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Ex-diretor do FBI diz que Trump mentiu e acusa presidente de difamação

8.jun.2017 - Ex-diretor do FBI, James Comey, depõe no Senado, em Washington - JIM BOURG/Reuters
8.jun.2017 - Ex-diretor do FBI, James Comey, depõe no Senado, em Washington Imagem: JIM BOURG/Reuters

Do UOL, em São Paulo

08/06/2017 11h46Atualizada em 08/06/2017 17h16

O ex-diretor do FBI James Comey iniciou seu depoimento ao Comitê de Inteligência do Senado norte-americano nesta quinta-feira (8) dizendo que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, mentiu e o difamou, além de ter difamado também o FBI, quando demitiu o ex-chefe do órgão, em maio.

Horas depois, o advogado de Donald Trump falou em nome do presidente e negou as acusações de Comey.

Um dia antes, em depoimento prévio enviado ao Senado, o ex-diretor relatou ter sido pressionado por Trump a livrar o ex-conselheiro de Segurança Nacional Michael Flynn das investigações. Além disso, Trump questionou se o ex-diretor do FBI era leal a ele e se gostava do seu trabalho na chefia da agência.

Nesta quinta, Comey iniciou o depoimento falando sobre as circunstâncias de sua demissão. 

Comey se disse "confuso" com as mudanças de versão da Casa Branca sobre sua demissão, especialmente a primeira delas --que ele havia sido dispensado por causa de sua atuação durante a investigação sobre os e-mails de Hillary Clinton na eleição de 2016. "Isso não fez sentido nenhum para mim."

"Eu entendo que o presidente pode demitir o diretor do FBI sem nenhum motivo. Mas fiquei confuso, porque ele me disse repetidas vezes que eu estava fazendo um bom trabalho. Depois, a Casa Branca escolheu me difamar e, mais importante, difamar o FBI, quando o presidente disse que o órgão estava em 'desordem', era mal liderado e seus funcionários tinham perdido a confiança em seu líder. São mentiras, puras e simples. E lamento que o FBI teve que ouvir isso", disse Comey.

Comey afirmou ainda que o FBI "vai sobreviver" sem ele e ressaltou que a entidade é "séria, inocente e independente" nas investigações que faz.

Comey comandou o FBI (a polícia federal americana) até 9 de maio, quando foi demitido por Trump.

Ele assumiu o órgão em 2013, durante o governo Barack Obama, e tinha mandato até 2023. Ele era o responsável por liderar as investigações sobre a suposta influência russa nas eleições presidenciais americanas do ano passado, incluindo as suspeitas de ligações entre agentes do Kremlin e membros da campanha de Trump.

Ex-diretor do FBI, James Comey, antes de começar a depor no Senado, em Washington - Jim Bourg/REUTERS - Jim Bourg/REUTERS
Comey faz o juramento diante da Comissão do Senado
Imagem: Jim Bourg/REUTERS

Pressão de Trump sobre investigações

Aos congressistas, Comey falou novamente sobre as pressões sofridas nos encontros com Trump, a classificando como "muito perturbadoras".

Sobre o pedido do presidente de livrar Michael Flynn das investigações, ele disse que Trump não pediu explicitamente para que ele abandonasse a investigação, mas afirma ter considerou as palavras de Trump como uma recomendação.

"Quando o presidente me diz algo em privado, eu levo em consideração. Ele é o presidente dos EUA. As palavras de Trump foram 'Eu espero'."

"Lembro-me de dizer: ‘Concordo que ele é uma boa pessoa’, como uma forma de dizer 'Não estou concordando com o que você me pediu para fazer'", explicou Comey, sobre sua resposta à afirmação de Trump de que Flynn "era uma boa pessoa".

Comey afirmou ainda que não rejeitou imediatamente o apelo de Trump para abandonar o caso de Flynn porque ficou “atordoado” com a conversa. “O que me veio à cabeça foi ‘tenha cuidado com o que você diz”.

O ex-diretor do FBI afirmou que não sofreu e nem soube que o presidente tentou interferir ou parar a investigação da Rússia, e que o pedido foi limitado a Michael Flynn. Segundo ele, a posição de Flynn sempre foi "muito duvidosa" e lembrou que ele está sob investigação formal do FBI.

Ao ser questionado se o presidente Trump fez um ato de obstrução de Justiça, o que poderia levar a um processo de impeachment, Comey se limitou a dizer que "não cabe a mim" fazer tal afirmação.

Questionado pelos parlamentares, Comey disse que passou a registrar os memorandos desde janeiro, um hábito que ele adquiriu quando o novo presidente assumiu, porque estava "honestamente preocupado de que Trump poderia mentir".

Comey admite ter vazado memorando sobre encontro com Trump

O ex-diretor do FBI também admitiu ter divulgado à imprensa, por meio de um amigo --um professor da Universidade Columbia, ex-procurador federal--, o memorando que ele mesmo registrou sobre o encontro em que teria sido pressionado por Trump sobre Flynn.

O memorando foi divulgado pelo "New York Times" em 16 de maio, uma semana depois da demissão de Trump.

Comey disse ter agido assim após Trump ter ameaçado divulgar supostas gravações dos encontros. Segundo o ex-diretor do FBI, a intenção era que essa divulgação motivasse a nomeação de uma pessoa independente para chefiar as investigações sobre a Rússia --o que de fato acabou acontecendo, com o ex-diretor do FBI Robert Mueller, antecessor de Comey no órgão, assumindo o inquérito um dia depois.

“O presidente tuitou na sexta-feira, depois da minha demissão, que esperava ‘que não existissem gravações”, disse Comey. “Acordei no meio da noite da segunda-feira e percebi que era importante que a minha versão fosse vista."

O ex-diretor do FBI diz que pediu a um amigo, professor na Universidade de Direito de Columbia, que compartilhasse o memorando com um repórter. “Pedi que um amigo próximo o fizesse”, disse Comey, admitindo o vazamento.

Em outro momento, ele disse esperar que essas gravações citadas por Trump realmente existam e pediu para que elas sejam divulgadas. "Só posso ter esperança. O presidente sabe se me gravou ou não." Ele diz que não ficará "magoado" caso tenha sido gravado por Trump.

Rússia interferiu nas eleições, mas não conseguiu alterar votos, diz Comey

Ao responder as perguntas sobre as investigações da interferência russa nas eleições, Comey afirmou que não tem dúvidas sobre isso, mas ressaltou acreditar que essa interferência não foi bem-sucedida no sentido de alterar votos e comprometer a contagem final.

"Não deve existir nenhuma confusão sobre isso: os russos interferiram na nossa eleição no ciclo eleitoral de 2016. Este é um julgamento de alta confiança. Isto é sobre a América, e não sobre qualquer partido político", disse ele.

Ainda sobre esse caso, o ex-diretor do FBI falou sobre o motivo de não ter divulgado publicamente que Trump não estava pessoalmente sob investigação --segundo ele, outro pedido que Trump fez a ele durante os encontros.

Comey disse que não anunciou isso publicamente para não “criar o dever de corrigir, o que já vivi antes”. A afirmação é uma referência ao caso dos e-mails de Hillary Clinton, quando Comey disse no final da campanha de 2016 que o FBI estava investigando o caso –Hillary atribui sua derrota à atitude de Comey de reabrir o caso dias antes da eleição.

No fim do depoimento, que durou duas horas e meia, o ex-diretor disse acreditar que foi demitido do órgão por causa de sua atuação na investigação sobre a Rússia. "Fui demitido para, de alguma maneira, mudar a maneira com que a investigação estava sendo conduzida."

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