a passeata na zona oeste, a tenente-coronel Dulcinéia Lopes afirma que a divulgação do trajeto foi responsável pela ausência de confrontos na quinta-feira.
 
“Houve uma negociação, um cumprimento de itinerário, a PM estava preparada para qualquer tipo de ação. Eu acredito que, como a negociação foi positiva, isso facilitou muito. Quando começa a acontecer a quebra dos acordos que foram firmados no início, isso gera um estresse", disse a oficial da PM.
 
A próxima manifestação está marcada para a próxima terça-feira (19), com ponto inicial na esquina da avenida Faria Lima com avenida Rebouças (zona oeste). O MPL não confirma se manterá a divulgação prévia do trajeto pelas redes sociais. O secretário Alexandre de Moraes já declarou à imprensa que as manifestações terão o trajeto decidido pela Polícia Militar, quando não houver divulgação prévia dos organizadores. (Colaborou Bernardo Barbosa)