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Após 10 h no mar, mulher dada por morta reaparece: 'Morri, mas passo bem'

 A esteticista Priscila Pereira da Silva, 46 - Arquivo pessoal
A esteticista Priscila Pereira da Silva, 46 Imagem: Arquivo pessoal

Heloísa Barrense

Do UOL, em São Paulo

20/05/2022 13h09Atualizada em 23/05/2022 14h25

Priscila Pereira da Silva, 46, ainda se recupera dos arranhões e das dores musculares provocadas pelas quase dez horas que ficou desaparecida no mar, na terça-feira (17). A esteticista de Guaraú, no litoral paulista, em Peruíbe, foi dada como morta pelo Corpo de Bombeiros, depois de ter sido levada por uma forte onda enquanto caminhava com a patroa na praia. Amigos e familiares chegaram a prestar homenagens póstumas nas redes sociais, até o momento que ela reapareceu na cidade. Viva.

"Eu tinha saído para caminhar com a minha patroa, por volta das 6h ou 7h da manhã. A gente sempre faz isso todo dia de manhã. Ficamos sempre com água no joelho. No final da praia tem o rio, onde a gente improvisa uma hidroginástica e depois volta. Só que naquele dia, bateu uma onda muito forte quando estávamos lá", disse ela, em entrevista ao UOL.

Priscila conta que, segundos antes de a onda bater, a patroa aconselhou que as duas saíssem do mar. No entanto, não conseguiram chegar à praia a tempo. "Eu senti ela indo para o lado da areia e eu para o fundo. É um lugar que geralmente somos muito cuidadosas, mas tudo aconteceu muito rápido. A onda cobriu a gente."

Gritos por socorro

A esteticista diz que gritou por socorro, mas não conseguiu se fazer ouvida pela patroa. Ela conseguiu passar pela área onde as ondas quebravam e chegou ao fundo do mar, onde só existiam as "marolinhas".

O local fica próximo a uma Marina. Ai eu pensei: 'Vou boiar, porque ela [a patroa] saiu. Ela vai pedir ajuda, eles vão colocar o barco e eu to aqui perto'. Só que não foi assim que aconteceu.

Ela relembra que ficou por um bom tempo boiando no mar aguardando o resgate. Em dado momento, ela conseguiu ver que na praia havia o carro do resgate e se sentiu segura de que em breve conseguiria voltar à terra firme.

Só que eu fiquei boiando e não chegava ninguém. Pensei que tivesse acontecido alguma coisa porque não via jet ski, não via bote. Então comecei a ficar preocupada e a nadar cachorrinho. Quando eu olhei, já estava longe de onde eu tinha me afogado.

De um lado, Priscila via a areia da praia distante. Do outro, o mar aberto. "Ali também tinha uma ilha e eu tava entre ela e a praia, mas longe das duas. Comecei a pensar na minha filha, a Bárbara, de 7 anos. Eu não podia desistir. Somos só nós duas e eu preciso cuidar dela."

Priscila seguiu nadando e boiando no alto-mar na expectativa de que alguém avistasse ela em algum momento. No entanto, todas as tentativas de ser vista foram fracassadas. "Teve uma hora que as ondas não estavam no sentido da praia e eu fiquei pensando que o ideal seria ir com elas, porque elas poderiam me levar para algum lugar. E então cheguei próximo a umas pedras. Na minha cabeça, eu ia chegar lá e subir, mas foi horrível. Eu acabei me ralando inteira, mas consegui subir em uma pedra seca, pois já estava com muito frio."

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Priscila durante resgate após afogamento
Imagem: Arquivo pessoal

Ao chegar nas pedras, Priscila diz que um jet ski passou por ela, mas não a viu. "Eu pulei no mar para pedir ajuda e bateu um desespero porque, dessa vez, eu senti toda a sensação de afogamento. Eu afundei mais duas vezes, vomitei e parei em outra pedra. Ali descansei, respirei, e percebi que tinha uma passagem que dava para uma trilha."

O retorno para a terra firme foi cansativo. Descalça, vestindo apenas biquíni e uma camiseta, Priscila se aventurou mata adentro para chegar até uma estrada que vai até Guaraú, subindo aos poucos pela trilha improvisada. "Eu comecei a pedir carona, mas eu estava horrível. O meu olho ficou muito vermelho, minhas pernas ensanguentadas e acho que as pessoas estavam com a impressão errada de mim."

No entanto, a confeiteira Fábia Martins do Nascimento, que mora em Guaraú, estava passando pelo local por volta das 16h e acabou reconhecendo a amiga. "Ela disse: 'Pri, eu acabei de ver no grupo que você estava desaparecida'. Ela já me colocou no carro e começou a chorar."

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Amigos enviaram mensagens de condolências pela morte de Priscila
Imagem: Arquivo pessoal

Ao UOL, Fábia contou que foi segurando a mão da amiga até a cidade. "Foi muito emocionante. Eu chorei o resto da tarde", disse ela. "Ela só falava na filha dela, e foi o que deu forças para ela. Foi um milagre."

Conversando com a amiga, Priscila percebeu que tinha sido dada como morta pelo Corpo de Bombeiros. Segundo ela, a patroa já havia entrado em contato com uma psicóloga infantil para atender a filha dela e tinha pegado o celular entre seus pertences para informar o ocorrido ao irmão dela, que, após ter acesso ao aparelho, chegou a divulgar a morte de Priscila nas redes sociais.

Quando eu cheguei, as pessoas começaram a gritar que eu estava viva. No mar, eu perdi toda a noção. Não sabia que tinha tanto bombeiro, que estavam procurando um corpo, e não sobrevivente. Aí eu chorei. Eu estava morta. Foi um negócio de 'pirar o cabeção'. Eu pensei: puxa, eu estou no meu velório, então? Eu fiquei sem entender nada. Eu comecei a ler as homenagens que fizeram para mim... Foi esquisito. Morri, mas passo bem.

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Amigas lamentaram morte de esteticista
Imagem: Arquivo pessoal

Entre os textos recebidos, amigos relatavam que Priscila era uma "amigona" e que tinha o coração "enorme". "Fiquei com uma sensação de agradecer mais e reclamar menos. Eu era uma pessoa muito rabugenta. Eu pedi tanto para Deus para ter misericórdia e eu acredito que foi um milagre", reflete Priscila. Ela foi atendida pelo Corpo de Bombeiros quando chegou, e depois liberada.

Priscila conta que confrontou a corporação sobre a versão da morte dela. "Eu até conversei com eles que tinham é que procurar gente viva. Eles me explicaram que, em casos como esse, pessoas que se afogam morrem muito rápido".

Ao UOL, o Corpo de Bombeiros de Peruíbe negou a informação de que ela havia sido dada como morta e informou que sempre trabalhou com a hipótese de que Priscila estava desaparecida, não cessando as buscas durante o dia.

O retorno ao oceano, por sua vez, ainda é incerto. A esteticista conta que chegou a visitar a praia nesta semana após o acidente, mas não sabe se ainda tem coragem de entrar no mar.

"Eu fico olhando ele e não sinto medo. Mas não sei se tenho coragem de entrar. Ainda estou com muita dor. Essa noite eu sonhei que estava lá de novo e acordei esbaforida. Então, não sei quando vou voltar", admitiu a esteticista.