Vale foi informada em 2015 de problemas em monitoramento de barragem
A companhia mineradora Vale foi informada em 2015 sobre problemas nos sistemas de monitoramento da barragem 1 do complexo da empresa em Brumadinho (MG). A estrutura cedeu no dia 25 deixando dezenas de mortos e centenas de desaparecidos. A Vale nega qualquer irregularidade ou problema (veja mais abaixo).
Naquele ano, um estudo de impacto ambiental encomendado a uma consultoria independente sobre o complexo de mineração alertava para o mau funcionamento de quatro piezômetros na barragem. Os equipamentos são utilizados para medir a pressão exercida pelos rejeitos sobre a parede da estrutura, e foram instalados em 2006, de acordo com o relatório.
Outro problema verificado naquela vistoria foi a constatação de que alguns drenos utilizados na medição da vazão de água na barragem estavam secos, o que poderia indicar mau funcionamento do equipamento ou que a vazão havia cessado naqueles locais de medição.
Por fim, os auditores independentes concluíram que havia sedimentos nas calhas laterais da barragem, utilizadas para escoar excesso de água acumulada na parte superior da estrutura, e que havia presença de formigueiros em alguns pontos próximos -- o que podia indicar que elas estavam cavando galerias no solo do local.
À parte os problemas no monitoramento, a empresa Nicho Engenheiros Consultores Ltda atestou que a estrutura da barragem era estável, estava segura contra infiltrações e seguia todas as normas previstas na legislação brasileira. O relatório recomendava que a Vale verificasse os problemas o quanto antes, apesar de não haver risco aparente ou imediato.
Questionada especificamente pelo UOL sobre as providências tomadas em relação aos problemas no monitoramento da barragem apontados no relatório de impacto ambiental de 2015, a Vale não respondeu.
Em nota enviada à reportagem, a Vale afirma que "a barragem era monitorada por 94 piezômetros e 41 INAs (Indicador de Nível D'Água)". "As informações dos instrumentos eram coletadas periodicamente e todos os seus dados analisados pelos geotécnicos responsáveis. Dos 94 piezômetros, 46 eram automatizados", continua a reposta da assessoria de imprensa.
As últimas Declarações de Condição de Estabilidade, que atestam a segurança física e hidráulica da barragem 1, foram emitidas em 13 de junho de 2018 e 26 de setembro de 2018 pela TUV SUD do Brasil, uma empresa alemã especializada em geotecnia. A estrutura possuía, ainda, fator de segurança de acordo com as boas práticas mundiais e acima da referência da norma brasileira.
Nota da Vale
Dois engenheiros responsáveis pelo laudo emitido no ano passado foram presos temporariamente na terça-feira (29).
Procurada pelo UOL a consultoria Nicho, responsável pelo relatório de impacto ambiental de 2015, não respondeu ou retornou às tentativas de contato da reportagem feitas por email e telefone. Ao site "The Intercept Brazil", que revelou nesta semana a existência do relatório de impacto ambiental, o dono da empresa afirma que "nós que fazemos licenciamento só recebemos o projeto pronto. Pressupõe-se que todos os critérios técnicos e de segurança tenham sido obedecidos".
"A gente faz observação, [aponta que] tem tal problema. Mas dificilmente numa mina que já está operando o órgão ambiental vai dizer que não pode operar mais. Se o órgão ambiental diz que não tem problema, não sou eu que vou dizer que tem", afirmou o engenheiro Sérgio Augusto da Silva Roman ao Intercept.
Plano da Vale era aumentar produtividade em 88%
O relatório de impacto ambiental produzido pela Nicho em 2015 fazia parte do processo de licenciamento ambiental concedido à Vale no final do ano passado pelo governo de Minas Gerais.
A Vale buscava um novo licenciamento pois, a partir deste ano, pretendia fazer modificações no complexo de mineração em Brumadinho: a empresa iria reprocessar os rejeitos estocados na barragem 1, que se rompeu, e ainda criar uma nova barragem, alargar uma estrada e aumentar a retirada de minério de ferro de uma das minas.
O plano da empresa em Brumadinho era aumentar a produtividade em 88% e manter o complexo funcionando pelo menos até 2032. Em meio ao processo de concessão, foi realizada em junho de 2017 uma audiência pública de representantes da Vale com a comunidade e autoridades locais de Brumadinho sobre o projeto. Para a ocasião, a Vale preparou uma espécie de resumo do estudo de impacto ambiental produzido em 2015, onde não eram citados os problemas verificados no monitoramento da barragem.
Questionada pelo UOL, por meio de sua assessoria de imprensa, a Vale afirma que "em virtude de audiência pública, em 2017, foram novamente disponibilizadas cópias do Relatório de Impacto Ambiental, que já havia sido protocolado em 2015 na Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais".
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