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Filha de aposentado morto por cerveja: 'A Backer não ajudou em nada'

Marco Aurélio Gonçalves Cotta e sua esposa; ele morreu por intoxicação após consumir cerveja Backer - Arquivo Pessoal
Marco Aurélio Gonçalves Cotta e sua esposa; ele morreu por intoxicação após consumir cerveja Backer Imagem: Arquivo Pessoal

Daniel Leite

Colaboração para o UOL, em Juiz de Fora

18/07/2020 17h38

A morte de Marco Aurélio Gonçalves Cotta, na madrugada de hoje, é a décima em decorrência de intoxicação pela cerveja Backer. O engenheiro de telecomunicações de 65 anos estava internado desde o dia 30 de dezembro, em Belo Horizonte. O óbito foi confirmado à reportagem pela Polícia Civil. Segundo a corporação, a causa da morte foi a contaminação por mono/dietilenoglicol.

A empresa, segundo familiares das vítimas, continua em silêncio e não tem ajudado nos custos dos tratamentos médicos. Angela Cotta, filha de Marco Aurélio, afirma nunca ter conseguido uma resposta da empresa com relação às despesas do tratamento do pai. "A Backer não ajudou em nada. Conosco nunca fizeram nenhum contato."

A associação que representa os familiares de vítimas da intoxicação confirmou a informação. "Os advogados da família já apresentaram à Backer os gastos com o tratamento médico de Marco Aurélio, mas a empresa nunca respondeu às solicitações", divulgou por meio de nota.

Por telefone, a assessoria de imprensa da cervejaria informou que oficialmente não vai se manifestar sobre o caso.

Após pedido da Promotoria de Justiça Cível de Defesa do Consumidor, ligada ao Ministério Público, o Tribunal de Justiça estadual autorizou a quebra de sigilo bancário dos últimos 12 meses de cinco empresas do grupo cervejeiro. O MP alega haver indícios de que a Backer estaria tentando dilapidar ou ocultar seu patrimônio para não ter como pagar as indenizações em caso de execução.

Mais de 200 dias de internação

Cotta consumia Backer com regularidade e comprou duas caixas para as festas de fim de ano, em 2019. Entre o Natal e o Réveillon, começou a sentir os primeiros sintomas, como dificuldade para urinar. Foi hospitalizado e passou por diálise. Ele enfrentou 201 dias de internação, mas, pouco antes da pandemia do novo coronavírus, melhorou, recebeu alta do CTI, foi para o quarto e estava prestes a terminar o tratamento com a família, em casa.

A residência chegou a passar por algumas reformas estruturais, como no banheiro, devido à dificuldade de locomoção causada pela intoxicação, o que prejudicou os movimentos do corpo dele.

Mas o plano de saúde sugeriu deixar o aposentado internado, pois acreditava que poderia haver falta de profissionais no atendimento domiciliar devido à chegada da covid-19 ao país. "Foi uma decisão correta, houve mesmo carência de profissionais. Se tivesse ido para casa, poderia ter faltado atendimento. Foi uma estratégia de segurança", diz Ângela.

Depois de 38 dias no quarto, o pai teve uma parada cardiorrespiratória e voltou para o CTI. "Ele chegou a ficar oito minutos desacordado, teve convulsões e ataques epilépticos, mas conseguiram reanimar", relata a filha.

No último dia 1º de julho, a família foi avisada de que o engenheiro possivelmente não viveria muito mais. "Foi feita uma ressonância que apontou coma irreversível. O cérebro dele estava comprometido de forma a não conseguir mais fazer com que ele acordasse. E a gente recebeu a notícia de que ele poderia partir a qualquer momento."

Marco Aurélio chegou a emagrecer cerca de 25 quilos durante os meses internado. Também foi acometido por paralisia facial, perda de parte da visão e, sem os rins funcionando direito, ficou bastante inchado.

O engenheiro aposentado deixa a esposa, dois filhos e a neta, que era seu xodó. "Ele que cuidava dela para eu poder trabalhar. Buscava e levava na escola, na natação, no judô. Os compromissos diários dele eram os da minha filha", lembra Ângela.

O velório acontecerá amanhã de manhã, com controle de pessoas por causa do coronavírus.

Intoxicações desde 2018

A morte de Marco Aurélio foi a terceira em menos de uma semana entre as vítimas da intoxicação pela Backer. No último dia 15, José Osvaldo de Faria, 66 anos, morreu depois de ficar internado por mais de 500 dias.

Apesar de o caso envolvendo a cervejaria ter repercutido nacionalmente no início de 2020, com vários consumidores sendo hospitalizados, o inquérito da Polícia Civil investigou possíveis intoxicações desde dezembro de 2018. Entre elas, está a de José Osvaldo.

Na conclusão da apuração, a polícia indiciou 11 pessoas e encaminhou o caso para o Ministério Público.