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Onde fica o 'lugar mais perigoso do mundo', capaz de gerar guerra nuclear

Soldados armados da Polônia no vilarejo de Szypliszki, localizado no chamado "Suwalki Gap" - Wojtek Radwanski/AFP
Soldados armados da Polônia no vilarejo de Szypliszki, localizado no chamado "Suwalki Gap" Imagem: Wojtek Radwanski/AFP

Alexandre Santos

Colaboração para o UOL

24/08/2022 04h00

Um território considerado "o lugar mais perigoso do mundo" desencadeou um novo ponto de tensão entre a Rússia e a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte). Situado entre a Lituânia e a Polônia, o chamado "Suwalki Gap" é apontado como um dos primeiros alvos de Vladimir Putin em um eventual confronto direto com a aliança militar ocidental.

Há o temor de que, caso a Ucrânia caia, os russos avancem sobre essa área.

O "Suwalki Gap" é descrito como um corredor estratégico com 100 quilômetros de extensão entre a fronteira lituano-polonesa, a Belarus, a leste, e o exclave russo de Kaliningrado, a oeste e às margens do mar Báltico.

Lugar mais perigoso do mundo - Arte/UOL - Arte/UOL
Imagem: Arte/UOL

O local voltou aos holofotes nos últimos dias, após a Lituânia bloquear a circulação de comboios transportando ferro e outros metais entre o exclave e a Rússia.

Diante da restrição, o governo de Putin já ameaçou punir o país báltico, que afirmou cumprir apenas as sanções europeias impostas pela UE (União Europeia) por causa da ofensiva militar em solo ucraniano.

Tanto a Lituânia quanto a Polônia são membros da UE e da Otan.

Reportagens publicadas pela imprensa internacional afirmam que, se a Rússia decidir tomar o controle do corredor "Suwalki" para assegurar a movimentação de pessoas e bens entre o seu enxlave e a Belarus (aliado de Putin), os países bálticos seriam rapidamente isolados de seus parceiros dos dois blocos.

Guerra nuclear: o pior dos cenários

Sob o título "O lugar mais perigoso da terra", o site "Político" — um dos mais respeitados veículos de notícias dos Estados Unidos — veiculou recentemente um artigo assinalando que, em um conflito com o Ocidente, a Rússia poderá varrer o corredor "Suwalki", separando os países bálticos da UE e de seus aliados ao sul.

Tal movimento também resultaria em um confronto imediato entre Moscou e os membros da Otan munidos de arsenal atômico, elevando as tensões para uma iminente guerra mundial.

No pior dos cenários, uma resposta da organização a um ataque russo provocaria um conflito nuclear.

À mesma publicação norte-americana, o ex-presidente estoniano Toomas Hendrik Ilves disse ter evocado o termo "Suwalki Gap" em 2015, minutos antes de uma reunião com a então ministra da Defesa da Alemanha, Ursula von der Leyen, em um esforço para alertar sobre o buraco nas defesas ocidentais.

"É uma vulnerabilidade enorme, porque uma invasão cortaria a Lituânia, a Letônia e a Estônia do resto da Otan", afirmou Ilves.

"Suwalki", em bielorrusso, é o nome de uma cidade polonesa. "Gap "significa "vão", em tradução para o inglês — daí a alcunha "corredor Suwalki".

De acordo com o texto do "Público", o aviso de Ilves a von der Leyen, agora presidente da Comissão Europeia, foi uma reação à anexação da Crimeia pela Rússia no ano anterior. Mas o cenário apocalíptico ganhou nova atenção após a última invasão da Ucrânia por Putin.

Ponto fraco da Otan

Fincado numa das mais problemáticas fronteiras do mundo, o corredor "Suwalki" está espremido entre Kaliningrado — um posto militar de vanguarda russo na Europa altamente fortificado, com armas nucleares — e o seu aliado, a Belarus.

A região, contudo, é vista por muitos analistas como um ponto fraco dentro da Otan, ressaltou a CNN em uma reportagem recente. Além disso, a localização geográfica de Kaliningrado é considerada vantajosa para Moscou, do ponto de vista estratégico e militar.

É ali que ficam o único porto báltico do país livre de gelo durante todo o ano e a frota russa do mar Báltico. Cerca de 4.000 soldados estão a postos naquele local.

Embora a Otan tenha cerca de 1.000 homens estacionados em toda a região, líderes políticos e planejadores militares do Báltico dizem que seria necessário muito mais para deter a agressão russa.

A Belarus, sobre a qual Putin afirmou gozar de mais influência, tem servido de base para seu Exército durante a investida contra a Ucrânia.

Ramunas Serpetauskas, que comanda uma companhia local da União dos Fuzileiros da Lituânia — uma milícia voluntária com raízes que remontam a mais de um século —, disse ao site "Político" que o corredor "Suwalki" tornou-se um "calcanhar de Aquiles" devido à possibilidade de ser atacado pelos russos.

"Alguns pensam que não há sentido em nos atacar, mas deve-se notar que esta é uma rota terrestre direta para Kaliningrado", disse ele, que, junto com companheiros, estava monitorando a situação na área de fronteira. "Se eles conseguirem superar a Ucrânia, é possível que o próximo golpe caia aqui", acrescentou.

Em um comunicado por escrito divulgado dias atrás, a administração da Lituânia tentou tranquilizar a população.

"A comunidade confia nos militares lituanos e na Otan e em sua capacidade de garantir a segurança", diz.

Resposta imediata da Otan

Um eventual avanço armado da Rússia na Polônia ou na Lituânia resultaria numa defesa mútua encampada por todos os membros da Otan por meio do artigo 5º do tratado — que estipula que um ataque contra um país integrante da aliança é um ataque contra todos.

No mesmo texto, Ben Hodges, um tenente-general americano aposentado que comandou o Exército dos EUA na Europa de 2014 a 2017, diz que os "esforços de boa fé para se envolver com a Rússia falharam" e é essencial que a Otan use essa oportunidade para se preparar para o pior.

Por outro lado, afirmou duvidar que Putin tenha capacidade necessária para atacar o Báltico neste momento.

Para o general Rajmund Andrzejczak, principal comandante militar da Polônia, a cooperação transfronteiriça entre os militares poloneses e lituanos nunca foi tão próxima.

"Vemos o que os russos estão fazendo na Ucrânia. Então não confiamos neles", disse ele, que já serviu na região de Suwalki. "Temos que estar muito, muito prontos."

Território de águas termais e agrícola já abrigou spa de czar

O território estratégico de "Suwalki Gap" localiza-se nos limites de Druskininkai, uma pacata cidade termal com cerca de 12.000 habitantes.

Aninhado na fronteira sudeste da Lituânia, as terras agrícolas despovoada já abrigaram um spa oficial para funcionários públicos russos do czar Nicolau 1º, em 1837.

Ladeada por vilas ornamentadas do século 19, fontes e lagos pontilham desde então suas águas ricas em minerais, que atraem visitantes de toda a Europa Central e Oriental.

Na Guerra Fria, foi resort e destino de férias soviético favorito. Hoje, abriga uma das maiores arenas de neve cobertas do mundo e um elaborado parque aquático.

Até que a guerra na Ucrânia o colocasse fora de alcance, o lugar havia perdido pouco de seu fascínio para os russos, que, junto com os bielorrussos, representavam a maior porção de visitantes.