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Guerra da Rússia-Ucrânia

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'Reconstruir nosso país': Ucraniano que morou no RJ não voltará ao Brasil

O ucraniano Oskar Slushchenko, 32, que deu aulas de russo no Rio - Arquivo Pessoal
O ucraniano Oskar Slushchenko, 32, que deu aulas de russo no Rio Imagem: Arquivo Pessoal

Igor Mello

Do UOL, no Rio

23/03/2022 04h00

Em 24 de fevereiro —data que marcou o início da ofensiva russa na Ucrânia—, Oskar Slushchenko, 32, abandonou sua casa em Kiev carregando o que conseguiu levar em uma mochila e sua gata de estimação.

Mesmo com a vida desestruturada pela guerra, o especialista em Relações Internacionais —que deu aulas de russo no Rio de Janeiro até 2020 e chegou a trabalhar no Bar Bukowski— diz que não pretende deixar a Ucrânia, apesar de apelos de amigos brasileiros. Em conversa com o UOL por WhatsApp, Oskar relatou a fuga da capital da Ucrânia até a fronteira com a Romênia e justificou por que continuará no país.

Não pretendo atravessar a fronteira com a Romênia. O plano é continuar e trabalhar, fazer nossa parte para manter a Ucrânia e depois reconstruir o nosso país. E, se precisar, nos defender."
Oskar Slushchenko, especialista em Relações Internacionais

Apesar de homens jovens estarem proibidos de deixar o país por conta da possibilidade de serem convocados para lutar pelo exército ucraniano, Oskar diz que, neste momento, não teme ser chamado. Isso porque o governo de Volodymyr Zelensky definiu regras de convocação considerando a experiência militar dos reservistas.

"Estão mobilizados principalmente os homens que têm experiência militar, participaram da guerra no leste da Ucrânia em 2014. A segunda onda são as pessoas que pelo menos passaram por serviço militar e só depois chegam, se for preciso, nas pessoas sem experiência militar, como eu", diz.

Slushchenko, sua namorada, os pais e a avó dela deixaram a capital ucraniana às 15h do primeiro dia da invasão, fazendo parte da primeira leva de migrantes.

A viagem de cerca de 600 km rumo ao oeste do país —distância semelhante a uma viagem entre São Paulo e Belo Horizonte— levou 32 horas.

Depois de passarem uma semana na casa de parentes da namorada em uma cidade do interior, decidiram seguir em deslocamento até uma área próxima à fronteira com a Romênia.

Crises de ansiedade antes da invasão

Ele conta que os dias anteriores à invasão foram de tensão para os moradores da cidade.

"Sinceramente, eu tinha várias crises de ansiedade antes de a guerra começar. Eu ficava mal por dois ou três dias, depois passava e a vida voltava ao normal. Não só eu me senti assim, mas todo mundo. Porque havia essa tensão. Os Estados Unidos diziam que ia começar a guerra a qualquer momento", relata.

No primeiro dia de guerra, ele e a namorada foram acordados por explosões. Em poucas horas, se abrigaram três vezes no metrô de Kiev —projetado pelos soviéticos para servir como abrigo antibombas. No mesmo dia, pegaram suas mochilas, a gata de estimação e deixaram Kiev de carro.

No caminho, enfrentaram engarrafamentos enormes —cujas imagens, com a fila de carros até o horizonte, correram o mundo nos primeiros dias de guerra. Ele conta que o percurso escolhido teve uma precaução adicional.

Nosso problema não era tanto ficar em meio ao fogo cruzado, porque os russos avançaram pouco nos primeiros dias de invasão. O perigo dos primeiros dias veio do céu, com os mísseis balísticos disparados por aviões russos. Fizemos a viagem procurando evitar passar por objetos estratégicos de infraestrutura, que poderiam ser atacados."

Abrigo em casa abandonada

Atualmente, Slushchenko e a família da namorada estão abrigados em uma casa que pertence à sua família na região próxima à fronteira romena.

O imóvel é de seu tio-avô, mas estava vazio desde que parte da família se mudou para a Hungria há duas décadas. "Estava abandonado, mas ele disse que poderíamos usar para nos abrigar", conta o professor.

Apoio do Brasil

Slushchenko morou no Rio de Janeiro por dois anos e meio. Nesse período, além de ensinar o idioma russo, trabalhou em outras funções, como na equipe do Bar Bukowski —famoso ponto de encontro de jovens que curtem rock em Botafogo, na zona sul carioca.

Ele retornou para Kiev —onde estudou e iniciou sua vida profissional— em janeiro de 2020.

Ele conta que tem recebido a todo momento mensagens de amigos e colegas que fez em sua estadia no Rio, inclusive oferecendo ajuda para que ele volte à cidade.

"Eu acredito que seria mais útil aqui na Ucrânia para minha família e para a sociedade. Eu não tenho planos de sair. Agradeço porque chegaram muitas mensagens cheias de empatia e preocupação do Brasil", completa.