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Trineto de d. Pedro 2º pede fim do laudêmio e aponta descaso em Petrópolis

João Henrique de Orleans e Bragança, trineto de dom Pedro 2º, último imperador do Brasil - Reprodução/Facebook
João Henrique de Orleans e Bragança, trineto de dom Pedro 2º, último imperador do Brasil Imagem: Reprodução/Facebook

Juliana Arreguy

Do UOL, em São Paulo

23/02/2022 04h00

"Meus amigos todos me chamam de João. Se achar que precisa ser mais formal, pode ser dom João. Mas todo mundo me chama de João, viu?". Trineto de dom Pedro 2º, último imperador brasileiro, o empresário João Henrique de Orleans e Bragança não faz questão de mesuras. Tampouco faz questão do laudêmio, pagamento que virou alvo de polêmica em meio à tragédia de Petrópolis, que já deixou quase duzentos mortos.

"Sou contra e já falei isso. Acho uma taxa ultrapassada e que já teve seu tempo", relatou ele à reportagem do UOL.

O laudêmio é um pagamento feito pelos proprietários de uma terra aos donos do terreno após realizarem uma transação imobiliária. Não é uma cobrança exclusiva dos herdeiros da família imperial, também é recebida por prefeituras e até mesmo pela União.

No caso específico de Petrópolis, os descendentes da antiga família real recebem o laudêmio pelas transações envolvendo terrenos no Primeiro Distrito da cidade, uma das áreas mais afetadas pelas chuvas da última semana.

"Como a família [descendente da imperial] é mais conhecida, critica-se o laudêmio da família. Mas precisam ser analisados todos os laudêmios: da Igreja, de marinha e de outras famílias também", observou João Henrique.

Parte da polêmica em torno da cobrança se deu quando um dos primos de João, Betrand de Orleans e Bragança, autoproclamado príncipe imperial do Brasil, publicou uma mensagem manifestando seu pesar pela tragédia em Petrópolis. Nas redes sociais, foi criticado e teve o nome associado ao laudêmio — embora ele próprio não receba um centavo do valor.

Para entender a linhagem da família real no Brasil, é necessário saber que ela é dividida em dois ramos: o de Petrópolis, do qual João faz parte, e o de Vassouras (RJ), ramo em que se encontra Bertrand.

Pedro de Alcântara, filho mais velho da princesa Isabel e avô de João, abdicou da coroa para se casar. O trono — se ainda existisse — passou a pertencer a Luís de Orleans e Bragança, avô de Betrand. Há controvérsias entre a parentada sobre a sucessão ao trono, sobretudo porque Pedro abdicou de uma coroa que já não existia mais.

Mas é o ramo de Petrópolis que recebe os pagamentos pelo laudêmio.

FAMÍLIA IMPERIAL BRASILEIRA - Arte UOL - Arte UOL
Imagem: Arte UOL

"A tragédia é muito maior do que qualquer imposto e taxa. Precisamos focar a discussão no fato de ser uma tragédia estrutural e que nasceu errada, fruto da falta de políticas habitacionais nos níveis federal, estadual e municipal", avaliou João Henrique.

Ele mencionou outros incidentes que ocorreram no sul da Bahia, em Minas Gerais e no Maranhão — todos decorrentes de fortes chuvas — como exemplos de que o poder público faltou com a população em estratégias de prevenção.

"O que vimos agora, essa ocupação irregular, de gente humilde, que não tinha para onde ir e continua não tendo outros lugares para ir. Isso é culpa de políticos criminosos que só pensam na eleição e não querem saber se enxurradas vão levar a vida de famílias inteiras."

  • Veja a análise do advogado Augusto de Arruda Botelho sobre o tema e mais notícias no UOL News com Fabíola Cidral:

'Famílias reais não devem fazer política partidária'

"[O antropólogo] Darcy Ribeiro me disse, na minha casa lá em Paraty, que meu trisavô [dom Pedro 2º] foi o maior progressista do seu tempo, de ideias quase de esquerda para a época dele", comentou João Henrique, indicando transitar bem entre diferentes esferas políticas.

Suprapartidário, como se descreveu, ele relatou já ter negado um convite para trabalhar no governo de Leonel Brizola no Rio de Janeiro.

"Foi quando doei um terreno para uma escola e o governador à época, o Brizola, queria que eu entrasse no PDT", contou.

Contrário à ideia de se filiar a um partido, disse que seria o maior crítico de sua sigla e acrescentou que "as famílias reais não devem fazer política partidária".

Isso não impossibilitou que um de seus primos do ramo de Vassouras, o deputado federal Luiz Philippe de Orleans e Bragança, fosse eleito pelo PSL de São Paulo em 2018.

"A família toda é contra", explicou João Henrique, sinalizando que mesmo os descendentes da família real se desentendem quando o assunto é política.

O empresário também afirmou ser defensor da democracia e disse que não cabe mais no Brasil a ideia de voltar a ser uma monarquia.

"A monarquia funciona muito bem nos parlamentarismos da Europa. Na Suécia, na Noruega, na Dinamarca. Mas acho que o Brasil não está preparado para o parlamentarismo. Inclusive, a democracia no Brasil está regredindo publicamente", declarou, em tom crítico ao governo do presidente Jair Bolsonaro (PL), que vem desferindo ataques às urnas eletrônicas.

Sobre a temática do voto impresso, afirma que "o Congresso é soberano" e que a tática é "mais um populismo para gerar controvérsia e querer melar uma votação que pode não agradar um e outro".

"O Congresso decidiu pelo voto eletrônico. A lei está feita, não tem o que discutir", disse.

"Dom Pedro 2º estaria muito indignado com a qualidade da política de hoje. O nível dos políticos, a falta de respeito, ética e falta de respeito ao dinheiro público. Temos um dinheiro mal gasto num funcionalismo público que é uma casta com privilégios que, acho, nenhum outro país democrático tem", acrescentou.

Questionado se tem planos de viver no exterior caso a situação política e econômica do país piore, declara amor e respeito ao país e evoca os ensinamentos de seus antepassados para dizer que fica.

"Meu tataravô fez a independência do Brasil. Como vou ter passaporte europeu?"