'É um novo Minhocão': monotrilho tem obra atrasada com orçamento de R$ 5 bi
Um transporte coletivo parecido com o usado na Disney (EUA). Moderno, mais barato e mais rápido de ser construído que o metrô. Foi assim que o monotrilho foi apresentado, em 2009, quando o governo de São Paulo passou a projetar as linhas. Quatorze anos depois, a realidade se mostrou diferente, e o modal virou sinônimo de acidentes, obras atrasadas e gastos bilionários.
A capital tem hoje duas linhas de monotrilho, mas apenas uma delas funciona e de forma parcial.
- A linha 17-Ouro, na zona sul, está em construção desde 2012, com orçamento de R$ 5,1 bilhões para implantação. O Metrô executou 50% desse valor (cerca de R$ 2,5 bilhões).
- A implantação da linha 17-Ouro atingiu 60%. Segundo o Metrô, trabalhos como a fabricação de trens e a instalação de sistemas seguem em realização.
- Já a linha 15-Prata, na zona leste, registrou vários acidentes desde que foi inaugurada, em 2014. O último deles aconteceu no último dia 9 e prejudicou passageiros e o trânsito na avenida Sapopemba.
Moradores da região reclamam do abandono das obras na linha 17-Ouro. A estação na Avenida Jornalista Roberto Marinho, na zona sul, parece quase pronta, mas a altura das árvores atingindo o trilho e as escadas rolantes, envoltas em plástico, mostram que a obra ainda está longe de terminar.
É um novo Minhocão e parece que nunca vai acabar. Passou a servir de abrigo para moradores de rua e usuários de droga."
Dalva Ferreira, 65, aposentada e moradora do bairro há 20 anos
É uma frustração muito grande ver esse projeto parar. Fomos até ajudando a montar melhorias nas adjacências, como a reforma de praças. Os moradores têm se juntado para melhorar questões de segurança e reduzir essa sensação de abandono do local com bons resultados."
Marcos Smetana, presidente da Associação de Moradores da Vila Cordeiro
Legado da Copa de 2014
A linha 17-Ouro —que seria um legado da Copa do Mundo, realizada há quase nove anos no Brasil— tem, agora, previsão de entrega para 2024 ou 2025. A expectativa inicial do governo era entregar, até o fim de 2013, uma linha com 17,7 quilômetros de extensão e 18 estações ao custo de R$ 3,1 bilhões.
O trajeto original ligaria a estação Jabaquara, na zona sul, à estação São Paulo-Morumbi, na zona oeste. Um ramal levaria ainda à estação Congonhas, acessível ao aeroporto. A estimativa era transportar 450 mil passageiros por dia.
Em 2017, a previsão já era de uma versão menor e mais cara, com 7,7 quilômetros e oito estações —de Congonhas à estação Morumbi da CPTM— e custo de R$ 3,5 bilhões. A expectativa era a de transportar cerca de 165 mil passageiros por dia útil, número semelhante ao atendido por um corredor de ônibus, muito mais barato de ser construído.
O monotrilho é um sistema de transporte que circula sobre pneus, em vias elevadas. O projeto anunciado era de implantação mais rápida, sem a necessidade de desapropriar muitos imóveis —como acontece em obras para o metrô subterrâneo. Ele seria também uma opção mais atraente do que um corredor de ônibus, por levar os passageiros de forma mais rápida e confortável.
Na época do início da construção, estimava-se que um quilômetro de monotrilho custaria ao menos R$ 40 milhões, contra cerca de R$ 200 milhões do metrô. Já um corredor de ônibus sairia por R$ 5,5 milhões.
Ao longo dos anos, o Metrô acumulou problemas com as empresas. Em 2020, a previsão de entrega anunciada era para 2022. No entanto, houve novos atrasos e o consórcio formado pelas empresas KPE e Coesa (antiga OAS) abandonou a obra, informou o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).
"Vamos rescindir o contrato, vamos punir a empresa e buscar alternativas", disse Tarcísio, no último dia 2. A reportagem procurou as empresas, mas não obteve retorno.
Em nota, o Metrô informou que o processo de rescisão do contrato está em andamento e o consórcio recebeu a notificação que aponta atrasos e multas que podem chegar a R$ 100 milhões, além da possibilidade de suspensão para novos contratos públicos. A empresa disse ainda que avalia alternativas legais para que uma nova construtora continue as obras.
Acidentes na linha 15-Prata
Na última semana, dois acidentes foram registrados na zona leste, mas não houve feridos. Em 2020, o estouro de um pneu lançou um pedaço de metal na avenida Sapopemba. O incidente paralisou a linha por cerca de 100 dias.
Dá medo, principalmente em horários de pico ou quando está chovendo. Às vezes, ele para no meio [do trajeto] ou para na estação e demora para abrir as portas."
Stefanie Ribeiro, estudante que usa o monotrilho todos os dias
A causa do incidente mais recente passa por apuração, e o Metrô informa que reabriu aos usuários após rigorosas inspeções.
A auxiliar de limpeza Reide Justiniano diz usar o transporte quando está atrasada para o trabalho e elogia a rapidez. "Da Vila Prudente para São Mateus gasto de 15 a 18 minutos. É muito mais rápido; de ônibus eu gasto uma hora."
A linha tem 11 estações, ligando a Vila Prudente ao Jardim Colonial, e 14,5 km de vias. Transporta, em média, 115 mil passageiros diariamente. Há obras em andamento para ampliação até Jacu Pêssego, com previsão de conclusão em 2025.
O Metrô informou também que está concluindo o processo de licitação para contratar as obras civis de ampliação até a futura estação Ipiranga.
Especialistas criticam o modelo para transporte em massa. O engenheiro e consultor de transportes Peter Alouche, que trabalhou por 35 anos no Metrô, elencou questões problemáticas sobre o modal, como a segurança no caso da necessidade de retirada dos usuários nas alturas, e a tecnologia, que não é universal.
No Metrô, se você não gosta de um trem, coloca outra fabricante no lugar. No monotrilho, você fica refém dessa tecnologia até o fim dos séculos, sempre dependendo do fornecedor."
Peter Alouche, engenheiro e consultor de transportes
O Metrô disse que trabalha para tornar o transporte sobre trilhos cada vez mais eficiente, inclusivo, moderno e seguro para a população.
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