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Caso Ketelen: Sem fratura, golpes violentos causaram morte, aponta hospital

Ketelen Vitória Oliveira da Rocha morreu no sábado (24) aos 6 anos de idade - Reprodução/Facebook
Ketelen Vitória Oliveira da Rocha morreu no sábado (24) aos 6 anos de idade Imagem: Reprodução/Facebook

Francisco Edson Alves

Colaboração para o UOL, em Volta Redonda

30/04/2021 09h42

Internada em coma no Hospital São Francisco de Assis, em Porto Real, apresentando sangramento no crânio, marcas compatíveis com queimadura de cigarro e vergões por todo o corpo, Ketelen Vitoria Oliveira da Rocha, de 6 anos, que morreu no dia 24, em consequência de um espancamento, seis dias antes, não teve fraturas detectadas em exames. O fato chamou a atenção da equipe médica que atendeu a menina e do diretor da unidade.

De acordo com o diretor administrativo da unidade, Fábio Silva, o comentário entre profissionais de saúde e policiais do 37º BPM (Resende) envolvidos nos primeiros socorros à garota, era de que quem a espancou "sabia bater".

"É como dizem na gíria popular, quando o agressor surra a vítima, tentando evitar a ruptura da ossatura. Porém, quem fez essa covardia, errou na mão, exagerou na dose dos ataques, e certamente não imaginava que Ketelen pudesse morrer", afirma Silva, em entrevista ao UOL, ressaltando que o autor das agressões teve, aparentemente, o cuidado de não quebrar nenhum osso da menina.

"Mas o conjunto de ações violentas, entretanto, foi tão intenso, que, além de marcas profundas na pele, acabaram resultando no óbito da vítima", lamentou Silva, garantindo que nunca tinha visto nada parecido em termos de crueldade. "Os exames [de tomografia] mostraram que ela respirava apenas através de um pulmãozinho. O outro já estava fechado. Os vergões sugerem surras recentes e antigas", comentou.

O boletim de internação de Ketelen no São Francisco de Assis, obtido pela reportagem, descreve o estado deplorável das condições físicas que impressionaram os funcionários e denotam a brutalidade das agressões.

Um trecho do documento diz que a criança, conduzida por equipe do Samu, chegou ao hospital "desacordada, não responsiva [termo usado quando a pessoa não reage a estímulos], com sinais de hematomas pelo corpo, especialmente na face, periorbitário [em volta dos olhos] , midriática [dilatação da pupila, causada por agentes externos], e Glasgow 5 [Índice usado para medir a consciência e a evolução das lesões cerebrais em um paciente. O grau 5, numa escala que vai de 3 a 12, significa coma grave]".

O mesmo documento ressalta a realização de tomografia computadorizada e a transferência da paciente para uma Unidade de Tratamento Intensiva (UTI) Pediátrica, sedada e entubada. Ketelen morreu no Neovida - Centro Infantil de Terapia Intensiva, uma clínica particular para onde a menina foi levada, com despesas pagas pela Prefeitura de Porto Real. Em nota, a clínica informou que a morte foi causada por parada cardiorrespiratória.

Antes do coma, 48 horas de espancamento

Segundo a Polícia Civil, Ketelen foi espancada por ao menos 48 horas antes de entrar em coma. Investigações da 100ª DP (Porto Real) apontam como suspeitas do crime a mãe, Gilmara Oliveira de Farias, 27, e a madrasta, Brena Luane Barbosa Nunes, 25. As duas foram presas em flagrante. No Boletim de Atendimento do Hospital São Francisco destaca a versão de Gilmara, que alegou que contou que a filha tinha sido atingida por um mourão na cabeça.

Na quarta-feira também foi presa Rosângela Nunes, 50, mãe de Brena, que também mora na mesma casa com as acusadas e com a mãe dela, Aparecida, 86. Segundo a juíza Priscila Dickie Oddo, Rosângela teria se omitido e não impedido as agressões contra a criança. As três responderão por tortura e homicídio triplamente qualificado e terão assistência da Defensoria Pública.

Castigos rotineiros, de acordo com investigações

Agentes da 100ª DP (Porto Real) que investigam o caso, identificaram supostos "castigos rotineiros" impostos a Ketelen pelo casal, conforme revelou o jornal Extra. Entre os castigos relatados por testemunhas à polícia, estão a obrigatoriedade de a criança se alimentar com pães mofados.

Ainda conforme a polícia, a menina teria sido espancada quatro vezes, entre 16 e 18 de abril. Numa das ocasiões, foi chicoteada com um cabo de TV e, após levar chutes na barriga, teve a cabeça batida contra uma parede até desmaiar, sendo jogada em seguida de uma ribanceira de 7 m.

Conforme denúncia do MPRJ aceita pelo Tribunal de Justiça, entre os dias 16 e 18 de abril, Gilmara e Brena, "em comunhão de ações, assumiram o risco de produzir a morte de Ketelen", ao desferirem contra a menina socos, chutes, arremessos contra a parede, pisões, chicoteadas e arremesso no barranco.

No dia 19 de abril, quando a vítima já estava agonizando, o casal e Rosângela decidiram pedir ajuda ao SAMU, mas antes combinaram a versão de que a criança teria se machucado numa estaca de madeira, história desmentida pouco depois no hospital, diante da gravidade das lesões. A denúncia ainda destacou que Ketelen teria sido vítima de torturas de meados de 2020 até o último dia 16.