7 horas por dia, de manhã e à tarde: ela caminha sem parar em busca de água
Todos os dias, sem descanso, a agricultora Francisca Oliveira, de 55 anos, começa a jornada cedinho. Caminha até um açude distante de onde mora e carrega água na cabeça em um balde.
Ela mora no Sítio Sombra, município de Angico, região do semiárido do Rio Grande do Norte.
Pela manhã, são de duas a três viagens. À tarde, segue o ritual até completar seis viagens. No total, são sete horas de caminhada por dia em busca de água, segundo a agricultora.
"Para beber, eu pego duas latas de água com a minha cunhada e, para a casa, eu pego no açude. Tem vezes que a minha cunhada não quer dar, o aperreio é grande sem uma cisterna", afirma Dona Chica, como é conhecida.
Sem acesso à água
O caso da agricultora não é isolado.
Em pleno século 21, na região do semiárido brasileiro — que compreende os nove estados do Nordeste e a região norte de Minas Gerais — um milhão de pessoas vivem sem acesso à água para consumo humano. Só no estado do Rio Grande do Norte, são 7 mil e dona Francisca é uma delas.
Os dados são da publicação "Acesso à água para populações do Semiárido brasileiro", de 2019, produzida pela Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), uma rede de três mil organizações que trabalham em toda a região.
Na região do semiárido, as chuvas se concentram em apenas quatro ou cinco meses do ano e, nos demais, ocorre o período de estiagem — por isso, armazenar água determina se é possível ou não viver na região.
Sonho da cisterna
Para essas pessoas, uma cisterna, tecnologia capaz de armazenar água da chuva para torná-la adequada ao consumo humano, resolveria o problema.
O reservatório é capaz de fornecer água para beber e cozinhar por até oito meses, período que dura a estiagem. Mas, para Dona Chica, ainda é um sonho.
"Ô, meu Deus, queria tanto ganhar a minha cisterna. Me descansaria dessas caminhadas."
O programa federal de cisternas viu seu orçamento despencar nos últimos anos, principalmente na gestão de Jair Bolsonaro, conforme reportagem da Folha de S. Paulo.
No universo particular de Francisca, os filhos, marido e netos não podem ajudá-la no trabalho de abastecer a casa com água. O pessoal passa o dia trabalhando para garantir comida no prato e pagar outras despesas.
Não posso esperar pelo povo para ter água, porque tem de fazer as coisas em casa, então, eu mesma pego
'Bebi, fazer o quê?'
Francisca tem câncer de pele — por isso, não poderia se expôr ao sol — e sofre com hérnia de disco. Mas a sede e o trabalho doméstico, que dependem de água, não lhe dão descanso.
A água do açude não é potável. No entanto, quando a cunhada não pode emprestar água da sua cisterna, a do açude é a que resta, inclusive para matar a sede. "Bebi, fazer o quê, né? É o jeito!", conta.
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