Após 1 ano, RJ volta a ter água com gosto alterado e falha em abastecimento
Moradores da cidade do Rio de Janeiro voltaram a reclamar do gosto de terra e água turva recebida em casa pela Cedae (Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio) —situação bem parecida com a verificada no começo do ano passado, que ficou conhecida como "crise da geosmina".
Em meio à pandemia do novo coronavírus, há também reclamações de interrupção e falhas de abastecimento em ao menos 16 bairros das zonas norte e oeste e nos municípios de Nilópolis, Belford Roxo e Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Apesar de a Cedae alegar que não há alteração na água produzida na estação de tratamento do rio Guandu, tem morador que já deixou de consumir a água da companhia.
É o caso de uma moradora da avenida Ataulfo de Paiva, no Leblon, zona sul do Rio, que notou alteração no sabor da água na semana passada.
Tô sentindo gosto igual ao da geosmina. Meu marido teve diarreia. Não sei se foi por causa da água. Na dúvida, passamos a beber água mineral. Comentei com o meu porteiro e ele me disse que outros moradores também sentiram
Lucia Ferreira, advogada
A geosmina, que afetou a qualidade da água no ano passado, é um composto orgânico produzido por micro-organismos. Pesquisadores chamaram a atenção para a grande quantidade de esgoto e resíduos industriais recebida pela bacia do Rio Guandu, principal fonte de abastecimento.
Após surgirem relatos de modificação na cor e sabor da água na última quinta-feira (22), a Cedae desligou por dez horas o sistema de tratamento do rio Guandu —medida preventiva e emergencial.
Segundo a companhia, o sistema voltou a operar na manhã do dia seguinte. A empresa informou que a interrupção do serviço poderia afetar o fornecimento de água e deu o prazo de 48 horas para ser regularizado.
No entanto, moradores de diversos bairros estão até hoje com fornecimento irregular ou totalmente sem água —problema também ocorrido no final do ano passado que levou a Cedae a adotar revezamento no fornecimento. Na ocasião, foi constatado um defeito em um dos motores da Elevatória do Lameirão, responsável pela distribuição da água para a capital e para Nilópolis, na Baixada Fluminense.
Maria de Jesus Oliveira Melo, 50, moradora de Realengo, bairro da zona oeste carioca, é uma das afetadas. Ela relata que está com o cesto cheio de roupa suja e louças acumuladas na pia.
Ela foi prejudicada em três episódios recentes envolvendo o serviço da Cedae —geosmina, defeito no motor do Lameirão e agora, nova falta d'água. Maria, que faz quentinhas para vender, não consegue trabalhar, pois não chega água na casa dela.
"Tem dois dias que não tinha água. Hoje [ontem], tem água, mas está fraquinha e nunca chega o suficiente para normalizar o meu dia, para fazer as coisas do jeito que eu preciso. Eu trabalho com comida e não tenho como fazer as refeições sem água. Isso está comprometendo meu orçamento familiar", afirma ela.
Passei por vários problemas de água. Primeiro veio a água aparentemente suja, tive problemas com meus filhos com dor de barriga, mesmo filtrando a água dava problema. Depois, a água vinha espumosa. Depois, veio a falta de água total e agora, quando achei que ia ficar tudo tranquilo, estou sem água de novo
Maria de Jesus, moradora de Realengo
Ela diz que, sem conseguir trabalhar, não tem como pagar dois boletos da Cedae que chegaram recentemente em sua casa —um no valor de R$ 88, com desconto de R$ 5, e outro de R$ 100.
Quem enfrenta o mesmo problema é Daiana Oliveira, moradora de Santa Cruz, também na zona oeste. Ela disse que, quando a água chega na casa dela, é em pouca quantidade.
A água cai geralmente de madrugada. Deixo as torneiras ligadas, com balde embaixo e fico esperando a água chegar. Se eu durmo, acordo com o barulho. Outro dia veio de madrugada, mas veio com cheiro diferente
Daiana Oliveira, moradora de Santa Cruz
Laís Gomes,19, moradora de Paciência, na zona oeste, enfrenta o mesmo problema.
Quinta, sexta e sábado não tivemos água. Domingo chegou às quatro da tarde, meia-noite acabou e até agora estamos sem água. Isso tudo do meio de uma pandemia que tem que ficar lavando a mão, tem gente que não tem dinheiro para ficar comprando álcool em gel e isso complica
Laís Gomes, moradora de Paciência
Em Belford Roxo, no bairro São Bernardo, Cleide Araújo, 46, disse que está há uma semana com a caixa d'água vazia. "Estamos comprando quando dá para comprar. Conto com ajuda dos vizinhos que têm poço e me passam água. A Cedae diz há uma semana que está fazendo manutenção na bomba", contou.
O que diz a Cedae
Procurada, a Cedae afirma, por meio de nota, que "adotou medidas e eliminou qualquer possibilidade de alteração de gosto e cheiro da água produzida na ETA [Estação de Tratamento de Água] Guandu e distribuída para a região metropolitana" a exemplo do que ocorreu no ano passado.
"A Cedae adotou o protocolo operacional definido no plano de contingência do Guandu, operando as barragens da captação e paralisando a ETA Guandu por algumas horas na noite de quinta-feira (21/01), de maneira preventiva e emergencial. A ETA voltou a operar na manhã de sexta-feira (22/01)", informou a empresa.
Sobre o problema de abastecimento, a companhia diz que não há bairros inteiros afetados e alega que há dificuldades em endereços mais altos. "Em alguns pontos, como imóveis localizados em cota elevada e nas extremidades do sistema, a pressão da rede de abastecimento está sendo normalizada."
Devido à crise da geosmina, a Agenersa (Agência Reguladora de Energia e Saneamento Básico do estado) aplicou multa de R$ 5,7 milhões na Cedae pela contaminação.
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