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Tradição e comida grátis: Por que ainda se caçam golfinhos nas Ilhas Faroé

25.jul.2015 - Moradores locais começam a correr na direção das baleias com arpões e ganchos durante o ritual grindadráp, nas Ilhas Faroé - Reprodução/Facebook/Sea Shepherd
25.jul.2015 - Moradores locais começam a correr na direção das baleias com arpões e ganchos durante o ritual grindadráp, nas Ilhas Faroé Imagem: Reprodução/Facebook/Sea Shepherd

Do UOL, em São Paulo

16/09/2021 15h28Atualizada em 16/09/2021 22h00

A "grindadráp", caça de mamíferos marinhos praticada há séculos nas Ilhas Faroé, chamou atenção no início desta semana pela matança de 1.400 golfinhos de uma só vez, quando a captura anual é em média de 250. Legalizada no território autônomo dinamarquês, a prática possui tradições alimentares milenares e, segundo pesquisadores, era uma boa forma de reunir e compartilhar alimentos, criando um senso de identidade comum.

Entretanto, os números do evento do domingo (12) chamaram atenção do próprio governo local, que classificou o episódio como "situação extraordinária".

De acordo com pesquisa realizada pelo Centro Sueco de Biodiversidade em parceria com Departamento de Sistemas Terrestres e Ambientais, da University of the South em Sewanee, nos Estados Unidos, o enfoque da prática é pela carne das baleias-piloto. Anualmente, segundo o governo, são cerca de 600 animais capturados. Além das baleias, golfinhos de laterais brancas são recorrentes na região e somam em média 250 capturas por ano.

A carne produzida por meio da caça é distribuída gratuitamente entre os participantes do evento e apenas dentro da comunidade local, um aspecto que se diferencia de outras caças ao redor do mundo, que visa a exportação. Aqueles que, por alguma razão, não possam participar do evento, devem se inscrever para receber uma parcela do alimento capturado.

Tanto a carne quanto outras partes do animal, como a gordura, ainda podem ser utilizadas como meio de troca por outros produtos de subsistência, segundo o estudo. Páll Nolsoe, assessor de Comunicação do Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cultura das Ilhas Faroé, afirmou em entrevista ao Plant Based News que é "bom senso econômico e ambiental aproveitar ao máximo os recursos naturais disponíveis" da região e que a prática fez com que as ilhas pudessem obter um "alto grau de autossuficiência na produção de alimentos".

Em comunicado publicado nesta semana, o governo afirmou que, se não fosse pela caça, o alimento teria que ser importado de outros lugares.

Os meios tradicionais de produção de alimentos a partir de recursos locais são um suplemento importante para a subsistência dos habitantes das Ilhas Faroé. Isso inclui ovelhas pastando nas montanhas, pesca costeira para uso doméstico e capturas ocasionais de baleias-piloto e outros pequenos cetáceos."

A carne capturada é consumida fresca, mas pode ser armazenada de maneiras tradicionais ou convencionais, como secagem ao vento ou deixada em estoque no congelador, segundo Kate Sanderson, Chefe da Representação do Governo das Ilhas Faroé.

No entanto, ativistas pela preservação dos animais vêm alertando para a grande quantidade de carne produzida, que pode ser excedente em relação ao número de moradores na região, de apenas 53 mil habitantes.

A PETA (Pessoas pelo Tratamento Ético dos Animais, em português), argumenta que a geração mais jovem rejeita a matança de animais nas ilhas e que em uma pesquisa com adultos faroenses, apenas 17% dos entrevistados disseram que consumiam carne de baleia-piloto e gordura regularmente.

"A caça hoje em dia está longe da caça tradicional de subsistência dos séculos anteriores", disse Rob Read, COO da Sea Shepherds, ao Euronews Green. "O grindadráp agora acontece com lanchas de alta potência e jet skis, e é como um esporte mascarado de tradição. A carne não é necessária para a comunidade faroense, e o método de caça é totalmente indiscriminado."

Para o governo das Ilhas Faroés, a caça do domingo (12) foi uma "situação extraordinária", principalmente "porque a concentração de animais era várias vezes maior do que o normal", diz comunicado nesta semana.

As autoridades ainda afirmaram que, diferentemente das baleias-piloto, "a caça ao golfinho não faz parte da tradição das Ilhas Faroé com o mesmo grau e não tem a mesma legitimidade cultural". O primeiro-ministro da região autônoma, Bárður á Steig Nielsen, afirmou que o episódio acendeu alerta para as autoridades.

Levamos este assunto muito a sério. Embora essas caças sejam consideradas sustentáveis, estaremos observando atentamente as caças aos golfinhos e que papel elas devem desempenhar na sociedade faroense. O governo decidiu iniciar uma avaliação dos regulamentos sobre a captura de golfinhos."

As autoridades ainda informaram que, nas últimas décadas, medidas específicas foram tomadas para melhorar os métodos de caça e o bem-estar dos animais, como inovações nos equipamentos utilizados pelos baleeiros que vistam matar um grupo de baleias em menos de quinze minutos, evitando potencial agonização.

Em comunicado, o governo ainda reiterou que "têm um forte compromisso com o Objetivo 14 de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas - conservar e usar de forma sustentável os oceanos, mares e recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável."