'Não dá para ser forte': moradores resgatam corpos em Petrópolis
Pouco mais de 12 horas após o início da chuva que provocou o deslizamento de parte do Morro da Oficina, em Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro, moradores ainda faziam o trabalho de resgate e aguardavam notícias. Muitos deles passaram a noite na busca por sobreviventes.
Em uma das primeiras curvas do morro, um ponto de apoio do Corpo dos Bombeiros é utilizado para deixar corpos que são resgatados. Homens encharcados de lama que passaram a madrugada procurando vizinhos e parentes carregam corpos em sacos pretos e avisam os bombeiros, que por sua vez levam ao ponto de apoio e contabilizam as vítimas. Oficialmente, são ao menos 94 mortos —a identidade das vítimas não foi divulgada.
O deslizamento destruiu ao menos 80 casas no Morro da Oficina, no bairro Alto da Serra, segundo estima a Defesa Civil. Os homens se dividiram em subgrupos para agilizar o resgate. Apesar de a previsão ser de chuva fraca para o dia de hoje, moradores têm receio que um temporal impeça que seus familiares sejam encontrados.
Corpos contabilizados geram revolta
Por volta das 7h30, a reportagem testemunhou um resgate. O corpo de um jovem identificado como Lucas, de 19 anos, era carregado pelo tio em uma das escadarias. Resignado, o homem contava com os olhos cheios de lágrimas a notícia aos vizinhos que perguntavam "como ele chegou".
O mesmo grupo que resgatou Lucas relata já ter resgatado outras cinco pessoas —três sem vida. Ao deixar o corpo do rapaz aos pés do morro, o tio reclamava da atuação dos bombeiros.
Na avaliação dele, os agentes atuam com lentidão e abrem espaço para que familiares sejam obrigados a fazer o resgate de quem ama, sem direito a um luto digno.
Às 7h50, o grupo voltou ao mesmo ponto com outro corpo, uma mulher. "Não dá para saber quem é", disse um dos rapazes, sugerindo o nome de três vizinhas que moravam em casas próximas.
Enquanto consolavam familiares que moravam nas tais casas, antes de abrir o saco preto, outras mulheres clamavam por notícias de netos, filhos, genros e maridos.
Às 8h20, uma mulher chegou ao ponto desesperada. Ela gritava e lamentava a falta de notícias: seu irmão e sua sobrinha ainda não foram encontrados. Ora pedindo para que eles aparecessem, ora gritando que não podia ser verdade, ela não parava de chorar.
Ao ser consolada e ouvir que precisava ser forte, gritava: "Eu não consigo ser forte, não dá para ser forte. É quem eu amo, é maior do que eu".
As famílias que minutos antes tinham passado pela mesma situação seguravam a sua mão, ofereciam água e tentavam acalmá-la.
A cerca de 1 m de distância, um homem chorava —como nas últimas duas horas. Ele contou à reportagem que a casa em que morava toda sua família está destruída, mas ainda não encontraram corpos ou sobreviventes. Sua sogra, filha e irmã estavam no local.
Móveis e objetos estão comprimidos embaixo da laje do lugar. O grupo de homens que resgata corpos prometeu: "Vamos lá te ajudar", mas temem a queda da laje e novas vítimas.
Além dos mais de 50 mortos já contabilizados, a Defesa Civil informa que ao menos 21 pessoas foram resgatadas com vida. O Morro da Oficina é considerado o local mais atingido e não há um número oficial de desaparecidos.
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