O drama de 10 famílias que perderam ao menos 2 pessoas em Petrópolis
Débora Lichtenberger Moreira foi atingida por escombros enquanto tentava se proteger com os dois filhos em um quarto da casa onde morava. Ana Beatriz Seraphim postou um vídeo do temporal instantes antes de morrer com a mãe Isabel Cristina, o irmão Emerson e o filho Theo, de 10 meses.
Histórias assim fazem parte da realidade de mais de dez famílias em luto pela perda de ao menos dois parentes na tragédia que deixou mais de 190 pessoas mortas e é apontada como a mais letal da história da cidade de Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro.
Enzo, 6, foi visto pela última vez quando deixou a casa da avó em meio ao temporal para encontrar os pais Leonardo Alves de Alcântara Stanzani e Graziele Stanzani, grávida de oito meses. Os três estão desaparecidos desde o deslizamento de 15 de fevereiro.
"Eu vou na casa dos meus pais. Vai ser rapidinho", disse o pequeno Enzo. O irmão mais novo dele, Heitor, 2, só sobreviveu porque foi levado pela avó, que deixou a casa às pressas por um buraco na parede.
Flávia Stanzani Barbosa, 21, que estuda odontologia em Juiz de Fora (MG), ficou sabendo da tragédia ao receber vídeos encaminhados por WhatsApp pela mãe, a dona de casa Elisabete Alcântara Stanzani, 49, que estava sozinha em uma casa próxima e continua desaparecida. "Foram cenas horríveis. Petrópolis está irreconhecível", disse Flávia ao UOL.
Oito pessoas da mesma família morreram na casa ao lado. Joyce da Silva Affonso estava com os filhos Sofia, 4, e Miguel, com apenas três semanas de vida. Os três corpos foram encontrados em meio aos escombros na última segunda-feira (21).
No mesmo imóvel, morreram outras duas crianças: Arthur e Larissa, de 5 anos. A menina é filha de Michele Azevedo, outra vítima da tragédia. Os corpos da avó Valdecir e da tia, Ana Carolina Affonso, foram localizados no dia 18.
'Cuida da gente': planos soterrados
Arrastado pela enxurrada de lama enquanto estava em casa, Fábio Machado Silva, 44, sobreviveu. Ele é pai de Mila Maranguape Silva, 13, Stephanie Maranguape Silva, 11, e Daniel Maranguape Silva, 6, que morreram em decorrência do deslizamento.
Eliane Regina Rufino morreu arrastada quando estava de mãos dadas com a filha Ana Clara Rufino da Silva, de 7 anos. O filho mais velho, Lucas, de 20, segue desaparecido.
Ontem (22), Isabele Rodrigues, namorada de Lucas, escreveu em seu perfil no Instagram uma carta aberta ao jovem desaparecido.
"Queria eu ter uma máquina do tempo pra te fazer voltar e realizar os nossos sonhos, ter nossa casinha, nosso casamento, e realizar seu maior desejo que era ter um bebezinho (...). Te amo, meu anjinho. Cuida da gente junto com a Clarinha [Ana Clara, irmã de Lucas] e sua mãe".
Família inteira levada pela lama
Alessandro Garcia, 38, professor e dono do canal Ministério dos Quadrinhos, no YouTube, está contando com uma rede de apoio para enfrentar os piores dias de sua vida. Morador de Petrópolis, ele teve a casa invadida pela água e perdeu os dois filhos, a esposa e os sogros.
Bento, o mais velho, um garoto autista de 5 anos, tinha chamado Alessandro de "papai" pela primeira vez um pouco antes da enxurrada. No mesmo dia, o garoto viveu seu primeiro dia na escola acompanhado pela irmã mais nova, Sophia, que tinha apenas 1 ano.
A esposa Carolina da Silva e a filha Sophia foram enterradas no sábado (19), mesmo dia em que encontraram o corpo de Bento. Um dia depois, no domingo, as autoridades identificaram os sogros Élcio José de Freitas e Maria Expedito.
Comovidas com a história, pessoas que fazem parte do universo das histórias em quadrinhos, paixão de Alessandro Garcia, se mobilizam para arrecadar dinheiro. "Ainda não tenho condições de falar muito, mas não tem preço toda acolhida. Não sei o que seria de mim se estivesse sozinho numa hora dessas", escreveu Alessandro no Facebook.
Mestre e doutor em Sociologia, o professor dá aulas no IFF (Instituto Federal Fluminense), em Maricá, e divide a função com seu canal Ministério dos Quadrinhos, no qual reúne mais de 26 mil inscritos e quase 2 milhões de visualizações. Outros canais, sites e editoras do meio têm utilizado as redes sociais para pedir doações. É o caso de Universo HQ, Pipoca & Nanquim, Comics, Toys & Travels, HQzasso, BBQs, Comix Zone, entre outros.
Veja abaixo os dados para doações por PIX ou transferência bancária:
Padre celebrou casamento e sepultamento de casal
Casados há um ano, o adestrador de cães Bernardo Albuquerque e a agente comunitária Sarah Walsh morreram ao serem atingidos pelo deslizamento em Petrópolis.
O padre Alan Rodrigues, que celebrou o casamento na Paróquia de Santo Antônio, no Alto da Serra, também foi o encarregado pela cerimônia de sepultamento do jovem casal. Ele contou a história em uma publicação em seu perfil no Instagram e conversou com o UOL sobre a relação que nutria com as vítimas.
"Eles começaram a morar juntos, mas eu queria que eles casassem. E foi assim que começou uma linda amizade. Eles eram como filhos para mim, foi muito intensa a nossa amizade".
No dia do deslizamento, ele conta que o casal chegou a assistir à missa pela manhã. "Eu fui transferido há sete meses de paróquia, mas eles me mandavam mensagem sobre ter ido à missa todos os dias. Eles diziam que ficaram mais unidos a Deus", conta.
Outras famílias atingidas pela tragédia
Marcelo Antônio Kronemberger Mendes, de 53 anos, chegou a fazer uma ligação para a esposa pouco antes do desmoronamento destruir a casa onde ele morava no morro do Caxambu. O corpo dele foi encontrado em meio aos escombros na última sexta-feira (18) próximo ao do irmão, Luiz Antônio Kronemberger Mendes, 59.
Instantes antes de morrer, a aposentada Eni Schmid Seabra, de 67 anos, deixou uma mensagem no seu Facebook: "Muita chuva. Dá até medo. Deus olhai por nós", escreveu sobre a mesma tragédia que vitimou o seu irmão, Paulo César da Silva Seabra.
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