Após andar de mãos dadas com namorado, rapaz recebe bilhete de vizinho
O maquiador Felipe Alves, 26 anos, foi surpreendido por um bilhete colocado por debaixo da porta do seu apartamento em Joinville (SC), a 178 quilômetros de distância de Florianópolis. No papel, foi escrito a caneta que o condomínio era um "local de família" e exigia "respeito".
"Olá vizinho. O Condomínio Piratuba é um local de família. Respeitamos todas as pessoas e não nos importamos com o que cada um faz dentro de sua casa. Mas essa semana eu tive que explicar pro meu filho pequeno o porquê de dois homens de mãos dadas andando pelo estacionamento. Respeito por favor", escreveu o vizinho, que não se identificou.
Ao pegar o papel, deixado na manhã de 11 de setembro, o maquiador ficou desolado. "Eu fiquei indignado, senti raiva. Amassei o bilhete e joguei fora. A gente não estava fazendo nada de errado, só estávamos de mãos dadas", disse Alves ao UOL.
Ele demorou quatro dias para contar o ocorrido ao namorado. "Ele é tímido, muito reservado, e a gente demorou bastante tempo para ter a liberdade para andar de mãos juntas. Fiquei com receio que ele não quisesse mais."
Situação foi relatada em grupo de moradores
O condomínio é formado por oito blocos de edifícios de cinco andares, com 20 apartamentos em cada um. Ao todo, 160 famílias moram no local. Alves acredita que o bilhete tenha sido deixado por um morador do próprio bloco, já que o acesso é restrito.
A situação foi relatada por ele no grupo de Whatsapp do bloco e conversou com o síndico. "O síndico mandou mensagem no grupo, dizendo que era infantil mandar esse tipo de mensagem e que, se alguém tinha se sentido incomodado, era para conversar."
Procurado pelo UOL, o síndico Charles Scheel salientou que passou a tratar do assunto assim que foi comunicado. "Isto foi feito de forma pública no grupo de moradores. Fizemos manifestação no grupo de moradores onde o Felipe anunciou o recebimento do bilhete justamente para que os moradores entendessem que o condomínio não compactua com qualquer tipo de preconceito. Ainda mais de forma criminosa como foi o caso", afirmou Scheel.
Além do grupo, voltado a moradores do prédio, há uma linha de transmissão no Whatsapp para envio de comunicados do condomínio. "Em ambos enviamos informações de repúdio ao ocorrido", disse o síndico. "Em 15 anos, é pela primeira vez que tivemos um caso de homofobia. Informamos aos moradores que orientamos o Felipe a fazer um boletim de ocorrência, pois caso o autor seja identificado, ele possa acionar o autor pelo crime que cometeu. Também pedimos que mantenham a habitual cordialidade e respeito que sempre imperou entre os moradores. Este caso realmente foi muito infeliz para o condomínio."
Boletim de ocorrência foi registrado
Natural de Porto Rico (PR), o maquiador mora desde início de agosto no condomínio e reside há seis anos na cidade. Ele e o namorado têm um salão de beleza voltado para o público gay em Joinville. "Eu praticamente vivo em uma bolha, em tudo que eu faço, as pessoas com quem eu trabalho, são gays. Então, já era algo que não acontecia há algum tempo."
Alves registrou um boletim de ocorrência online na Polícia Civil.
Criminalização da homofobia
Em junho do ano passado, o STF (Supremo Tribunal Federal) aprovou o uso da Lei nº 7.716/89, a Lei do Racismo, para punir homotransfobia —discriminação contra homossexuais e transexuais.
Ou seja, as agressões homofóbicas devem ser tipificadas e punidas da mesma forma que o racismo —um crime hediondo, inafiançável e com pena de até cinco anos de prisão.
O texto aprovado no Supremo diz que esta decisão vale enquanto o Congresso cria leis específicas para o tema.
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