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Ucrânia também é culpada pela guerra, como diz Lula?

Do UOL, em São Paulo

18/04/2023 10h32

A frase do presidente Lula também responsabilizando ucranianos pela invasão russa provocou o repúdio dos Estados Unidos e Europa. Três especialistas ouvidos pelo UOL divergiram sobre o tema: um deles considera a postura como de independência, outro fala em "gafe" e uma professora diz que Lula frustrou o desejo de o Brasil mediar o acordo de paz.

O que aconteceu?

Lula equiparou a responsabilidade de russos e ucranianos pela guerra. A fala foi dita um dia antes do ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguei Lavrov, visitar o Brasil.

Lula também afirmou que Estados Unidos e Europa "contribuem" para que o conflito não acabe.

Os Estados Unidos responderam que o Brasil "papagueia propaganda russa e chinesa".

A União Europeia disse que está apenas "ajudando a Ucrânia em exercícios para legítima defesa".

Já a Ucrânia convidou Lula a visitar Kiev para "compreender" a guerra.

O que disse Lula?

O presidente [russo, Vladimir] Putin não toma a iniciativa de parar. [O presidente ucraniano, Volodimir] Zelenski não toma a iniciativa de parar. A Europa e os Estados Unidos continuam contribuindo para a continuação desta guerra. Temos que sentar à mesa e dizer para eles: 'basta'.

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O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov (à esquerda), após reunião com o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira
Imagem: 17.abr.2023 - Ueslei Marcelino/Reuters

Lula está certo em também culpar a Ucrânia pela guerra?

A declaração foi equivocada, desnecessária e fora do contexto. A guerra não foi iniciada por dois países; foi uma invasão da Rússia. Europa e EUA não patrocinam a guerra. Eles reagem, mandam armamento na tentativa de fazer sobreviver um povo submetido
Maristela Basso, professora de Direito Internacional da Faculdade de Direito da USP

Europeus e americanos querem que o Brasil se renda à narrativa da Otan, mas o Brasil não deve fazer isso e nem endossar a narrativa russa. A posição brasileira busca equidistância para ter autoridade. Se endossar qualquer narrativa, estaremos desqualificados para mediar a paz
Ronaldo Carmona, professor de geopolítica da Escola Superior De Guerra

O que causa espanto na declaração é o teor. Espera-se ponderação de um presidente da República sobre um conflito desses. Foi, no mínimo, uma gafe. Não é o tom que se espera nessas questões. É consensual que há um agressor bastante claro, que é a Rússia.
Fabricio Pontin, professor de relações internacionais da Universidade LaSalle

Lula e o o presidente dos EUA, Joe Biden, durante encontro na Casa Branca - 10.fev.2023 - Jonathan Ernst/Reuters - 10.fev.2023 - Jonathan Ernst/Reuters
Lula e o o presidente dos EUA, Joe Biden, durante encontro na Casa Branca
Imagem: 10.fev.2023 - Jonathan Ernst/Reuters

Declaração impacta a imagem do Brasil no exterior?

O discurso é incompatível com as manifestações do Ministério das Relações Exteriores. Os brasileiros podem se perguntar se a política externa na guerra é a do ministério [alinhada à Otan] ou aquela expressa pelo presidente em discursos esporádicos. Hoje há um conflito entre o Itamaraty e o presidente
Professora Maristela Basso, professora de Direito Internacional

Ao Brasil interessa ter boa relação com todos os polos, mas compreendendo que essas potências têm seus interesses. Em alguns momentos, nossos interesses não vão combinar. É preciso ser equilibrado para não ter uma visão impactada com o que se viu ontem [16, dia da declaração de Lula]
Professor Ronaldo Carmona, professor de geopolítica

Lula causa esse tipo de celeuma por gostar de falar de improviso, ser irreverente. É preciso distinguir os atos do Lula na imprensa e os atos oficiais da diplomacia. Em março, o Brasil agiu com as potências europeias ao condenar posturas da Rússia e não contestar a condenação de Putin no Tribunal Internacional
Professor Fabricio Pontin, professor de relações internacionais

E o "clube da paz", sugestão de Lula?

Lula sugere reunir um grupo de países sem envolvimento na guerra para discutir o fim do conflito. Além do Brasil, participariam do clube China, Índia e Turquia.

Lula já está impedido. Um mediador não dá opinião sobre o que está acontecendo. Ele tem de entrar de forma neutra. Se emite um juízo de valor, ele fica impedido de mediar. É uma proposta natimorta, ele não é mais neutro. Se ele tiver de fazer esse discurso, ele não é mediador, é juiz
Professora Maristela Basso, professora de Direito Internacional

A ideia é correta: reunir países sem envolvimento para dizer aos que estão na guerra que é hora de acabar com ela. Mas acredito que as condições para a paz ainda não foram dadas. Talvez precise de um impasse militar para que essas condições apareçam
Professor Ronaldo Carmona, professor de geopolítica

O clube parece uma ideia ligada à revisão do Conselho de Segurança da ONU, posição antiga defendida por Lula. A proposta é consistente, mas o Ministério de Relações Exteriores tem de agir como apagador de incêndio sobre as declarações de Lula
Professor Fabricio Pontin, professor de relações internacionais