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Pena de morte: Os brasileiros executados por tráfico de drogas em 2015

O paranaense Rodrigo Gularte foi executado por pelotão de fuzilamento na Indonésia, em 2015 - Arquivo Pessoal via Agência Brasil
O paranaense Rodrigo Gularte foi executado por pelotão de fuzilamento na Indonésia, em 2015 Imagem: Arquivo Pessoal via Agência Brasil

Maurício Businari

Colaboração para o UOL, em Santos

24/02/2022 04h00Atualizada em 24/02/2022 13h40

A prisão da mineira Mary Hellen Coelho Silva, 22, por tráfico internacional de drogas na Tailândia reacendeu a discussão sobre a pena de morte aplicada a esse tipo de crime em alguns países asiáticos. Esse não é o primeiro caso envolvendo brasileiros. Em 2015, ficou famoso o caso de Rodrigo Muxfeldt Gularte, 42, executado em maio por um pelotão de fuzilamento após passar 11 anos em uma prisão na Indonésia.

Paranaense, Gularte foi preso em julho de 2004 após tentar entrar na Indonésia com 6 kg de cocaína escondidos em pranchas de surfe. Ele foi condenado à morte em 2005, mas sua execução só se consumou no dia 29 de maio de 2015.

Ele foi o segundo brasileiro executado no país naquele ano - em janeiro, Marco Archer Cardoso Moreira, 53, foi fuzilado. Ele também cumpria pena por tráfico de drogas.

Gularte era portador de esquizofrenia, segundo dois relatórios médicos anexados ao processo em 2014. Em março de 2015, dois meses antes da execução, uma equipe médica reavaliou o brasileiro a pedido da Procuradoria Geral indonésia, mas o resultado do laudo não foi divulgado.

Em entrevista à BBC em junho de 2015, a mãe dele, Clarisse Muxfeldt Gularte, afirmou que o filho sofria de problemas mentais desde a adolescência. Havia suspeita que ele tivesse transtorno bipolar. Ela disse também que laudos médicos comprovavam o quadro — piorado, segundo ela, quando ele começou a ter contato com as drogas. Ela acreditava que o filho foi aliciado por traficantes internacionais devido a seu estado mental.

Na prisão, Gularte dizia ouvir vozes de satélite e contava histórias surreais e desconexas. Ele se recusava a ser avaliado em um hospital temendo ser morto e afirmava que a pena de morte na Indonésia havia sido abolida. Além disso, nunca tirava da cabeça um boné virado para trás que, segundo ele, garantiria a sua segurança

"Nos últimos anos, ele já não estava bem. A gente notava que ele estava mudando... Ele estava com mania de perseguição, ele não comia... Sempre achava que a comida estava envenenada e que queriam matá-lo", afirmou Clarice à época, à BBC.

A prima do paranaense, Angelita Muxfeldt, chegou a viajar para a Indonésia para obter a transferência da guarda de Gularte para ela, com o objetivo de evitar a execução.

Gularte não acreditava que seria executado

O padre Charlie Burrows, que acompanhou Gularte em seus últimos momentos, chegou a afirmar que ele ouvia vozes e não entendia que seria levado para um pelotão de fuzilamento. Somente no último minuto, quando foi acorrentado, ele teria se desesperado.

"Ele começou a entender e, quando as correntes começaram a ser colocadas, ele me disse: 'Oh não, padre, eu estou sendo executado?'", afirmou o clérigo à ABC News Australia.

Gularte foi executado junto com outros sete homens acusados de tráfico. Dois australianos, quatro nigerianos e um indonésio.

"A execução é simplesmente ultrajante", disse um mês antes da execução à BBC Brasil Ricky Gunawan, advogado que assumiu o caso do brasileiro em março. "Podemos dizer que a Procuradoria fechou seus olhos e ouvidos e quis executá-lo independentemente de evidências plausíveis que tínhamos para evitar a execução".

A Indonésia reforçou as penalidades aplicadas a crimes de tráfico de drogas e voltou a realizar execuções em 2013, depois de uma pausa de cinco anos. O governo do país justificou a medida dizendo enfrentar uma situação de "emergência" devido às drogas, apesar da pressão internacional.

Para justificar sua decisão, o presidente indonésio, Joko Widodo, afirmou à época que entre 40 e 50 indonésios morrem todos os dias por causa do consumo excessivo de drogas. Mas o número chegou a ser contestado por especialistas.

Outro brasileiro executado no mesmo ano

Marco Archer Cardoso Moreira, 53, também foi executado na Indonésia em 2015, em janeiro, por fuzilamento. Archer trabalhava como instrutor de voo livre e foi preso em agosto de 2003 após tentar entrar na Indonésia pelo aeroporto de Jacarta com 13,4 kg de cocaína escondidos em uma asa delta desmontada.

Em 2005, os advogados de Archer fizeram um pedido de clemência ao governo indonésio, mas o pleito foi negado. Em 2012, a então presidente Dilma Rousseff entregou uma carta ao governo do país pedindo que Archer não fosse morto, o que foi ignorado.

Relatório da Anistia Internacional publicado no ano passado assinala descida global da aplicação da pena capital, em 2020, mas há quatro países que, sozinhos, são responsáveis por mais de 80% dessas condenações em todo o mundo.

As estatísticas da Anistia Internacional sobre todas as execuções registradas não incluem as execuções que tiveram lugar na China, mas o órgão estima que o país realiza vários milhares de execuções por ano, o que faz dele o líder mundial no maior número de casos, à frente do Irã (246), Egito (107), Iraque (45) e Arábia Saudita (27). Somente esses quatro países, juntos, foram responsáveis por 88% do total de 483 execuções contabilizadas nos 18 países do mundo que aplicaram a pena capital, durante 2020.