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Aumento de seguidores de Gugu reacende debate sobre herança digital

O Instagram de Gugu Liberato ganhou mais de 1 milhão de seguidores desde o anúncio do acidente com o apresentador - Reprodução / Internet
O Instagram de Gugu Liberato ganhou mais de 1 milhão de seguidores desde o anúncio do acidente com o apresentador Imagem: Reprodução / Internet

Marcelo Oliveira

Do UOL, em São Paulo

02/12/2019 04h00Atualizada em 02/12/2019 08h34

Resumo da notícia

  • Perfil de Gugu no Instagram ganhou mais de 1 milhão de seguidores após sua morte
  • Instagram permite congelar página como memorial ou deletar o conteúdo
  • Advogados e projetos de lei defendem que família possa herdar conta nas redes
  • Justiça tem negado a maioria dos pedidos conhecidos no Brasil
  • Falta de lei específica pode ser uma resposta para decisões divergentes sobre o tema

O número de seguidores de Gugu Liberato no Instagram aumentou de 1.908.277 para 2.971.434 — um crescimento de 55,7% — desde o anúncio, no dia 21 de novembro, do acidente doméstico na Flórida (EUA) que tirou a vida do apresentador. O levantamento foi feito pelo UOL na tarde de sexta-feira (29).

Este dado ajuda a dimensionar o poder e o valor das redes sociais (um post patrocinado num perfil de 1 milhão de seguidores pode alcançar o valor de R$ 20 ou R$ 30 mil) e joga luz sobre um tema pouco discutido no Brasil, a herança digital, a possibilidade de familiares herdarem as redes sociais do morto.

Enquanto quatro projetos de lei sobre o assunto (três que propunham alterar o código civil para que familiares possam herdar as contas em redes sociais e um contrário a essa possibilidade) tramitavam na Câmara dos Deputados e foram arquivados no início deste ano, a Justiça tem negado a maioria dos pedidos de famílias que tentam acessar as redes de seus parentes falecidos.

Direito à herança

Três advogados especializados em direito digital ouvidos pelo UOL defendem que familiares possam herdar as redes sociais de entes queridos mortos, contudo têm ideias diferentes sobre a questão da necessidade do testamento e ressaltam a necessidade de se equilibrar a questão da privacidade daqueles que se foram. Poderia, por exemplo, o familiar ter acesso às mensagens privadas do morto?

"Eu entendo que a família possa herdar as contas nas redes sociais do morto. Contas de 1 milhão, 2 milhões de seguidores têm óbvio valor econômico e a família deveria ter o direito de usufruir", afirma o advogado Luiz Augusto D´Urso, Professor de Direito Digital no MBA de Inteligência e negócios digitais da FGV. Entretanto, a ideia esbarra nas regras do Instagram e do Facebook para esses casos.

Memorial ou remoção

Ambas as redes sociais preveem duas hipóteses: transformar a conta do morto em um memorial e a remoção da conta. A solicitação de uma ou outra é feita mediante formulários nas redes. Contudo, na hipótese de a família optar pelo memorial, o Instagram alerta "que não pode divulgar as informações de acesso em uma conta de memorial. Acessar a conta de outra pessoa cai contra as nossas políticas". Ou seja, a conta fica preservada da forma que estava quando a pessoa morreu, "congelada".

No Facebook, as contas memoriais têm a inscrição "in memorian" ao lado do nome do morto, e as famílias têm acesso ao gerencimento do conteúdo dos comentários, somente.

Informalmente, sabe-se que no caso de contas geridas por empresas de marketing digital com acesso a senha dos clientes, essas contas podem ser mantidas num acerto entre a família e a agência. Neste caso, o Facebook ou o Instagram não têm possibilidade de ingerência uma vez que o cliente quebrou sua própria privacidade e compartilhou sua senha.

Ordem judicial

Entretanto se as soluções de memorial ou exclusão não atendem à necessidade da família ou o desejo do morto, a solução seria a família buscar uma solução administrativa, por meio de notificações extrajudiciais às redes sociais, ou a uma ação na Justiça em que obtivessem uma ordem para conseguir a senha, acessar o conteúdo e administrá-lo.

Essas ações, contudo, esbarram no Judiciário brasileiro.

Decisões divergentes

Autor do livro "Herança Digital no Brasil", o advogado Gustavo Santos Gomes Pereira, afirma que a ausência de lei específica sobre o tema leva a uma "divergência nas decisões judiciais".

"A maioria das decisões que estudei tem negado o acesso das famílias à senha, seja por ausência de previsão em testamento ou pelos termos de uso das redes. As decisões favoráveis às famílias entendem que o direito à herança e o caráter patrimonial que as redes adquiriram em muitos casos se sobrepõem à individualidade", afirma o autor.

O advogado Alexandre Atheniense já atuou em casos em que conseguiu que as redes autorizassem o acesso a senhas, mas admite que evita ao máximo buscar a solução judicial. "Procuro esgotar a possibilidade administrativa antes", afirmou.

Testamento ajuda

Atheniense entende que o acesso às famílias é possível, mas que "facilitaria demais" se o morto deixasse o desejo expresso em testamento. D´Urso defende que mesmo que não expresse o desejo, seria possível autorizar o acesso por meio de inventário.

Pereira afirma que há aplicativos e sites que prestam o serviço de inventariar (levantar) os bens digitais, incluindo as redes sociais, de uma pessoa.

Solução para a intimidade

Segundo o autor, na Alemanha a relativização da questão da intimidade é maior e que a maioria das decisões judiciais naquele país têm autorizado o acesso dos herdeiros às redes dos mortos, inclusive as mensagens.

O autor acredita que uma eventual solução seria uma lei para regulamentar a herança digital e que a discussão em torno dela é válida.

"As divergências nas decisões se devem à ausência de uma lei específica". Pereira defende a possibilidade da herança das redes sociais, mas que uma eventual lei deve preservar o direito à intimidade do morto, negando a possibilidade de acesso dos herdeiros às mensagens privadas, por exemplo.