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Por que economia em marcha lenta não freou mudança climática na pandemia

O planeta já havia aquecido cerca de 1,2 °C desde a era pré-industrial, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou oficialmente uma pandemia em 11 de março de 2020. - Getty Image
O planeta já havia aquecido cerca de 1,2 °C desde a era pré-industrial, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou oficialmente uma pandemia em 11 de março de 2020. Imagem: Getty Image

Piers Forster* - Especial para a BBC Future

11/04/2021 08h21

O planeta já havia aquecido cerca de 1,2 °C desde a era pré-industrial, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou oficialmente uma pandemia em 11 de março de 2020.

Isso deu início a uma queda repentina e sem precedentes na atividade humana. À medida que grande parte do mundo entrou em lockdown, fábricas pararam de operar, carros estacionaram por longos períodos e aviões deixaram de voar.

Várias mudanças monumentais aconteceram desde então, mas para nós, que trabalhamos como cientistas do clima, este período também trouxe algumas percepções inteiramente novas.

E muitas vezes, inesperadas.

A seguir, três coisas que aprendemos:

1. A ciência do clima pode operar em tempo real

A pandemia nos fez pensar em como contornar algumas das dificuldades de monitorar as emissões de gases do efeito estufa, e dióxido de carbono em particular, em tempo real.

Quando muitos lockdowns começaram, em março de 2020, o Orçamento Global de Carbono, estabelecendo as tendências de emissões do ano, só seria divulgado no fim do ano.

Portanto, os cientistas do clima começaram a procurar outros dados que pudessem indicar mudanças nas emissões de CO2.

Usamos informações sobre lockdown como espelho das emissões globais. Em outras palavras, se soubéssemos quais eram as emissões de vários setores econômicos ou países antes da pandemia, e soubéssemos por quanto essa atividade havia sido reduzida, poderíamos supor que suas emissões haviam caído na mesma quantidade.

Em maio de 2020, um estudo de referência combinou políticas de lockdown de governos e dados de atividades de todo o mundo, prevendo uma queda de até 7% nas emissões de CO2 até o fim do ano, um percentual confirmado posteriormente pelo Global Carbon Project.

Isso foi logo seguido por uma pesquisa da minha própria equipe, que usou dados de mobilidade do Google e da Apple para analisar alterações em 10 poluentes diferentes, enquanto um terceiro estudo monitorou novamente as emissões de CO2 usando dados de combustão de combustível fóssil e produção de cimento.

Os dados de mobilidade mais recentes do Google mostram que, embora a atividade diária ainda não tenha retornado aos níveis pré-pandemia, ela se recuperou até certo ponto.

Isso se reflete em nossa estimativa de emissões mais recente, que mostra, após uma recuperação limitada depois do primeiro lockdown, um crescimento bastante estável nas emissões globais durante o segundo semestre de 2020.

Isso foi seguido por uma segunda queda menor, representada pela segunda onda no fim de 2020 e início de 2021.

Enquanto isso, conforme a pandemia avançava, o projeto Carbon Monitor estabeleceu métodos para monitorar as emissões de CO2 quase em tempo real, nos oferecendo uma nova maneira valiosa de fazer esse tipo de ciência.

2. Nenhum efeito dramático nas mudanças climáticas

Tanto no curto quanto no longo prazo, a pandemia terá menos efeito sobre os esforços para combater as mudanças climáticas do que muitas pessoas esperavam.

Apesar do céu claro e tranquilo, a pesquisa de que participei mostrou que o lockdown teve, na verdade, um leve efeito de aquecimento na primavera de 2020: conforme a indústria estagnava, a poluição do ar diminuiu e o mesmo aconteceu com a capacidade dos aerossóis, micropartículas produzidas pela queima de combustíveis fósseis, de resfriar o planeta refletindo a luz do Sol para longe da Terra.

O impacto nas temperaturas globais foi de curta duração e muito pequeno (um aumento de apenas 0,03 °C), mas foi maior do que qualquer outro causado por alterações no ozônio, no CO2 ou na aviação relacionados ao lockdown.

Olhando mais adiante, para 2030, modelos climáticos simples estimam que as temperaturas globais serão apenas cerca de 0,01°C mais baixas como resultado da covid-19 do que se os países cumprissem as promessas de emissões que já estavam em vigor no auge da pandemia.

Essas descobertas foram posteriormente respaldadas por simulações de modelos mais complexos.

Muitas dessas promessas nacionais foram atualizadas e reforçadas no ano passado, mas ainda não são suficientes para evitar mudanças climáticas perigosas e, enquanto as emissões continuarem, estaremos consumindo o restante do orçamento de carbono.

Quanto mais demorarmos para tomar uma atitude, mais acentuados precisarão ser os cortes de emissões.

3. Este não é um plano de ação climática

A interrupção temporária da vida normal que vimos agora com lockdowns sucessivos não é apenas insuficiente para impedir as mudanças climáticas, também não é sustentável: assim como as mudanças climáticas, a covid-19 atingiu os mais vulneráveis com mais força.

Precisamos encontrar maneiras de reduzir as emissões sem os impactos econômicos e sociais do lockdown e encontrar soluções que também promovam a saúde, o bem-estar e a igualdade.

A disseminação da ambição climática e a intervenção por parte de indivíduos, instituições e empresas ainda são vitais, mas devem ser sustentadas e apoiadas por mudanças econômicas estruturais.

Eu e meus colegas estimamos que investir apenas 1,2% do PIB global em pacotes de recuperação econômica pode significar a diferença entre manter o aumento da temperatura global abaixo de 1,5 °C e um futuro em que enfrentaremos impactos muito mais graves ? e custos mais altos.

Infelizmente, o investimento verde não está sendo feito no nível necessário. No entanto, muitos outros investimentos serão feitos nos próximos meses.

É essencial que uma ação climática forte seja integrada aos investimentos futuros. Os riscos podem parecer altos, mas as recompensas potenciais são muito maiores.

*Piers Forster é professor de física das mudanças climáticas e diretor do Centro Internacional Priestley para o Clima da Universidade de Leeds, no Reino Unido.