Bolsonaro assina decreto que flexibiliza a posse de armas no Brasil
O presidente Jair Bolsonaro (PSL) assinou, nesta terça-feira (15), em cerimônia esvaziada no Palácio do Planalto, em Brasília, um decreto que flexibiliza a posse de armas no país.
Uma das principais mudanças estabelecidas pelo texto é o maior tempo de validade do registro. Se antes o cidadão precisava fazer a renovação a cada cinco anos junto à Polícia Federal, agora o prazo é a cada 10 anos. Para a renovação do registro junto ao Exército, a validade passou de três anos também para 10 anos.
Com o decreto, a posse de arma fica facilitada a:
- agentes públicos ligados à área de segurança;
- todos os residentes em área rural;
- residentes em áreas urbanas em estados com mais de dez homicídios por 100 mil habitantes (hoje, na prática, isso significa que são todos os cidadãos);
- donos ou responsáveis legais de estabelecimentos comerciais;
- colecionadores, atiradores e caçadores.
Antes de assinar o decreto, Bolsonaro disse que a população, no referendo de 2005, havia decidido "soberanamente" sobre a questão. "Para lhes garantir esse legitimo direito à defesa, eu, como presidente, vou usar esta arma", disse, exibindo uma caneta esferográfica.
Segundo o presidente, um dos problemas que o decreto enfrenta é a "comprovação da efetiva necessidade [da posse de uma arma]". "E isso beirava a subjetividade", disse.
A flexibilização da posse de armas no país foi uma das principais promessas de campanha de Bolsonaro. Ela não tem relação com o porte de armas, que é o direito de o indivíduo andar armado pelas ruas. A posse, por sua vez, é a autorização para manter uma arma em casa ou no trabalho, desde que o proprietário seja o responsável legal pelo local.
Bolsonaro afirmou apesar de, anteriormente, ser liberada a compra de até seis armas, "na prática", não era o que acontecia. "Com a legislação atual, pode-se comprar até quatro e, preenchendo os requisitos, o cidadão de bem, com toda certeza, poderá fazer uso dessas armas".
Bolsonaro diz ter assinado o decreto com "muita satisfação" para que o "cidadão de bem possa ter a sua paz dentro de casa".
Durante seu pronunciamento, Bolsonaro disse que as autoridades irão "acreditar" na declaração.
"Ele [comprador] vai ter que, numa declaração, que nós acreditaremos na mesma, dizer que na sua casa ele tem um cofre ou um local seguro para poder armazenar a sua munição", declarou Bolsonaro. Segundo o presidente, trata-se de uma espécie de advertência, "um aviso", "porque logicamente nós sabemos do risco que existe a possibilidade em se ter uma arma de fogo em casa que não seja guardado em local seguro, em especial quando se tenha crianças dentro da mesma", complementou.
O primeiro inciso do artigo que prevê a declaração aponta que "a veracidade dos fatos e das circunstâncias" afirmadas no documento é "presumida".
Taxa de homicídios será referência
Poderão comprar armas moradores de áreas urbanas localizadas em unidades federativas com taxa de homicídios superior a 10 por 100 mil habitantes em 2016, conforme dados do Atlas da Violência 2018 - o que, na prática, abarca todos os 26 estados brasileiros mais o Distrito Federal.
O decreto estende a permissão a residentes em área rural, militares ativos e inativos, titulares ou responsáveis legais de comércios ou indústrias e a colecionadores, atiradores e caçadores já registrados no Exército.
Outros beneficiados são os agentes públicos, como trabalhadores da área de segurança pública e da administração penitenciária, integrantes das carreiras da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), alguns funcionários do sistema socioeducativo e pessoas envolvidas em atividades de poder de polícia administrativa.
O texto estabelece ainda que, na hipótese de a residência do usuário ser habitada também por criança, adolescente ou pessoa com deficiência mental, ele deverá apresentar uma declaração de que o local possui "cofre ou local seguro com tranca para armazenamento".
As mudanças do decreto passam a valer assim que ele for publicado no Diário Oficial da União, o que está previsto para acontecer ainda nesta terça-feira por meio de edição extra. As alterações não precisarão passar pelo Congresso Nacional.
Cerimônia improvisada
A "assinatura solene" do decreto ocorreu após mudanças de local, horário e em meio a um trabalho confuso do cerimonial da Presidência. Com o ato atrasado em quase 40 minutos, funcionários correram para arrumar o Salão Leste do Palácio do Planalto, às pressas.
Embora seja um dos principais temas tratados por Bolsonaro nos últimos meses, inicialmente, a assinatura do decreto estava prevista para acontecer na Sala de Audiências, no terceiro andar do prédio, sem a presença maciça de convidados e da imprensa.
Apesar de a cerimônia estar inicialmente marcada para as 11h, 53 minutos depois o sistema de áudio ainda estava sendo testado --e viria a falhar no início do pronunciamento de Bolsonaro, que chegou a tentar projetar a voz.
Alguns aliados de Bolsonaro no Congresso foram os primeiros convidados a chegar, como os deputados federais Alberto Fraga (DEM-DF), ex-coordenador da chamada "bancada da bala", e Carlos Manato (PSL-ES).
Ambos ficaram sem cargo eletivo para 2019, pois perderam a disputa aos governos do Distrito Federal e do Espírito Santo.*
Depois de participarem de reunião ministerial no Palácio do Planalto, os integrantes do primeiro escalão do governo passaram a ocupar as primeiras fileiras do salão.
Quando o presidente entrou no Salão, quase metade das cadeiras estavam vazias. "Obviamente, não tem mais aqui porque estamos em recesso, mas a bancada da legítima defesa é muito grande", justificou.
De pé, ao lado de Bolsonaro, ficaram os ministros da Defesa, Fernando Azevedo e Silva; da Casa Civil, Onyx Lorenzoni; da Justiça e da Segurança Pública, Sergio Moro; e do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), general Augusto Heleno, além do vice-presidente, general Hamilton Mourão (PRTB).
Toda a cerimônia durou menos de sete minutos.
Aumenta quantidade de brasileiros contra posse, diz pesquisa
O decreto foi assinado no momento em que cresce a quantidade de brasileiros contra a flexibilização da posse.
Pesquisa Datafolha divulgada na última segunda-feira (14) apontou que, em dezembro, 61% dos brasileiros são favoráveis a que a posse de arma seja proibida no país. Em outubro do ano passado, essa parcela abarcava 55% dos entrevistados pelo instituto.
No mesmo intervalo, os defensores da posse de arma caíram de 41% para 37%. Do total de entrevistados, 2% não souberam responder.
Convênio
O presidente também apontou que o cadastramento dos cidadãos para ter a posse de arma poderá deixar de ser uma tarefa exclusiva da Polícia Federal, que poderá receber o apoio da Polícia Militar e a Polícia Civil nos estados para realizar a tarefa.
Ele explicou que poderá estabelecer o convênio por meio de MP (Medida Provisória).
Em entrevista após o evento, o deputado Alberto Fraga disse que o possível convênio firmado com as polícias estaduais serviria para suprir a falta de estrutura da Polícia Federal para fazer todos os cadastramentos.
"Quando nós temos aí 5.570 municípios, seguramente a Polícia Federal só tem alcance em 1.000", comentou. Segundo ele, a Polícia Civil só recolheria os documentos para remeter à Polícia Federal, que continuaria a deter o poder para autorizar os registros.
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