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Entenda por que as pessoas estão nadando do Marrocos para entrar na Espanha

Migrantes tentam chegar até Ceuta pelo mar

Allan Brito

Colaboração para o UOL, em São Paulo

21/05/2021 04h00

Uma cena tem chamado atenção do mundo todo: milhares de pessoas, inclusive menores de idade, estão nadando do Marrocos até a Espanha nesta semana. Isso já gerou mortes e cenas dramáticas, como um bebê resgatado no mar e um adolescente pego após usar garrafas plásticas para fazer a travessia. Mas por que esse movimento imigratório está ocorrendo?

Tudo começou por causa de um conflito diplomático entre Espanha e Marrocos. O governo do país africano fez críticas aos espanhóis por oferecerem atendimento hospitalar a Brahim Ghali, líder da Frente Polisário, movimento apoiado pela Argélia que busca independência da Saara Ocidental, território autônomo que é disputado por Marrocos, considerado economicamente muito atraente devido a seus recursos minerais.

Diante desse problema, o governo do Marrocos afrouxou os controles na fronteira de Melila, cidade do norte da África. Normalmente já existe um movimento imigratório ilegal a partir desta região, porque muitas pessoas querem sair de lá e chegar até Ceuta, para buscar uma vida melhor na Europa.

Ceuta é uma cidade autônoma administrada pela Espanha que fica no continente africano, na entrada do Estreito de Gibraltar. Há barreiras na fronteira com Marrocos, construídas pela nação europeia, para evitar a entrada de imigrantes vindos da África.

Com o controle de fronteiras mais livre no Marrocos, o movimento migratório disparou. Milhares de pessoas tentaram aproveitar a oportunidade e nadaram pelo Mar Mediterrâneo até Ceuta.

8 mil tentaram chegar a Ceuta

A estimativa é que pelo menos 8 mil pessoas já tentaram chegar a Ceuta nesta semana. Mas a maior parte delas foi enviada de volta para o Marrocos. Segundo a polícia espanhola, que foi reforçada, 850 migrantes de Marrocos ainda estão em Ceuta. Há um controle para tentar unir famílias que foram separadas durante a viagem. Alguns imigrantes podem ser aceitos pela Espanha.

Dois terços das pessoas foram mandados de volta para o Marrocos, segundo as autoridades espanholas, incluindo crianças desacompanhadas de até sete anos de idade. A maioria dos deportados afirma às autoridades que vai tentar voltar.

A Guarda Civil espanhola localizou ontem o corpo de uma pessoa nas proximidades da praia de Tarajal. Na segunda (17), o corpo de um marroquino que se afogou quando tentava nadar e chegar à Espanha também foi encontrado.

Enquanto isso, a guerra diplomática continua. O governo espanhol criticou Marrocos ontem. A ministra espanhola da Defesa, Margarita Robles, disse que o país africano cometeu "agressão" e "chantagem".

"Não é apenas uma agressão às fronteiras espanholas, mas às fronteiras da União Europeia. Marrocos pôs a vida de menores em risco. Não vamos aceitar nenhum tipo de chantagem. A integridade da Espanha não é negociável, nem está em jogo", prometeu Robles.

Já o vice-presidente da Comissão Europeia, Margaritis Schinas, advertiu que a "Europa não se deixará intimidar por ninguém" ante a crise migratória no território espanhol. "Todos devem saber que a Europa não se deixará intimidar por ninguém no tema da migração", disse ele, em entrevista.

Confrontos no lado marroquino

Descalços, ou de chinelos, com a roupa suja ou puída, milhares de pessoas, a maioria jovens, tentaram entrar em Ceuta. Junto com Melilla, este pequeno enclave de 84.000 habitantes constitui a única fronteira terrestre entre a União Europeia e a África.

Em Castillejos, mil jovens marroquinos atiraram pedras nas forças da ordem locais. Na sequência, atearam fogo a uma motocicleta. Já em Melilla, cerca de 100 migrantes tentaram, sem sucesso, pular a cerca da fronteira, informaram as autoridades locais, na terceira tentativa semelhante desde terça-feira.

A Espanha, que recebeu apoio das altas autoridades europeias, aumentou a pressão sobre Rabat (capital marroquina), um parceiro chave no controle do fluxo migratório.

O governo de Rabat, que manteve dias de silêncio sobre este assunto, relacionou diretamente a crise migratória à hospitalização na Espanha de Brahim Ghali, o líder do movimento de independência Frente Polisário, apoiado pela Argélia.

"O Marrocos não aceita a linguagem dupla e o jogo duplo de Madri", disse o chanceler marroquino, Nasser Bourita, à agência oficial MAP. "A verdadeira origem da crise é a recepção por Madri sob uma falsa identidade do chefe separatista das milícias de Polisario", acrescentou.

Ceuta disponibiliza telefone às famílias

Ontem, Ceuta disponibilizou um número de telefone para famílias marroquinas que procuram os seus filhos, que podem ser encontrados na cidade depois de terem entrado ilegalmente na segunda e terça-feira.

O serviço tem o objetivo de agilizar os procedimentos para que, logo após serem registrados, seja possível dar início ao processo de acolhimento temporário. A medida foi lançada pelo governo depois que várias famílias denunciaram nas redes sociais a marcha dos seus filhos à Ceuta sem o consentimento dos pais. Essas famílias alegaram que os seus filhos chegaram a Ceuta iludidos a assistir a um jogo de futebol ou a uma excursão e que atualmente não sabem onde se encontram.

*Com informações da EFE e AFP.