Preso que enfrentou tortura em Guantánamo tenta convencer os EUA que pode ser solto
Há 14 anos sob custódia dos EUA, Abu Zubaydah passou a simbolizar, talvez mais que qualquer outro prisioneiro, como o medo dos ataques terroristas depois de 11 de setembro de 2001 modificou o país. Ele foi o primeiro detido a sofrer "waterboarding", o quase afogamento, e sua tortura brutal foi documentada em um relatório do Senado.
Ele é um dos que foram detidos sem acusação e sem probabilidade de julgamento. Há muito tempo o governo admitiu que ele nunca foi o principal líder da Al Qaeda como foi declarado na época de sua captura, em 2002, mas insiste que ele ainda pode ser perigoso.
Em todo esse tempo, Zubaydah, hoje com 45 anos, nunca foi visto pelo mundo exterior. Isso mudou na última terça-feira (23), quando seu rosto tranquilo foi transmitido por vídeo da prisão militar da baía de Guantánamo para uma sala de reuniõesno Pentágono.
Em uma audiência muitas vezes adiada, ele afirmou, por meio de uma declaração lida por um soldado uniformizado, que não representava ameaça e deveria ser libertado. Um perfil preparado pelo Departamento da Defesa, também lido em voz alta, concluiu com perturbadora ambiguidade que ele "provavelmente mantém uma mentalidade extremista".
A ocasião foi a primeira aparição de Zubaydah diante de um Conselho de Revisão Periódica, reunido sob o sistema de detenção militar para determinar se um prisioneiro representaria perigo caso fosse libertado.
Sob as regras complexas que governam os detentos na prisão de Guantánamo, Zubaydah não falou durante a parte aberta da audiência. Mas na declaração que resume suas opiniões ele declarou que "não tem desejo ou intenção de prejudicar os EUA ou qualquer outro país".
Ponderando sobre o que parecia uma perspectiva ainda distante, ele disse que queria se reunir a sua família e "tem algum dinheiro que poderá ser usado para começar um negócio".
Uma dúzia de repórteres e defensores de direitos humanos assistiram ao vídeo ao vivo de 17 minutos, a parte não secreta do processo. Nenhum membro do público além de seus advogados viu Zubaydah desde sua captura em março de 2002 no Paquistão, depois de um tiroteio em que ele foi gravemente ferido.
Zubaydah pode ter falado durante a parte sigilosa da audiência que se seguiu à sessão aberta e deveria durar várias horas. Uma nota publicada mais tarde disse que ele decidiu que não queria que a transcrição fosse divulgada.
O painel de revisão, comparável a um conselho civil de liberdade condicional, é composto de representantes de seis órgãos de segurança, que participaram da audiência em um local não revelado na região de Washington. Ele anunciará, daqui a um mês ou mais, se recomenda que a detenção de Zubaydah continue ou ele seja transferido para outro país.
Das 779 pessoas detidas em Guantánamo desde 2001, restam 61. O governo americano diz que aproximadamentea metade é, como Zubaydah até agora, impossível de ser julgada, mas perigosa demais para ser libertada.
Vestindo uma túnica branca e com a barba bem aparada, Zubaydah, cuja estabilidade mental foi questionada por algumas autoridades americanas, escutou atentamente, apoiando o queixo na mão direita. Ele não reagiu visivelmente quando autoridades leram diversas declaraçõessobre ele. O tapa-olho que em fotos anteriores cobria seu olho esquerdo, que foi ferido em algum momento após sua captura, estava pendurado por um cordão de seu pescoço. Ele usava óculos e os trocou para ler um documento.
Nascido na Arábia Saudita em uma família de origem palestina, Zubaydah se tornou uma espécie de agente de viagens, administrador de acampamento e facilitador para os combatentes militantes no Afeganistão no início dos anos 1990, depois que a força incoesa de soldados islâmicos conhecida como mujahidin obrigou o Exército soviético a sair do país.
Mas quando ele foi ferido a tiros e levado sob custódia dos EUA, seis meses depois dos atentados de 11 de Setembro, foi o primeiro suspeito significativo capturado na caçada humana global desesperada praticada pela CIA. Na época, autoridades de inteligência americanas concluíram erroneamente que ele fosse um dos altos líderes da Al Qaeda e que poderia conhecer futuros complôs.
Em seu perfil, publicado na web esta semana, autoridades militares deram uma descrição muito modificada, mas ainda vaga, de sua história. Dizia que ele dirigiu uma "rede de facilitação mujahidin" nos anos 1990, "teve um papel chave nas comunicações da Al Qaeda" e tinha contato estreito com o nº 2 da Al Qaeda na época.
Ele "possivelmente" tinha conhecimento antecipado dos ataques às embaixadas dos EUA no leste da África em 1998 e do bombardeio ao destróier americano USS Cole no Iêmen em 2000, dizia o perfil. Ele tinha "consciência geral" do planejamento dos ataques de 11 de Setembro, dizia o documento, e "possivelmente" coordenou um campo de treinamento chamado Khalden quando dois dos futuros sequestradores estiveram lá.
Zubaydah "planejou ativamente ataques contra Israel", dizia também o perfil, foi condenado "in absentia" por acusações relacionadas a terrorismo na Jordânia e teve um papel ativo na discussão de possíveis novos ataques contra os EUA depois do 11 de Setembro. Embora ele tenha sido cooperativo na prisão, se for libertado poderá unir-se a ex-colegas para planejar ataques, dizia o perfil.
Mas Zubaydah afirmou a seus "representantes pessoais" --os dois militares designados para falar com ele-- que não tinha intenção de cometer atos terroristas. Ele "disse repetidamente que o Estado Islâmico está fora de controle e foi longe demais", afirmaramos representantes pessoais em sua declaração. (Autoridades disseramque os detidos tiveram acesso à televisão e ao rádio em diversas línguas, além de dois jornais em árabe, permitindo que se mantivessem atualizados sobre os fatos mundiais.)
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