Carro que fura bloqueio merece tiro? Especialistas apontam erros da PM em abordagem na Rocinha
Uma turista espanhola foi morta na favela da Rocinha, nesta segunda-feira (23), após o carro onde ela estava furar uma ordem de parada de policiais militares que estavam no interior da comunidade, segundo a versão da PM. Especialistas ouvidos pelo UOL afirmam que o uso da arma de fogo só é recomendado para revidar agressão injusta cometida contra o próprio agente ou a terceiros.
O ex-comandante da Polícia Militar coronel Ibis Pereira considera que a decisão de um dos policiais de atirar contra o veículo foi equivocada, já que o carro não representava perigo. No entanto, o coronel destacou fatores externos que acabam interferindo na atitude do policial.
“Não era para atirar, a não ser que o veículo colocasse em risco os PMs ou terceiros, ou que integrantes efetuassem disparos. Fora isso é reprovável. Mas temos que observar também o contexto. Entre a determinação legal e o mundo dos fatos entra o elemento estresse”, afirma Pereira.
Ele lembra que, nesta segunda pela manhã, a região registrou tiroteios --dois PMs e um suspeito foram baleados--, “o que contribui para a tensão psíquica, física do agente”. “Isso pode ter contribuído para este tipo de comportamento. A investigação vai avaliar isso. É preciso saber também a quanto tempo aquela tropa estava no local. Enfim, é preciso analisar toda a circunstância também”, diz.
Maria Esperanza, 67, foi atingida no pescoço e chegou a ser socorrida, mas morreu antes de chegar ao hospital Miguel Couto, na Gávea, também na zona sul do Rio. Segundo a Polícia Civil, os disparos foram efetuados por policiais militares.
O especialista em segurança pública Paulo Storani, ex-capitão do Bope (Batalhão de Operações Especiais) e mestre em Antropologia Social pela Universidade Federal Fluminense, avalia que, mesmo em situação de agressão, a primeira decisão do policial não deve ser atirar.
“Mesmo estando sob grave ameaça, o policial ainda precisa avaliar a conveniência e a oportunidade de usar essa força letal em razão das possíveis consequências do seu uso. O disparo naquela região, considerando-se a movimentação de pessoas, foi, sim, equivocado.
Em nota, a Polícia Militar reforça que os policiais não deveriam ter atirado, mas perseguido o veículo, e diz que, assim como as demais forças de segurança do país, segue os procedimentos estabelecidos no Manual de Abordagem.
“O referido manual determina que, em casos como o que ocorreu nesta data, os policiais não devem efetuar disparos, mas sim perseguir o veículo que não obedeceu a ordem de parar e bloquear sua passagem assim que for possível. A razão pela qual o procedimento não foi cumprido é também objeto da investigação em curso.”
PMs suspeitos estão presos
A Polícia Militar do Rio de Janeiro determinou a prisão em flagrante, nesta segunda, de dois PMs --um oficial e um soldado. O policial militar responsável pelo disparo contra o veículo que teria furado o bloqueio, já foi identificado. As armas foram recolhidas para perícia no Centro de Criminalística da Polícia Militar.
Os dois militares foram encaminhados para a unidade prisional da PM, em Niterói, na região metropolitana do Rio. Os nomes deles não foram divulgados. "Após análise do fato, caberá ao Ministério Público Militar do Estado do Rio de Janeiro decidir os rumos da investigação", informou a corporação, em nota.
De acordo com comunicado da PM, o caso ocorreu por volta das 10h30. O veículo usado era um Fiat Fremont que foi atingido na localidade conhecida como Largo do Boiadeiro. Somente após a abordagem, os PMs verificaram que se tratava de um veículo para transporte de turistas.
Confronto na comunidade
Uma hora antes de a turista ser baleada, dois policiais militares foram feridos durante confrontos com traficantes. Um dos agentes foi ferido na cabeça de raspão e está em estado grave. O outro foi atingido no tórax e está fora de perigo.
Um criminoso baleado também foi encontrado por agentes da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da comunidade. Ele acabou reconhecido por agentes do Batalhão de Choque como um dos envolvidos na troca de tiros.
Tensão na Rocinha dura mais de um mês
A Rocinha vive uma rotina confrontos há mais de um mês. A violência e a tensão na comunidade se intensificaram com a disputa do território por traficantes. O grupo de Rogério Avelino, o Rogério 157, e o do seu antigo chefe, Antônio Bonfim, o Nem, que está em um presídio federal, disputam o controle do tráfico de drogas da região.
Após frequentes confrontos, as Forças Armadas foram acionadas e cercaram a comunidade, junto com tropas policiais. Rogério 157 e seus comparsas deixaram a comunidade através da área de mata atrás da Rocinha. Nesta segunda, o prefeito Marcelo Crivella pediu o retorno das Forças Armadas à Rocinha.
“O Exército tem que voltar”, afirmou Crivella ao ser questionado sobre o tema. A declaração foi dada durante evento para entrega de registros de imóveis na zona oeste da cidade.
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