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Com medo do coronavírus, preso não deixa cadeia: 'prezando pela saúde'

O detento está na Colônia Penal e Industrial de Maringá (CPIM) - Divulgação
O detento está na Colônia Penal e Industrial de Maringá (CPIM) Imagem: Divulgação

Abinoan Santiago

Colaboração para o UOL, em Ponta Grossa

07/04/2020 15h28

Com chances de ir para casa cumprir parte da pena em prisão domiciliar durante o período da pandemia do novo coronavírus, um preso de 65 anos se recusa sair da penitenciária por acreditar que na cadeia está mais seguro contra a covid-19. O detento está na Colônia Penal e Industrial de Maringá (CPIM), a 426 km de Curitiba. O caso dele ainda não foi apreciado pela Justiça do Paraná.

O preso é do grupo de risco do novo coronavírus e por recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a defesa solicitou a prisão domiciliar do cliente sem consultá-lo, pois o contato entre advogados e clientes está restrito em presídios do Paraná desde o início da pandemia.

A resolução do CNJ recomenda juízes adotarem medidas para transferir detentos a outros regimes —como o domiciliar— sobretudo no caso de gestantes, lactantes, idosos, presos que integrem grupos de risco para o novo coronavírus. A recusa do preso ocorreu na sexta-feira (3), quando a assistente social o ouviu sobre o pedido de prisão domiciliar, como parte do protocolo do Ministério Público (MP) antes de a Justiça tomar uma decisão.

"Declaro que o advogado que me representa fez um pedido de prisão domiciliar sem me consultar, contra a minha vontade. Neste momento, não desejo sair desta CPIM pelo motivo de me sentir em maior segurança na unidade devido a possibilidade de contágio pelo vírus covid-19. Esclareço que indo para a minha residência, terei contato com pessoas que necessitam sair de casa e podem ser um meio de contágio da doença", diz o preso em documento, após ser ouvido.

"Desejo permanecer na unidade até que a situação de pandemia amenize, prezando pela minha saúde e minha vida", completa.
Maringá, onde o detento cumpre pena por estupro de vulnerável tem 23 casos da doença. Foz do Iguaçu, que seria a residência dos familiares apontada pela defesa como prisão domiciliar tem 25. Ao todo, Paraná contabiliza 466 confirmações, com 14 mortes. Ainda não há casos em penitenciárias.

Defesa fica surpresa

De acordo com o advogado do preso, Rodrigo Oliveira, a decisão do idoso o pegou de surpresa, pois acreditava que o cliente gostaria de sair do presídio depois de mais de 12 anos de cumprimento de parte da pena e por ser do grupo de risco. Ele está condenado por estupro de vulnerável e ainda tem mais de 10 anos de prisão para cumprir.

A defesa diz que além de relatar o medo da covid-19, o preso informou não ter endereço para ir após deixar a prisão, o que para o advogado é "muito estranho".

"Ele deixou declarado que não tinha para onde ir. Acredito que tenha sido uma estratégia para permanecer. É muito estranho. Trabalho há 15 anos na área criminal e trabalhamos para libertar o preso e nunca para prender. Desta vez fui surpreendido. Fiquei bem surpreso", declarou.

A suspeita do advogado é de que o idoso tenha argumentado o medo de contrair covid-19 fora da cadeia por temer perder o emprego que conseguiu na prisão. Ele trabalha na cozinha e a cada três dias de serviço tem um da pena abatido.

Com a manifestação contrária do detento, a Justiça deverá seguir a vontade dele, sobretudo por ser um condenado por crime hediondo, prevê a defesa.

"O maior medo dele deve ser isso, mas pedi que no retorno, ele fosse levado de novo para a mesma unidade para seguir o serviço que desempenha. (...) Fiz o pedido sem a consulta dele porque já estava no caso. Antes da decisão do juiz, é de praxe no Paraná, ouvir o preso antes. Ele disse não ter interesse, caso fosse agraciado. Geralmente a vontade é seguida" , explicou.

O UOL entrou em contato com o Departamento Penitenciário (DEPEN) do Paraná para saber se o idoso perderia a vaga de emprego na cadeia, caso saísse, mas ainda não obteve retorno do questionamento.