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Petrópolis: 'Pulamos a janela', diz sobrevivente em estamparia que desabou

Marcela Lemos

Colaboração para o UOL, no Rio

23/02/2022 17h33

Um vídeo que circula na internet mostra o momento em que parte do piso de uma estamparia, no bairro da Chácara Flora, em Petrópolis (RJ), cedeu com funcionários no interior do estabelecimento. Todos sobreviveram. O desabamento aconteceu durante a forte chuva que atingiu a cidade no dia 15.

Três profissionais aparecem nas imagens da câmera de segurança da empresa, mas ao todo seis pessoas estavam no local no momento do desabamento que foi provocado pelo acúmulo de água.

"Nós estávamos tentando salvar as coisas do nosso trabalho, botando em cima das mesas. Do nada, a água ficou mais forte e estava quase em nossos joelhos quando escutamos um estalo forte. Só deu tempo de proteger nossas cabeças. Tudo escuro. Estávamos no 2º andar, embaixo tinha uma casa vazia", relatou o funcionário Fernando Augusto, que aparece no vídeo.

Ele contou à reportagem como foram os momentos após o desabamento e como conseguiu deixar o local.

Minha perna ficou presa entre uma mesa e a caixa d'água. Comecei a gritar por socorro. A chuva não parava, mas graças a Deus, depois de fazer muita força, minha perna foi se soltando. Subi nos destroços e começamos a chamar uns aos outros, pois estava escuro. Conseguimos nos encontrar através dos grito
Fernando Augusto, funcionário da estamparia

Ele chegou a tomar choques porque o maquinário estava ligado na hora do desabamento.

"Saímos pela casa do vizinho que o muro caiu, quando fomos para a rua parecia que era um rio enorme, pois os carros estavam sendo arrastados, Tivemos que passar por cima dos carros e atravessar a rua."

Vinícius Catuaba, 19, filho da proprietária da fábrica, também estava no local na hora do desabamento. O jovem contou ao UOL que, no momento em que parte do piso cedeu, ele estava no sótão tentando salvar o material da fábrica, invadida pela água da chuva. Ele não aparece no vídeo.

Após o desabamento, ele chamou pelos funcionários, que não responderam prontamente. Catuaba e mais duas pessoas saíram por uma janela. Já os outros três funcionários, que aparecem nas imagens divulgadas, acabaram caindo na casa da vizinha, localizada abaixo da fábrica, e saíram pelo imóvel.

"Eu estava em outro cômodo, no sótão, botando tudo para cima e os outros rapazes estavam tentando tirar a água de lá. Aí teve um barulho muito alto. Foi quando a laje caiu. Eu desci e vi tudo caindo. Comecei a gritar pelos três funcionários, só que nenhum respondeu. A casa estava balançando muito, achei que fosse cair toda e conseguimos pular a janela. Nós subimos em cima de um carro para tentar escapar. A água estava tão forte que começou a levar os carros com a gente em cima", contou ele, que foi salvo por uma vizinha.

Catuaba disse que ele e as mulheres —uma colaboradora que estava na fábrica ajudando a dobrar as peças e uma vizinha abrigada no local— pensaram que os funcionários haviam morrido.

"Entrei numa crise, mas alguns minutos depois eles [os três funcionários] apareceram atravessando a rua. Eles caíram na casa de uma vizinha. Ninguém teve ferimento grave."

Segundo ele, a laje caiu de uma altura de até 3 m. "Caiu 2, 3 m para baixo. Eles [os funcionários] caíram praticamente dentro da casa de uma vizinha que fica mais para baixo e saíram por lá. Caiu uma parte da casa dela devido ao galpão ter caído."

O prejuízo da empresa ainda não foi estimado pela família. Um vídeo enviado ao UOL mostra como o local ficou após o desabamento. O cenário é de destruição. Nas imagens, é possível ver parte do telhado no chão.

Raquel Vieira Silva, 40, proprietária da empresa, disse que a família perdeu tudo que tinha. "Na parte que desabou, a água já estava no joelho. Eram três pais de família que também estavam no local. Sou muito grata pela vida deles, de todos. Agora a preocupação é em recomeçar. Perdi o maquinário todo."

Outra estamparia desabou e matou 5 pessoas

Na rua dos Ferroviários, no Alto da Serra, uma outra estamparia desabou e cinco pessoas morreram no local. O funcionário Alex Sandro Condé, 42, contou ao UOL que perdeu o filho, de 18 anos, o irmão, de 34, e um amigo, de 35, que estavam no estabelecimento no momento do desabamento.

Condé disse que deixou a estamparia momentos antes de o imóvel ser atingido por um deslizamento de terra, mas os demais funcionários preferiram aguardar a chuva diminuir.

"Foram dois livramentos. Poderia estar na estamparia ou na minha casa que por pouco também não foi atingida. Uma das poucas da região que não caiu. A barreira levou tudo em questão de segundos e parou a menos de 1 m da minha casa. Já deixei a casa e estou em um abrigo. Perdi meu filho, mas tenho certeza que ele está do lado de Deus."

Segundo o estampador, o irmão dele, Ivan Condé, demorou 13 horas para ser retirado dos escombros pelos bombeiros. Os corpos do filho Caíque e do amigo Thiago das Graças também foram encontrados. Os três já foram sepultados.

O Corpo de Bombeiros faz buscas há mais de uma semana em diferentes pontos de Petrópolis. Ao menos 198 óbitos foram confirmados no município. Do total, 181 vítimas foram identificadas, e 68 pessoas são consideradas desaparecidas.