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País perdeu controle dos presídios e facções garantem vida de presos, diz ministro da Segurança

O ministro Raul Jungmann reconhece que o crime domina o sistema prisional - Mateus Bonomi/Estadão Conteúdo
O ministro Raul Jungmann reconhece que o crime domina o sistema prisional Imagem: Mateus Bonomi/Estadão Conteúdo

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

06/09/2018 04h02

Com mais de 700 mil presos espalhados por delegacias e presídios superlotados, o Brasil deixou de garantir a segurança das pessoas atrás das grades e a missão cabe hoje às facções criminosas. A afirmação é do próprio ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, dada após evento na última quinta-feira (30), com procuradores e promotores responsáveis pela investigação de organizações criminosas de todo o país.

"O crime domina o sistema prisional porque o poder público não garante a vida dele [do preso]", disse Jungmann. "Quem garante, lá dentro, é a facção."

Na avaliação do ministro, o aperto financeiro, uma vez que o detento está preso, o torna alvo fácil para as facções. "Quem vai garantir muitas vezes essa renda para ele e para a família dele é a facção. Só que ela vai exigir que ele faça um juramento e ele passa a ser um escravo, dentro e fora do presídio."

Para Jungmann, não há outra fórmula para reduzir o poder das facções que não seja o Estado garantindo a vida do preso em custódia. "Assim podemos tirá-lo das mãos das facções. Claro, ele vai continuar a pagar pelo que fez, mas, se deixar ele absolutamente indefeso em relação à sua vida lá dentro, a pergunta que faço à sociedade é: isso está valendo a pena?", questionou o ministro.

Ministro lista medidas necessárias

Segundo um levantamento do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), as facções criminosas são hoje o critério mais usado para separar presos em penitenciárias do Brasil, superando até mesmo a divisão por tipo de crime, como manda a lei.

"Muitas vezes, a sociedade entende que estamos tirando a pessoa da rua e colocando no sistema prisional, mas pergunto: estou fazendo justiça? Assim, não acho. Estamos é recrutando mais criminosos para as facções organizadas. Ao mesmo tempo, tem um outro problema, que é não ressocializar. Aquele cara vai sair e, se tivermos condições de se ressocializar, bom para sociedade. Se não, o crime ganhou", opinou Jungmann.

A solução do problema, diz, passa por três ações essenciais. "O que precisamos? Cortar a comunicação de fora com o preso, instalando parlatório (sala com um vidro que impede o contato físico entre detentos e visitas) nos presídios onde estão os chefes de facções. Em segundo, é preciso fazer com que o chefe do crime não passe só um ano no presídio federal, mas cumpra toda a pena lá dentro. Em terceiro, tem de ter um programa de emprego para presos e egressos, que é para reduzir o peso da facção sobre aquele preso --e nós já criamos esse programa", finalizou.

Para o procurador-geral do Ceará, Plácido Rios, ex-presidente do GNCOC (Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas), a reação lenta das autoridades fez com que o crime organizado ganhasse força. "O Brasil levou muito tempo para reconhecer a gravidade e a complexidade das facções. No Ceará, por exemplo, há poucos anos, sequer o secretário de segurança admitia o problema", afirma.

O Brasil hoje tem a terceira maior população carcerária do mundo, atrás apenas de Estados Unidos e China. O crescimento no número de prisões é alvo de críticas de estudiosos, que afirmam que o Brasil tem uma política criminal equivocada de encarceramento em massa.