Mulher vista com sem-teto em carro no DF diz: 'Eu não traí meu marido'
Sandra Mara Fernandes, a mulher que foi flagrada pelo marido personal trainer dentro de um carro com um homem em situação de rua em Planaltina (DF), diz que está sendo submetida a um tratamento para controlar um transtorno afetivo bipolar e que vem lidando com o que considerou uma "humilhação pública" desde que o caso virou de conhecimento generalizado, no mês passado. Ainda enfrentando críticas e ofensas nas redes sociais, ela afirma que não traiu Eduardo Alves, 31, e que, durante um surto, acreditou que o sem-teto fosse o seu companheiro. As declarações são de entrevista ao SBT Brasília, veiculada hoje.
"Eu nem acreditei que taxaram meu marido como corno nessa situação. Não entenderam o lado dele e também não entendem por que ele me defendeu tanto", disse Sandra.
Disseram que seria mais fácil ele me abandonar. Que mundo é esse em que abandonar uma esposa comprovadamente doente é mais fácil? Por que não aceitam que estou doente? Por que atacaram tanto ele? O Eduardo não tem que me aceitar, ele tem que me apoiar porque em sã consciência eu jamais teria feito o que eu fiz.
Sandra Mara Fernandes, comerciante
"Dilacerada"
Sandra diz que está sendo julgada como adúltera e que se sente "dilacerada" pelo modo como a sociedade tratou a história, mas que, no momento em que tudo aconteceu, estaria fora de si — e defende a reação do marido no momento em que a viu no carro, classificando o ato como de proteção. "Ele não é violento", afirmou.
Eu não esperava que tomasse a proporção que tomou. Me senti humilhada pela sociedade. Eu não aceito o que falaram sobre mim. Não é assim. Eu não sou essa mulher. Eu não traí o meu marido, eu não escolhi passar por um surto. O ato em si, eu não conhecia aquele homem. Eu achei sim que era o meu marido. E isso as pessoas não acreditam.
Quanto às declarações do homem em situação de rua Givaldo de Souza, 48, a comerciante afirma que teve que procurar ajuda na Justiça para que ele parasse de falar dela. "Era muita difamação. Essa pode ser a verdade dele, mas eu não aceito que ele acabe com a minha moral. Não vou aceitar mais que abram a boca para me atacar. Eu não sou essa personagem que criaram. Não vou mais me calar".
Antes do ocorrido, Sandra atuava no ramo de roupas em Brasília, onde vive há 12 anos, depois que se mudou de Minas Gerais. Ela diz ter chegado à capital federal em busca de uma qualidade de vida melhor, de oportunidades de trabalho e já ter trabalhado como empregada doméstica, recepcionista e funcionária de salão de beleza.
Com a repercussão do caso, hoje teve que abrir mão da loja de roupas que mantinha e as dívidas se acumularam, mas considera que seria muito difícil manter o negócio aberto por conta da curiosidade das pessoas.
"Eu não esperava isso. Imagine se eu estivesse lá, atendendo pessoalmente? Com certeza isso poderia ser um gatilho para eu ter uma crise novamente. Me explicaram isso enquanto eu estava internada. Que eu teria que prestar atenção em gatilhos do que poderia gerar uma nova crise. As pessoas não entendem a gravidade desse transtorno. Eu mesma não conhecia".
Tratamento prolongado
Para controlar os picos de euforia e depressão, Sandra conta que iniciou um tratamento com remédios, com acompanhamento médico, que irá durar a vida toda. "Eu fui diagnosticada com transtorno afetivo bipolar, confirmado por laudo médico. Que, no meu caso, foi de uma euforia muito grande que chegou ao surto psicótico, porque pode chegar nesse nível".
Entre os efeitos colaterais do tratamento, ela cita uma sonolência excessiva e tremores. "Não consigo ficar muito eufórica e também nem ficar muito triste. Ele (o remédio) estabiliza o seu humor. É o que eu sinto hoje".
Sandra disse que, enquanto estava internada no hospital, não tinha dimensão do que acontecia nas redes sociais. Ela disse que levou 15 dias para começar a entender o que tinha passado e que não tinha ideia do quão sério seu caso ficou.
Nova "fama"?
Sandra refutou as críticas de que o casal estaria se aproveitando da repercussão do caso para ganhar mais seguidores nas redes sociais. Porém, avisa que está abrindo o espaço para que profissionais em saúde mental e pacientes possam trocar experiências e informações sobre doenças como a dela.
Foi uma surpresa, mas não foi proposital. Eu trocaria tudo para voltar a ter a vida que eu tinha, no anonimato. Uma fama dessa ninguém iria querer, eu não queria.
A comerciante afirmou também que pretende manter a loja de roupas funcionando na internet e agradeceu pelas mensagens de apoio que vem recebendo.
"Vocês defenderam uma mulher honesta, de caráter e que preza muito pela família". Quanto ao marido, diz que o amor só aumentou: "Agora quero casar com ele, porque por enquanto só moramos juntos. Quem quiser nos ajudar nessa empreitada, eu aceito".
Relembre o caso
Após encontrar Sandra com Givaldo dentro de um carro no bairro Jardim Roriz, em Planaltina (DF), no dia 9 de março, Eduardo espancou o homem em situação de rua, a polícia foi acionada e todos foram levados ao hospital. Imagens de câmeras de segurança registraram a agressão e foram compartilhadas nas redes sociais, ganhando repercussão nacional e se tornando um dos assuntos mais comentados no Twitter por dias.
Além do vídeo, imagens e dados pessoais das três pessoas envolvidas no caso foram divulgadas livremente nas redes. Todos se tornaram alvos de memes e o casal apagou redes sociais para evitar ataques.
Em sua defesa, Eduardo disse que pensou que a mulher estaria sendo vítima de um estupro. Givaldo teve que ser socorrido, bastante machucado, a um hospital local, recebendo alta dias depois.
Segundo informou o jornal carioca O Globo, um laudo apontou que a comerciante passava por uma fase maníaca psicótica do transtorno bipolar quando foi flagrada pelo marido com Givaldo. O relatório médico relata que ela apresentava "alucinações auditivas", "delírios grandiosos e de temática religiosa", alteração de humor e "comportamentos desorganizados e por vezes inadequados". Ela ficou internada em um hospital psiquiátrico.
A defesa do casal alega que o caso afetou toda a família e uma nota de esclarecimento assinada por Alves afirmou que, além de sofrer a violência sexual, ela sofreu outra violência ao ser acusada de traição em rede nacional. As investigações devem esclarecer se houve ou não violência sexual. O caso está sendo oficialmente investigado como "legítima defesa de terceiros".
Givaldo Alves passou a ser convidado para entrevistas e ser reconhecido nas ruas. No final de março, ele pediu desculpas pela exposição da intimidade da mulher em entrevista concedida ao político Ricardo Caiafa no YouTube. Ele afirmou que se sente envergonhado pela situação e ainda disse que não fala sobre as relações sexuais que tem nem mesmo com os amigos.
O caso está sob jurisdição da 16ª DP de Planaltina e Eduardo é investigado pela agressão. Até o momento, o inquérito não foi concluído pela polícia.
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