Violência cresce no RS com falta de investimentos e atrasos nos salários
Com os salários parcelados há seis meses e investimentos de infraestrutura na área de segurança congelados há um ano e meio, os indicadores da violência urbana dispararam no primeiro semestre de 2016 no Rio Grande do Sul.
Dados divulgados pela SSP (Secretaria de Segurança Pública) do Estado apontam que o número de latrocínios (roubo seguido de morte) avançou 35% em um ano – passando de 66 registros entre janeiro e junho de 2015 para 89 casos nos primeiros seis meses deste ano.
Outros indicadores também tiveram altas significativas, entre eles o roubo com arma – a modalidade alcançou quase 45 mil registros, o que representa 245 assaltos por dia no Estado.
A alta na estatística de crimes violentos tem preocupado os especialistas em segurança pública. Se for considerada a série histórica, iniciada em 2003, é o maior índice de latrocínios já registrado no Rio Grande do Sul. Em Porto Alegre, segundo os dados da SSP, um carro foi roubado por hora em 2016.
“Isso revela uma política fracassada de combate ao porte de arma, que está por trás tanto de latrocínios quanto de roubos qualificados e roubos de veículos. Todos são crimes violentos e com suporte de armamento”, avalia o sociólogo Rodrigo de Azevedo, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. “E combate à criminalidade se faz com polícias bem preparadas e equipadas”, completou.
Outra ocorrência comum, o roubo qualificados de veículos passou de 9.000 ocorrências no primeiro semestre deste ano contra pouco mais de 7.000 no mesmo período do ano passado – aumento de 15%. O número de furtos em veículos, crime de menor impacto violento, teve alta de 2,5% e registrou cerca de 200 ocorrências além dos registros de 2015.
Os homicídios dolosos (com intenção de matar) aumentaram 6%, passando de 1.203 casos no primeiro semestre de 2015 para 1.276 neste ano. Outra ocorrência comum, o roubo de veículos chegou a quase 10 mil ocorrências no primeiro semestre.
Em compensação, crimes menos violentos, como furto, tiveram seus registros reduzidos em 2016. Foram 2.000 ocorrências a menos no primeiro semestre deste ano em relação ao mesmo período de 2015.
Em julho, o governo gaúcho parcelou pela sexta vez neste ano os salários dos servidores públicos – a primeira parcela, depositada no dia 29, chegou a R$ 950 em três depósitos separados. A medida provocou uma paralisação dos serviços essenciais do Estado, incluindo segurança e educação, no último dia 4 de agosto.
A falta de investimentos no setor também é a explicação do Sindicato dos Escrivães, Inspetores e Investigadores de Polícia do Rio Grande do Sul para a recente escalada dos crimes violentos.
Segundo o presidente da entidade, Isaac Ortiz, os recursos aportados pelo governo no combate à criminalidade desde 2015 “beiram o ridículo”. Segundo o sindicato, o investimento no quesito obras e instalações na SSP caiu de R$ 123 milhões em 2014 para R$ 9,4 milhões no ano passado – primeiro ano de gestão do governador José Ivo Sartori (PMDB).
No quesito equipamentos e materiais permanentes, usados na linha de frente do combate à criminalidade, o investimento caiu de R$ 92,9 milhões para R$ 39,3 milhões. Além da redução no volume de recursos e do parcelamento de salários, as horas extras foram suspensas. Os cortes foram provocados pelo desequilíbrio financeiro do Rio Grande do Sul e atingiram outras áreas essenciais, como saúde e educação.
Na Brigada Militar, também há insatisfação com o baixo volume de recursos. A Abamf (Associação dos Cabos e Soldados) alega que o número de pedidos de aposentadoria quase que dobrou nos primeiros meses do ano, elevando o deficit da corporação a mais de 15 mil vagas.
Segundo o presidente da entidade, Leone Lucas, a BM deveria ter um efetivo de 37 mil homens e mulheres. O atual contingente varia entre 20 mil e 21,5 mil – o menor em 30 anos. “Se o ritmo de pedidos (de aposentadoria) continuar o mesmo até o final do ano, vamos fechar 2016 com 3.000 policiais indo para a reserva. Nunca esse contingente foi tão grande, ainda mais quando as nomeações de concursados estão congeladas”, diz.
No final de junho o governador anunciou um aporte de R$ 167 milhões para a área de segurança, mas frustrou as expectativas dos agentes do setor porque a maior parte dos recursos foi direcionada para o sistema penitenciário – cujo déficit beira as 10 mil vagas. A BM receberá para reequipamento e contratações, segundo o plano, R$ 14,8 milhões; a Polícia Civil, meros R$ 5 milhões.
O consultor em segurança e direitos humanos Marcos Rolim diz que não é apropriado nem sequer falar em crise da segurança pública no Estado. Para ele, mais correto seria classificar o momento como de “falência” de um modelo.
“Em um ano e meio de governo, nem mesmo um diagnóstico simples dos entraves no setor foi apresentado à sociedade. Pelo contrário, os gestores continuam lidando com boletins de ocorrência obsoletos e ignorando o alto índice de subnotificações”, critica.
Segundo o especialista, as instituições de segurança deveriam melhorar as informações para aumentar a eficiência dos efetivos, já que eles são insuficientes. “Ferramentas básicas para alocação de pessoal, como o georreferenciamento e a identificação dos chamados ‘hot spots’, seguem desprezadas pelas autoridades gestoras”, diz.
Em nota, a secretaria reconheceu a piora nos indicadores de criminalidade, mas destacou a disposição do governo em investir recursos extraordinários no setor, “no aporte de horas extras e diárias, reaparelhamento, convocação de novos policiais e abertura de concursos”. Segundo a SSP, as horas extras e as diárias já foram autorizadas e estão à disposição das instituições.
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