'Amore': disco japonês raro de neta de Mussolini foi vendido por R$ 30 mil
Hoje, Alessandra Mussolini, neta do ditador fascista italiano e sobrinha da atriz Sophia Loren, anda pelos corredores do Parlamento Europeu e frequenta reuniões do Forza Italia, partido de centro-direita do qual faz parte. Nos anos 1980, no entanto, a carreira dela tomava outro rumo: como cantora de city pop no Japão.
Alessandra Mussolini e o álbum "Amore"
Carreira musical de Alessandra começou ao acaso. A deputada contou à revista feminina italiana SoloDonna em 2020 que, em 1982, ela e a mãe visitaram o Japão. Quando questionada se a filha poderia cantar para um anúncio, a mãe de Alessandra disse que sim, embora a jovem de 20 anos nunca tivesse cantado antes.
Dessa interação, nasceu o álbum "Amore", lançado no mesmo ano. O disco foi distribuído pela gravadora Alfa Records apenas no Japão, e produzido por Miki Curtis, considerado um dos grandes nomes japoneses do rock. No álbum, Alessandra canta músicas em italiano, inglês e até mesmo em japonês.
Álbum tem forte influência do city pop. O gênero surgiu na década de 1970, mas se popularizou nos anos 1980. Tido como um exemplo da influência ocidental na cultura japonesa, o estilo incluía influências de funk, disco, R&B, AOR, soft rock e boogie, sendo associado ao boom econômico do país.
"Amore" teve dois singles. O primeiro, "Love is Love" é cantado completamente em inglês. Já o segundo, "Tokyo Fantasy", conta com vocais em japonês de Alessandra. Ouça:
Agradeço a Deus por ter começado a trabalhar, porque assim tínhamos dinheiro para comprar uma casa para a minha família. Meu pai Romano era jazzista, pianista, uma borboleta como todos os homens. Ele não era um homem de grande responsabilidade. Alessandra Mussolini
Segundo ela, família viveu dificuldades financeiras durante sua infância e adolescência. Em entrevista ao jornal Corriere della Serra neste ano, ela afirma que o pai tinha "pouco dinheiro".
Para ele, a música existia, ele era um artista, vivia como artista. Um cara, muitas viagens, muitas mulheres, pouco dinheiro. Mamãe recebia crédito dos lojistas da Piazza Monte Gennaro, bairro de Montesacro, onde morávamos em Roma; papai ganhava com shows, fazia o que podia, talvez emprestasse dinheiro para amigos, mas nunca tinha nada no bolso. Minha irmã e eu trocávamos roupas.
Romano Mussolini teve uma longa carreira musical. O filho do "Il Duce" ("O Líder", em português), como era chamado o ditador fascista, começou a tocar jazz ainda nos anos 1940, mesmo com o regime do pai censurando sua música, por ser considerada uma expressão cultural estrangeira. Romano continuou na carreira de musicista até pouco antes de sua morte, em 2006.
Relação de Alessandra com a música do pai se estendeu até os anos 2000. Em 2004, a neta de Mussolini fundou o Alternativa Sociale, um partido de extrema-direita e neofascista. Romano Mussolini compôs o hino oficial do partido, "L'orgoglio di essere italiani" ("O orgulho de ser italiano", em português), com temas ultranacionalistas.
Alessandra conta que largou a carreira artística por conta do sobrenome. Na mesma entrevista ao Corriere, a atual deputada, que também trabalhou como atriz, disse que nunca lhe deram oportunidades. "Após cada audição, as respostas eram: linda demais, feia demais, alta demais, magra demais, olhos claros demais. Talvez o verdadeiro 'demais' fosse o sobrenome. Dino Risi [cineasta italiano] disse na minha cara: 'Quer fazer cinema com esses olhos que lembram os do seu avô? Pelo menos mude seu sobrenome!'", relembra.
Mesmo que eu tivesse mudado meu sobrenome, nada teria mudado. Teriam dito 'olha essa covarde, até o nome vai mudar'. Então, quando as coisas não dão certo, você não pode ser teimoso.
Álbum é considerado raro
Disco foi tocado pela primeira vez na Itália em 1996. A transmissão, feita em um programa de TV do Canale 5, ocorreu 14 anos após o lançamento oficial do álbum no Japão. Uma reportagem da agência italiana de notícias Adnkronos disse, à época, que a equipe do programa conseguiu encontrar uma gravação para tocar.
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Quero receberPor anos, disco caiu no esquecimento — o que mudou em 2000. Nesse ano, um colecionador arrematou uma cópia do álbum por 10 milhões de liras (cerca de R$ 30 mil em valores atuais), em Londres. À época, o jornal Corriere della Serra reportou que o disco foi vendido por um estudante italiano, Marcello Mangano, num mercado de colecionadores, a Michael Redgrave, um fã inglês de música italiana.
Em 2021, Alessandra fez primeira apresentação ao vivo do álbum. Em uma entrevista ao Canale 5, a neta do Il Duce cantou "Amai Kiouku", uma das canções presentes no disco. Na ocasião, a apresentadora do programa, Barbara D'Urso, questionou qual idioma era aquele e Alessandra respondeu que era "japonês napolitano".
Álbum pode ser encontrado com facilidade na internet. No vídeo com o áudio de "Tokyo Fantasy" no YouTube, um comentarista brinca: "Se a Segunda Guerra Mundial fosse uma sitcom [série de comédia], essa música apareceria nos créditos do último episódio".
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