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Secretário de Segurança forneceu aparelho para gravação ilegal de desembargadores, diz MP

Maurício Teles Barbosa, secretário de Segurança Pública da Bahia - Secretaria da Segurança Pública/BA
Maurício Teles Barbosa, secretário de Segurança Pública da Bahia Imagem: Secretaria da Segurança Pública/BA

Flávio Costa

Do UOL, em São Paulo

22/08/2017 18h19Atualizada em 22/08/2017 21h20

Promotores do MP-BA (Ministério Público da Bahia) afirmam em documento judicial que o secretário da Segurança Pública, Maurício Teles Barbosa, deve ser investigado por "possível infração penal e ato de improbidade administrativa" por ter fornecido um "aparelho de registro velado de áudio e vídeo" a uma suposta vítima de extorsão de dois desembargadores baianos. Com esse aparelho, a vítima teria gravado conversas e encontros com os magistrados.

Diferentemente do que foi publicado anteriormente, o secretário não foi denunciado ao TJ-BA (Tribunal de Justiça da Bahia). Os promotores do Gaeco (Grupo de Combate ao Crime Organizado) pediram à Justiça baiana que o caso fosse encaminhado à Procuradoria-Geral de Justiça para que fosse averiguado "suposto ilícito".

De acordo com a avaliação desses promotores, Barbosa teria cometido ilegalidade por agir sem autorização judicial em um caso que envolvia magistrados com foro privilegiado.

Em nota à imprensa, a SSP-BA (Secretaria da Segurança Pública da Bahia) rebateu: "Nenhum 'grampo' foi realizado contra desembargadores baianos. A pasta foi procurada por uma pessoa que se apresentou como vítima de extorsão, segundo ela cometida por um advogado. Ela foi orientada a reunir indícios que comprovassem a denúncia" (leia a nota completa abaixo).

Na tarde desta terça-feira (22), o caso se tornou público por meio de um discurso do deputado estadual Soldado Prisco (PPS), que pediu a abertura de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) na Assembleia Legislativa da Bahia. Procurado pela reportagem, o TJ-BA ainda não se manifestou sobre o assunto.

"Um fato como esse, um grampo ilegal, é um negócio absurdo. Eu espero que todos os parlamentares da Casa assinem a requisição para a abertura da CPI, para que se busque a verdade e casos como não voltem a acontecer", afirmou Prisco. Líder de greves da Polícia Militar baiana, ele faz parte do bloco de oposição ao governo de Rui Costa (PT).

Ação contra desembargadores aposentados

O caso remete à ação penal contra os atualmente desembargadores aposentados Daisy Lago Ribeiro Coelho e Clésio Rômulo Carrilho Rosa. O caso foi divulgado pelo UOL em março deste ano. Ambos foram acusados pelo MP-BA dos crimes de concussão, falsidade ideológica e concurso de pessoas, por pedirem propina em troca de uma sentença favorável numa disputa judicial avaliada em pelo menos R$ 500 milhões.

O MP-BA afirma, em denúncia oferecida à 2ª Vara Criminal de Salvador, que os ex-desembargadores "utilizaram-se dos cargos que ocupavam para exigir 5% de propina, em benefício de cada um deles, para conceder uma decisão favorável em uma ação de inventário estimada em mais de R$ 500 milhões".

Suposta vítima procurou secretário

Antes de procurar o MP-BA, a suposta vítima dos magistrados, Marcus Vinícius Souza Soares, teria se encontrado com Barbosa, que, após ouvir a denúncia, entregou um aparelho de "registro velado de áudio e vídeo". Desta forma os magistrados teriam sido gravados sem a autorização da Justiça. A entrega foi feita pelo superintendente de Inteligência da SSP (Secretaria da Segurança Pública da Bahia), Rogério Magno de Almeida Medeiros.

Daisy Lago e Clésio Carrilho - Reprodução - Reprodução
Daisy Lago e Clésio Carrilho: ex-desembargadores são acusados de pedirem propina
Imagem: Reprodução

"Os indícios dão conta que as citadas autoridades teriam cedido a particular, extraoficialmente, equipamentos que efetuam o registro velado de áudio e vídeo, pertencentes ao Poder Público e destinados à utilização em atividades de inteligência e investigação criminal", afirmam os promotores em denúncia enviada ao TJ-BA, em 24 de maio deste ano.

"Não bastasse isso, o equipamento teria sido empregado para registrar a prática de infração penal por autoridades que, à época, gozavam de prerrogativas de foro junto ao Superior Tribunal de Justiça, sendo esses registros efetuados sem prévia autorização judicial."

De acordo com o entendimento do MP-BA, Barbosa deveria ter encaminhado a suposta vítima para o MPF (Ministério Público Federal).

Delegado federal de carreira, o secretário Maurício Barbosa assumiu a a SSP-BA em janeiro de 2011. Antes, ele havia chefiado a Superintendência de Inteligência.

Ao ascender ao cargo de secretário, ele nomeou pessoas de sua confiança para o setor, a exemplo do atual superintendente de Inteligência, Rogério Magno de Almeida Medeiros, que é agente da Polícia Federal.

Filho de um almirante da Marinha e com fortes ligações com o ex-governador Jaques Wagner (PT), Barbosa chegou a ser cotado, ainda no governo Dilma, para assumir a Secretaria Nacional de Segurança Pública, ligada ao Ministério da Justiça.

Operação Leopoldo

Em outubro do ano passado, os dois ex-magistrados foram conduzidos coercitivamente para prestarem depoimentos a promotores que compõem o Gaeco do MP-BA durante a deflagração da Operação Leopoldo. De acordo com o MP-BA, a investigação do Gaeco somente começou quando os desembargadores já estavam aposentados e, por essa razão, não possuíam mais foro privilegiado.

O nome da operação é uma referência direta ao espólio de Leopoldo Batista de Souza, cujos herdeiros brigam judicialmente, desde meados da década de 1990, com o Bradesco, sucessor do Banco Econômico --primeira instituição financeira de grande porte a ser liquidada após o lançamento do Plano Real. Ao morrer, Leopoldo tinha créditos a receber do antigo banco. Seus familiares buscam na Justiça que o Bradesco assuma essa dívida.

Pelos cálculos contidos no processo, os créditos variavam entre R$ 500 milhões e R$ 940 milhões.

Barbosa nega irregularidade

Leia abaixo nota completa da SSP-BA:

"A Secretaria da Segurança Pública esclarece que nenhum 'grampo' foi realizado contra desembargadores baianos. A pasta foi procurada por uma pessoa que se apresentou como vítima de extorsão, segundo ela cometida por um advogado. Ela foi orientada a reunir indícios que comprovassem a denúncia.

Ressalta ainda que, como ocorre em situações semelhantes, foi disponibilizado um gravador de voz simples, equipamento de comum utilização em investigações, no entanto, nenhum arquivo de áudio foi apresentado à polícia, sendo devolvido posteriormente.

Esclarece ainda que a Corregedoria-Geral está acompanhando o caso e se coloca à disposição do Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado do Ministério Público para quaisquer esclarecimentos, ressaltando que todas as ações realizadas no caso foram executadas dentro da lei, sendo todas as provas desta conduta remetidas à Justiça, após a conclusão da Corregedoria.

A SSP reforça que é atribuição da polícia investigar toda e qualquer denúncia e que estranha um documento sigiloso ser abertamente divulgado, não só nos meios de comunicação, como utilizado para fins políticos, podendo, inclusive, atrapalhar as investigações."