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SP: Casal é condenado por manter mulher trabalhando sem receber por 33 anos

Imagem para uso em chamadas sobre trabalho escravo, escravidão, semiescravidão, trabalho forçado - Mario Tama/Getty Images/AFP
Imagem para uso em chamadas sobre trabalho escravo, escravidão, semiescravidão, trabalho forçado Imagem: Mario Tama/Getty Images/AFP

Colaboração para o UOL, em São Paulo

03/04/2023 20h20

A Justiça do Trabalho de São Paulo condenou um casal a indenizar uma empregada doméstica em R$ 800 mil por mantê-la em condição análoga à escravidão por 33 anos, de janeiro de 1989 a julho de 2022.

O que aconteceu?

A quantia representa salários atrasados, dinheiro a que a vítima tem direito pelo período que prestou serviços à família sem receber nenhum vencimento, verbas rescisórias, além de indenização por dano moral individual e coletivo.

Segundo depoimento da vítima, ela foi procurada no abrigo em que morava para trabalhar como empregada doméstica na residência do casal e para cuidar do filho pequeno em troca de um salário mínimo por mês. Entre as obrigações, ela deveria limpar a casa e servir as refeições para toda a família em uma jornada que começava às 6h e terminava depois das 23h.

Contudo, ela nunca chegou a receber pagamento pelo trabalho, nem teve direito a férias ou períodos de descanso.

A representação foi feita pelo Ministério Público do Trabalho a partir de uma denúncia feita pelo Centro de Referência Especializado de Assistência Social, após pedido de ajuda feito pela própria idosa a outra entidade assistencial da prefeitura de São Paulo.

Uma primeira tentativa de receber auxílio ocorreu em 2014. Na ocasião, houve uma conversa com o casal e foi acordado que eles registrariam o vínculo de emprego da vítima e pagariam os créditos trabalhistas devidos, o que não foi cumprido.

O que alegou o casal

O casal alegou que mantém laços familiares com a mulher e lhe proporcionaram ambiente familiar e acolhedor por anos, defendendo que a vítima dispunha de total liberdade de ir e vir, mas que por opção própria saía pouco de casa.

Também foi alegado que eles retiraram a doméstica de situação de rua, resgatando-lhe a dignidade e lhe garantindo afeto.

Eles negaram o trabalho em condição análoga à escravidão, pois, de acordo com eles, a "ação é um exagero". O casal alegou que fornecia tudo o que ela precisava, como casa, comida, roupas, calçados e dinheiro para cigarros e biscoitos.

O que disse a juíza

A juíza Maria Fernanda rebateu as alegações do casal, dizendo que a vítima não tinha "plena liberdade de ir e vir" e ela não tinha como "determinar os rumos" da própria vida pelas condições em que se encontrava.

Além da indenização de R$ 800 mil, a juíza também determinou que os réus registrem a carteira de trabalho da empregada, sob punição de multa diária de R$ 50 mil reversível à idosa.

"O labor em condição análoga à escravidão assume uma de suas faces mais cruéis quando se trata de trabalho doméstico. Por óbvio, a trabalhadora desprovida de salário por mais de 30 anos não possui plena liberdade de ir e vir. Não possui condições de romper a relação abusiva de exploração de seu trabalho, pois desprovida de condições mínimas de subsistência longe da residência dos empregadores, sem meios para determinar os rumos de sua própria vida".
Juíza Maria Fernanda Zipinotti Duarte