Estudante negro denuncia mulher por gestos racistas contra ele na USP

Um doutorando negro da USP (Universidade de São Paulo) relatou ter sofrido racismo em um ponto de ônibus dentro do campi Butantã, na zona oeste da capital paulista.

O que aconteceu

João Petronílio relatou que uma mulher branca se aproximou e começou a fazer gestos racistas. João aguardava um ônibus em um local próximo ao Crusp (Conjunto Residencial Universitário da USP) no último domingo (6) quando foi surpreendido.

Ao UOL, o estudante contou que a mulher o encarava e apontava para os traços raciais dele. "Passava os dedos na boca, segurando a parte inferior dos lábios (...) Passava a mão no nariz, indicando uma comparação", destacou.

"Ao fim de cada ação, ela cuspia no chão", acrescentou João em boletim de ocorrência. Segundo a denúncia registrada, a suspeita indicava uma comparação racial e, na sequência, cuspia no chão. Em determinado momento, o homem diz que a suspeita cuspiu perto dos seus pés.

Achei que não era comigo. Ela me olhou fixamente. Cuspiu no chão longe de mim, e depois fez novamente perto de mim. Eu já sabia que ela estava fazendo esse gesto porque ela não queria verbalizar. Ela fez conscientemente. Eu quero que você tenha coragem de falar o que você está gesticulando, falei. No vídeo ela repete o gesto.
João Petronílio, doutorando USP

Ação foi gravada por testemunhas

Testemunhas presenciaram a ação. No ponto de ônibus, além de João, outras três pessoas presenciaram os atos e gravaram a ocorrência — apontando para um comportamento racista da suspeita. Nos registros, a mulher é flagrada repetindo um dos gestos. Ela é branca, de estatura média e veste uma camisa da Argentina no momento da ação.

Pesquisador confrontou a mulher e perguntou o que ela estava querendo dizer. Houve uma discussão, e outras pessoas tentaram intervir. Após o episódio, João narra que ficou desestabilizado emocionalmente.

João registrou boletim de ocorrência por injúria racial. Doriana Carvalho, advogada que assessora o estudante no caso, disse ao UOL que ofícios foram encaminhados à universidade e para a Polícia Civil, com o objetivo de responsabilizar a autora. Também foi solicitado o acesso às imagens da câmera de segurança próxima ao local.

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Mulher foi identificada, diz USP

USP confirmou a denúncia. A universidade diz que encaminhou informações para a Polícia Militar e ao Gecradi (Grupo Especial de Combate aos Crimes Raciais e de Intolerância) do Ministério Público do Estado de São Paulo. Além disso, a instituição informou que presta auxílio ao doutorando e que ele pode buscar ajuda junto a sua unidade de ensino.

A mulher suspeita de injúria racial foi identificada, segundo a universidade. De acordo com nota encaminhada ao UOL, "trata-se de uma ex-aluna que vive de forma irregular no Conjunto Residencial da USP".

Mulher deveria ter deixado residência universitária em 2023. Ainda segundo a instituição, houve a solicitação de retirada do local, que não foi cumprida pela suspeita. Como o nome não foi divulgado, a reportagem não conseguiu contato por um posicionamento. O espaço segue aberto para manifestação.

'Estou vulnerável', destaca estudante

João diz temer uma retaliação após a denúncia. Ele acredita que há a possibilidade de encontrar a mulher pelo campus.

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Enquanto eles estão fazendo essa notificação, estou vulnerável, pois estou aqui e ela não foi tirada do lugar, e estou aqui exposto. Estou solicitando um esquema de segurança para que eu fique seguro em relação a essa pessoa. Não me deram nenhum retorno efetivo de segurança.
João Petronílio, doutorando da USP

USP indicou que o estudante pode procurar a guarda universitária. Ainda de acordo com a instituição, a guarda pode orientá-lo referente às ocorrências.

Racismo x injúria racial

A Lei de Racismo, de 1989, engloba "os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional". O crime ocorre quando há uma discriminação generalizada contra um coletivo de pessoas. Exemplo disso seria impedir um grupo de acessar um local em decorrência da sua raça, etnia ou religião.

O autor de crime de racismo pode ter uma punição de dois a cinco anos de prisão, além de multa. Trata-se de crime inafiançável e não prescreve. Ou seja: no caso de quem está sendo julgado, não é possível pagar fiança; para a vítima, não há prazo para denunciar.

Já a injúria racial consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião ou origem a fim de atacar a dignidade de alguém de forma individual. Um exemplo de injúria racial é xingar um negro de forma pejorativa utilizando uma palavra relacionada à raça. A Lei 14.532/2023, publicada em janeiro de 2023, equipara a injúria racial ao crime de racismo.

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