Crise no Brasil e inflação alta provocam queda no turismo na Argentina
A recessão brasileira parece ter afetado o fluxo de turistas brasileiros em direção à Argentina. A queda no acumulado dos nove primeiros meses de 2016 foi de 13,46% em comparação com o mesmo período de 2015. Foram à Argentina de janeiro a setembro do ano passado 661 mil brasileiros contra 763 mil em 2015, segundo dados do Ministério de Turismo da Argentina.
O país recebeu menos brasileiros nos sete primeiros meses de 2016 na comparação com 2015. Em agosto, o número registrado foi praticamente o mesmo nos dois anos: 81,9 mil no ano passado contra 81,4 em 2015. Já em setembro de 2016, foram 80,9 mil brasileiros, 5,1 mil a mais que em 2015.
Historicamente, os brasileiros representam o principal público turístico do país vizinho. Em 2015, os brasileiros representaram 16,78% dos 5,7 milhões de turistas que visitaram a Argentina.
Para Alexandre Panosso, professor de gestão do turismo da USP (Universidade de São Paulo), a recessão no Brasil é o principal fator que explica essa redução no número de visitantes em direção à Argentina.
“O turismo é volátil e aparece, na lista de prioridades das pessoas, depois da poupança, na base do que chamamos de pirâmide de consumo [junto com outros elementos considerados menos necessários e supérfluos]. Num cenário de crise acentuada como o que estamos vivendo, a tendência é postergar a decisão de viajar”, afirma.
Outro fator a ser considerado é a inflação, que em 2016 esteve em alta na Argentina. No acumulado até novembro, o índice medido pelas centrais sindicais do país chegou a 41,1%.
Pressionaram a inflação para cima, entre outras medidas econômicas adotadas por Mauricio Macri, a política apelidada pelo governo de “sinceridade tarifária”, por meio da qual o governo promoveu reajustes que variaram até os 500% nos valores pagos pelos argentinos nas contas de luz, gás e transporte público. Os aumentos visariam eliminar subsídios governamentais e equiparar as tarifas ao preço de mercado internacional.
Essa alta nos preços foi sentida no bolso de turistas como a advogada catarinense Silvana Barros da Costa. Moradora de Pinhalzinho, cidade localizada a 130 km da fronteira com a Argentina, ela se considera uma fã da Argentina: já visitou Buenos Aires mais de uma dezena de vezes e costuma ir várias vezes ao ano à fronteira para fazer compras.
Para ela, a inflação no país vizinho “é grande e acabou sendo repassada para o turista também. Ainda é vantajoso viajar para lá, mas os preços já foram mais competitivos”, afirma.
Silvana conta que, ainda assim, o custo-benefício de viajar para a Argentina “é ótimo, porque a nossa moeda ainda rende bem. Troco dinheiro sempre na rua a uma boa cotação. Neste ano passado, cheguei a comprar quase 5 pesos com R$ 1. Na Europa, a situação seria bem diferente”, afirma.
Fazendo as contas, a advogada chegou a cancelar uma viagem que tinha planejado para a Europa em 2016 e optou por voltar a Buenos Aires e conhecer a Bahia.
Segundo Panosso, épocas de crise fazem com que o turista troque o seu destino preferencial por outro mais acessível. No caso da publicitária paulistana Luciana de Morais, Buenos Aires foi a melhor opção para uma viagem romântica com o namorado em julho de 2016.
“Foi minha terceira viagem a Buenos Aires. Acabei escolhendo voltar porque encontrei passagens aéreas em promoção, pesquisei e vi que a viagem poderia sair mais barata que a ida a um hotel fazenda no interior de São Paulo”, diz.
Na comparação com as visitas anteriores ao país, ela conta ter sentido no bolso a alta nos preços “está tudo mais caro do que da última vez que fui, em 2013, mas consegui aproveitar tudo o que queria e não estourar o orçamento”.
A socióloga paulistana Sacha Palma foi duas vezes à Argentina. Da primeira vez, em 2011, passou dez dias em Buenos Aires. Em 2016, decidiu incluir novamente a capital portenha em seu roteiro de viagem com o namorado. O casal ficou dois dias na capital argentina e oito em Montevidéu, no Uruguai, em julho.
Sacha afirma que, apesar de ter gostado da rota que fez na Argentina, acabou gostando mais da capital uruguaia, “pelo preço e pela infraestrutura turística mais atrativos”. Ela conta que pretende voltar à Argentina, mas para conhecer Mendoza e a Patagônia.
Para a estudante de engenharia Esther Ribeiro, conhecer a Argentina, em julho, foi a realização de um objetivo que foi possível graças a planejamento e economia. Com cinco amigos, ela viajou por Buenos Aires, Córdoba, Rosário e Mar del Plata.
“A crise está aí, é um fato. Mas, com um bom planejamento dá para guardar dinheiro e ir, sim. É um destino muito bonito e próximo da gente”, afirma.
Por questões de segurança, Esther preferiu trocar dinheiro em bancos argentinos a cotações um pouco mais desfavoráveis que o câmbio nas ruas. Mesmo assim, ela conseguiu fazer todo o roteiro que havia planejado. Gostou tanto que voltou ao país em novembro por mais cinco dias.
Fluxo inverso
No caso dos turistas argentinos, a recessão no país vizinho não impediu que os "hermanos" continuem a ser os turistas internacionais que mais visitam as terras brasileiras.
No total, foram 2,1 milhões de argentinos no país em 2016, de acordo com dados apresentados pelo Ministério do Turismo na última quarta-feira (4). Eles ajudaram o país a registrar seu recorde no fluxo de turistas.
O número de turistas argentinos registrado em 2016 representa um pequeno aumento na comparação com 2015, quando o Brasil recebeu 2,07 milhões de turistas do país. Historicamente, os argentinos respondem por ao menos 30% dos turistas internacionais que chegam ao Brasil.
Para Alexandre Panosso, o fato de o Brasil ter sediado a Copa do Mundo, em 2014, e os Jogos Olímpicos, em 2016, ajudou a impulsionar a chegada de turistas. Ele lembra que o Brasil conseguiu bater a marca de 6 milhões de turistas pela primeira vez em 2014, recorde só superado em 2016.
Segundo Panosso, o Brasil pode ter se beneficiado também ao receber turistas argentinos de classes sociais mais elevadas, que costumavam viajar a destinos mais caros e distantes e que acabaram optando pelo país porque o custo seria menor. Ele afirma ainda que “as altas classes continuam viajando, mesmo em crise porque não são tão afetadas quanto os mais pobres”.
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