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Pecuária eficiente pode produzir carne sem desmatar Amazônia, afirma especialista

No Rio de Janeiro

27/02/2013 12h21

Proteger a Amazônia ou produzir carne para um mundo cada vez mais carnívoro? Este é um dos grandes dilemas do Brasil que, para o engenheiro Carlos Nobre, doutor em Meteorologia e secretário para políticas e programas de pesquisa e desenvolvimento do MCTI (Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação), tem solução: uma pecuária mais eficiente.

Nobre concedeu uma entrevista à AFP à margem da conferência internacional de Academias de Ciências, realizada esta semana no Rio de Janeiro. Segue resumo abaixo:

AFP - O Brasil é um dos principais emissores de gases-estufa, devido ao desmatamento. Nos últimos anos, o governo tem anunciado reduções recorde no corte ilegal. Em sua opinião, as autoridades brasileiras têm sido eficientes no combate ao desmatamento?

Nobre - Nos últimos 3 a 4 anos, a Amazônia reduziu o desmatamento em cerca de 75% e o cerrado, em cerca de 50%. Manter essas baixas taxas é um esforço permanente. Tem muito a ver com políticas públicas, de fiscalização e controle, mas também com o fato de que a agricultura brasileira começou a se convencer de que o caminho de qualquer agricultura no mundo -€“ e o Brasil é uma potência agrícola - é a eficiência. O desmatamento não tinha nada a ver com eficiência.

No Brasil, a média de ocupação de cabeças de gado ainda é muito baixa. São 200 milhões de hectares com 200 milhões de cabeças de gado. Uma cabeça de gado por hectare, quando o potencial econômico de ocupação é de 3 ou 4 por hectare numa pecuária moderna. A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias) tem feito estudos mostrando que o Brasil poderia produzir 20% mais com 35% menos área até 2022. A palavra-chave é eficiência: a pecuária brasileira é muito pouco eficiente.

AFP - O Brasil assumiu recentemente metas ambiciosas de redução de emissões, de até 39% até 2020. Isso é factível?

Nobre - As metas são factíveis, em grande parte pela redução do desmatamento ilegal nos grandes biomas, Amazônia e Cerrado (...). Como os desmatamentos diminuíram rapidamente, as estimativas de emissões em 2010 indicam uma redução de 40% com relação em 2005. O Brasil está fazendo o seu papel, mas o esforço é permanente.

Após 2020, quando teremos uma matriz de emissões muito parecida com a de países industrializados, com a maior parte das emissões de energia e agricultura e não de desmatamento, o desafio ainda é maior porque o caminho é o das energias renováveis, onde o Brasil tem enorme potencial.

A agricultura brasileira também tem enorme potencial de reduzir emissões e avançamos muito nessa área. Em 2010 foi lançado o programa Agricultura de Baixo Carbono [ABC], e os agricultores finalmente começaram, em 2012, a acessar este crédito, subsidiado para atividades agrícolas. Todas as atividades previstas no programa ABC são de aumento da eficiência, o que eleva a produtividade e diminui as emissões. Com um programa ABC forte, as emissões da agricultura brasileira em 10 a 15 anos vão ser muito menores.

AFP - Em janeiro de 2011, grandes deslizamentos provocados por fortes chuvas na região serrana do Rio de Janeiro mataram mais de 500 pessoas. Considerando que nos próximos anos o Brasil vai sediar a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos, o senhor acredita que o país está preparado para reagir rapidamente a um desastre natural?

Nobre - Até o evento da região serrana do Rio, com raríssimas exceções, não se via o desastre natural como algo que pudesse ser prevenido. Aquele que foi o maior desastre natural da história do Brasil foi um divisor de águas. A partir dali, rapidamente se desenhou no Brasil o Plano Nacional de Gestão de Riscos e Resposta a Desastres naturais, lançado pelo governo em agosto de 2012, com prevenção de longo prazo, remoção de populações que vivem em áreas de altíssimo risco, diminuição de riscos com obras.

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação lidera o sistema Alerta, que consiste em passar informação precisa para a Defesa Civil de que há riscos de deslizamentos maciços em algumas horas. Hoje são cerca de 300 municípios monitorados, com mais de 10 mil áreas de risco [mapeadas]. Até 2014 serão 800 municípios. Esse novo centro tem 110 profissionais, funciona 24 hora por dia e já lançou mais de 300 alertas