Chernobyl e Zaporizhzhya: O que a Rússia busca ao ocupar usinas nucleares?
Depois de tomar a histórica usina nuclear desativada de Chernobyl no início da guerra, o exército russo apropriou-se hoje (4) da maior usina nuclear da Europa (Zaporizhzhya) e se encaminha para outra, a South Ukraine, na província de Mykolaiv, no sul da Ucrânia. Além de aumentar a tensão do conflito, o objetivo da Rússia é controlar a produção energética ucraniana durante a guerra, segundo especialistas consultados pelo UOL.
Chernobyl foi invadida pelos russos já na quinta-feira, dia 24, no início dos ataques ao território ucraniano. O conselheiro do gabinete presidencial da Ucrânia, Mykhailo Podolyak, definiu a ação como "uma das ameaças mais sérias na Europa".
Até 1986, a usina era responsável por cerca de 10% da energia consumida pela Ucrânia. Mas um de seus reatores explodiu em abril daquele ano, espalhando radiação por Áustria, Polônia, Suécia e Belarus.
Somente no fim de 2000 o último reator foi desativado e a usina parou de produzir eletricidade. Desde 2015, apenas cientistas podem trabalhar em Chernobyl para observar seus níveis de radiação.
Por que Chernobyl interessa à Rússia?
A localização da usina é estratégica por ficar um pouco abaixo da fronteira com a Belarus —aliada da Rússia na guerra— e a apenas 120 km de Kiev, capital da Ucrânia.
"Chernobyl é uma instalação que fica no melhor caminho de deslocamento para as tropas russas entre Belarus e Kiev, um ponto estratégico para o domínio da capital", afirma Ronaldo Carmona, professor de geopolítica da Escola Superior de Guerra e membro do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais).
Especialista em Ucrânia e Rússia, Arthur Moura concorda. Além de ser caminho para Kiev, ocupar Chernobyl é simbólico e "também uma forma de causar tensão na Ucrânia e no Ocidente sobre o que é possível fazer com ela".
"Chernobyl é mais um monumento ao passado do que algo útil de fato para a Rússia, exceto pela pressão que provoca", diz ele, que é mestrando em Relações Internacionais pela Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro).
Por que ocupar Zaporizhzhya?
Hoje foi a vez de as forças russas assumirem o controle da usina de Zaporizhzhya, na cidade de Energodar.
Zaporizhzhya é a maior central nuclear da Europa, com capacidade para abastecer 4 milhões de casas. "Ela fornece um quinto de toda a energia do país e 47% da energia nuclear gerada pela Ucrânia", diz Carmona. "É um alvo estratégico militar legítimo, não para destruí-lo, mas controlá-lo."
Assim como ele, Moura não acredita no interesse russo de utilizar a central para fabricar armamento nuclear. "Me parece que a intenção é o controle energético da Ucrânia", diz.
Rússia vai destruir as usinas?
Carmona explica que os alvos principais de uma campanha militar são, primeiro, as instalações militares inimigas. "Segundo, as infraestruturas críticas: tudo o que está ligado a fornecimento de energia, água, estações de saneamento. Áreas ligadas a serviços públicos essenciais que determinam o funcionamento da economia do país adversário", enumera.
É natural que essas instalações se tornem alvos para utilização de acordo com o planejamento da campanha militar."
Ronaldo Carmona, professor da Escola Superior de Guerra
Os dois especialistas também descartam a intenção de a Rússia destruir Zaporizhzhya ou qualquer outra central nuclear.
"Não acredito que a Rússia esteja buscando explodir as usinas causando uma nova 'Chernobyl', até porque ela seria bastante afetada", avalia Moura. Carmona completa: "A destruição da usina nuclear é inconcebível, seja pela ética da guerra, seja pelas consequências que isso pode gerar".
"Isso seria um tiro no pé das tropas russas", diz Carmona. "Poderia causar um desastre nuclear equivalente a várias vezes o de Chernobyl, uma nuvem radioativa que contaminaria boa parte da Europa e também da Rússia."
Nós sabemos como uma guerra começa, mas não como termina. É possível que esse confronto resvale em erros de cálculos e acidentes ou até mesmo ação de sabotagem por grupos a serviço de qualquer dos lados da contenda, inclusive ucraniano."
Ronaldo Carmona, professor da Escola Superior de Guerra
Depois de tomar Chernobyl e Zaporizhzhya, as tropas russas podem assumir o controle de outra usina, a de South Ukraine, a segunda maior do país.
Ela está localizada na província de Mykolaiv, também no sul ucraniano, cuja capital de mesmo nome foi tomada nesta sexta-feira. O cerco se deu a partir da cidade de Kherson, ocupada ontem (3) pelo exército do presidente russo Vladimir Putin.
A Ucrânia ainda conta com outras duas usinas nucleares em atividade, a de Rivne e a de Khmelnitskiy, ambas no noroeste do país.
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