Bíblia, drogas e fuzis: como Peixão usa religião para expandir poder no RJ

Alvo de uma operação policial nesta semana que encontrou um "resort de luxo" com piscina, academia e um lago com carpas no Complexo de Israel, zona norte do Rio, o traficante Peixão tem usado a religião para expandir a sua atuação criminosa e enfrentar o Comando Vermelho.

O que aconteceu

Versículos, drogas e fuzis. Nas áreas sob o domínio de Álvaro Malaquias Santa Rosa, o Peixão, um dos líderes do TCP (Terceiro Comando Puro), há trechos bíblicos, bandeiras do Estado de Israel e imagens de Cristo em grafites e pinturas gospel. Estrelas de Davi também estavam na decoração do "resort do crime" descoberto pela polícia, onde havia ainda uma instalação em neon com o símbolo.

Bandeiras com a estrela distribuídas em torres por comunidades dominadas por Peixão. Evangélico, o traficante gosta de usar símbolos e personagens bíblicos.

O grupo ficou conhecido pela intolerância a religiões de matriz africana e por usar o nome de Deus para controlar áreas no Rio. No "resort" de Peixão, construído em uma área de preservação ambiental com dinheiro ilícito, a Polícia Civil também encontrou várias bíblias.

Lago artificial para carpas é encontrado em casa de traficante no Rio
Lago artificial para carpas é encontrado em casa de traficante no Rio Imagem: PCERJ/Divulgação

Inspirado na "gramática pentecostal", o traficante deu o nome de Complexo de Israel às favelas em que atua em referência à terra prometida para o "povo de Deus" na Bíblia. A facção ainda exige conversão e práticas religiosas específicas para adesão e permanência na organização.

Após serem presos, membros da cúpula da quadrilha chefiada pelo traficante se referiam a ele como "Irmão de Moisés". Peixão apelidou o seu grupo criminoso de "Tropa do Arão", em referência Arão à figura bíblica, irmão de Moisés. A operação ocorreu em maio de 2023, resultando na prisão de 10 pessoas em um bunker do TCP dentro de um projeto social de fachada a serviço do tráfico, segundo a polícia.

O mundo do crime se legitima pelo terror. Mas a religião faz com que ele [Peixão] adquira um outro tipo de poder diante dos seus comandados. Esses presos da cúpula da facção usavam termos bíblicos em conversas informais com os policiais, e demonstravam ter uma espécie de devoção pelo líder da quadrilha, a quem se referiam como 'Irmão de Moisés'.
Marcus Amim, delegado da Polícia Civil do Rio

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Como Peixão ocupou área do CV

Traficante invadiu áreas que eram reduto histórico do Comando Vermelho. Segundo fontes na Polícia Civil ouvidas pelo UOL, Peixão expandiu a sua área de domínio entre o fim de 2017 e o começo de 2018. A Tropa do Arão surgiu na Parada de Lucas, depois tomando o controle de Vigário Geral, Cidade Alta, Pica-Pau e Cinco Bocas, na zona norte do Rio.

A área é apontada como histórico reduto da principal facção criminosa do Rio de Janeiro, que tenta retomar esse território. "O Peixão tem um poderio bélico bem expressivo porque precisa disso para manter o Complexo de Israel e impedir as tentativas de invasão do Comando Vermelho", disse o delegado Marcus Amim.

Álvaro Malaquias Santa Rosa, conhecido como Peixão, é chefe do TCP
Álvaro Malaquias Santa Rosa, conhecido como Peixão, é chefe do TCP Imagem: Reprodução/Redes sociais

Drogas e armas vindas de fora do país. De acordo com investigações, Peixão tem sido um dos principais líderes do TCP na negociação para trazer drogas e armas de países como Paraguai, Colômbia e Venezuela devido à sua rede de contatos no exterior. "O Peixão é o principal articulador hoje do TCP e conta com uma rede de intermediários, que buscam armas e drogas no exterior", disse o delegado Marcus Amim.

Pelo menos 200 pessoas foram vítimas do TCP nos últimos dois anos no RJ. Em um dos golpes, os criminosos criam anúncios falsos de veículos na internet para sequestrar "clientes" interessados. O dinheiro que seria destinado à compra do carro é roubado e eles pedem Pix aos familiares para soltar os sequestrados.

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Ataque a religiões de matriz africana

Ele foi acusado de ataques contra religiões diferentes. Em julho de 2024, Peixão teria espalhado rumores entre moradores do Complexo de Israel de que bandidos armados iriam a igrejas católicas da região para fechá-las. Por precaução, três igrejas fecharam temporariamente. Além disso, o traficante não permite a prática de religiões de matriz africana, expulsando moradores, invadindo terreiros e depredando centros religiosos.

Evangélico, Peixão transmite orações via rádio. Além disso, utiliza o espaço para compartilhar visões e revelações que recebe, segundo a pesquisadora Viviane Costa, autora do livro "Traficantes Evangélicos", em entrevista à Ponte. Sua vida cristã, no entanto, é cercada de mistério: dizem que ele seria pastor, mas ninguém sabe exatamente de qual denominação.

Peixão é considerado foragido da Justiça. Contra ele, já foram expedidos dez mandados de prisões por crimes como tráfico de drogas, homicídio e ocultação de cadáver.

Essa influência de religiões sobre as dinâmicas de poder do tráfico sempre existiu. Mas a conversão de traficantes ao pentecostalismo é um fenômeno que tem características próprias, em um país que caminha para o crescimento pela adesão à religião evangélica.
Émerson Tauyl, advogado criminalista

6 comentários

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Fernando Fonseca

Parabéns ao trabalho da policia, mas uma pena que a justiça irá engavetar e nada irá acontecer aos criminosos.... que segundo as midias são vitimas da sociedade

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Cleiton do Prado Pereira

QUALQUER SEMELHANÇA (NO CASO DA BANDEIRA), NÃO É MERA COINCIDÊNCIA. Ela tem 6 pontas, dentro das pontas 6 triângulos e no meio um polígono de 6 lados. Os números falam por si.

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Fernando Fonseca

Conta com a cobertura e proteção da classe politica da esquerda, do judiciário e das midias cúmplices, ai a expansão de poder e controle esta garantida...

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