O que foi testado na reconstituição das mortes de Marielle e Anderson?
A reconstituição do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e de seu motorista Anderson Gomes testou se os fatos relatados por testemunhas do crime à polícia são plausíveis e se aconteceram da forma narrada. Foram simulados a movimentação dos veículos na hora do ataque, o tipo de arma usada e a forma como o matador atirou.
Segundo a polícia, o processo é importante para tirar dúvidas sobre a dinâmica do crime, já que não há imagens de câmeras de segurança disponíveis. A simulação deve ajudar ainda a reforçar as evidências e testemunhos colhidos em uma eventual fase de julgamento do caso, quando suspeitos podem ser acusados.
A reconstituição foi baseada nos relatos da testemunha-chave do assassinato, a assessora que estava no carro com Marielle e Anderson e sobreviveu aos disparos, e também de testemunhas que estavam próximas ao local do crime na noite de 14 de março.
Marielle, Anderson e a assessora se deslocavam de carro pelo centro do Rio após participarem de uma reunião política quando um veículo com homens armados emparelhou e efetuou disparos.
Essas testemunhas voltam no cenário do crime e é importante através das percepções auditivas e visuais delas reconstruir toda a dinâmica do crime
Giniton Lages, delegado da Divisão de Homicídios do Rio de Janeiro
Porém, a reconstituição em si não é suficiente para identificar e acusar eventuais culpados. A maior aposta da Polícia Civil para obter provas técnicas é comparar fragmentos de impressões digitais achadas em cápsulas de projéteis encontradas no local do crime com impressões digitais de possíveis suspeitos, segundo afirmou ao UOL uma fonte da polícia.
Uma comparação positiva pode ligar pessoas investigadas pela polícia com o local do crime e resultar em prisões. O material produzido na reconstituição é importante então para reforçar eventual acusação.
Veja a seguir os principais aspectos testados na reprodução simulada:
Submetralhadora (a arma)
Segundo o delegado Lages, um dos objetivos da reconstituição era pedir que as testemunhas se lembrassem do barulho dos tiros na noite do crime para ajudar a identificar a arma usada no assassinato.
Foram usadas munições reais de calibre 9 mm, disparadas contra um carro semelhante ao que estavam as vítimas. As testemunhas eram então convidadas a comparar os sons com suas lembranças da noite dos assassinatos.
A principal hipótese da polícia é que uma submetralhadora MP5, da fabricante alemã HK, foi a arma que matou a vereadora e o motorista.
O relato das testemunhas também pode ajudar a esclarecer qual era a habilidade do criminoso para utilizar esse armamento. A polícia investiga se o crime foi cometido por matadores “profissionais” e se tinham algum tipo de treinamento.
Tiros e rajadas (a forma dos disparos)
A polícia acredita que ao menos 13 projéteis foram disparados contra o carro em que as vítimas estavam na noite do crime --quatro tiros atingiram Marielle na cabeça. A reconstituição tentou esclarecer como esses tiros foram disparados: um a um, em um modo de disparo semiautomático, ou na forma de uma ou de duas rajadas.
A submetralhadora MP5 dispõe de três diferentes modos de disparos: um tiro para cada vez que o gatilho é apertado, três tiros de cada vez ou rajada contínua. Todas essas modalidades de tiro foram testadas na reconstituição. Mas, os sons dos disparos que podiam ser ouvidos no local sugeriam também que armas diferentes podem ter sido utilizadas.
Entre 2h50 e 4h, os peritos realizaram seis episódios de disparos, entre eles: duas rajadas curtas, um tiro único, uma rajada longa, três tiros em sequência e rajadas possivelmente com diferentes tipos de armas.
Foram simuladas as situações narradas previamente pelas testemunhas. Mas elas também teriam sido convidadas a opinar sobre a cadência dos tiros que ouviram na noite do assassinato para que a perícia conseguisse identificar o cenário mais provável.
Movimentação de carros
Imagens de câmeras de segurança mostram que ao menos dois carros com homens suspeitos seguiram o carro onde estavam as vítimas.
Porém, apenas um dos veículos (um Cobalt prata) teria emparelhado com o carro da vereadora e efetuado os disparos. Durante a reconstituição os peritos usaram dois carros semelhantes ao de Marielle e ao dos bandidos para simular a posição de cada veículo na hora do ataque.
A possível rota de fuga dos criminosos também foi avaliada --o carro de Marielle foi atacado pouco depois de o carro entrar na rua Joaquim Palhares vindo da rua João Paulo I, no Estácio. Os criminosos teriam fugido pela rua Joaquim Palhares.
Apoio do Exército
A Polícia Civil não conseguiu cuidar de toda a organização da reconstituição do assassinato de Marielle e teve que pedir ajuda do Exército para viabilizar a simulação, segundo fontes ligadas à intervenção federal afirmaram ao UOL. Cerca de 200 PMs e militares foram mobilizados.
Militares foram mobilizados durante a manhã de quinta-feira (10) e na parte da tarde já protegiam a região. Eles instalaram grandes barreiras de plástico preto para evitar que as identidades de testemunhas e o trabalho da polícia fossem vistos pelo público e pela imprensa.
Eles também instalaram refletores de luz e barreiras com sacos de areia para evitar que os tiros atingissem imóveis da vizinhança ou ferissem algum envolvido na reconstituição.
Parte dos militares atuou à paisana para não chamar atenção. A reprodução simulada mobilizou tantos esforços porque o crime vem sendo tratado como político e o desfecho das investigações deve impactar diretamente a intervenção federal no Rio.
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