Usada por Lampião, canoa símbolo do São Francisco aguarda reparos há 2 anos
A canoa de tolda Luzitânia faz parte da história do rio São Francisco. Construída na década de 1920, ela foi usada por Lampião e seu bando de cangaceiros, que viveram pela região nos anos finais de vida.
Tombada pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) como patrimônio histórico nacional em dezembro de 2012, a embarcação está parada há dois anos e meio.
A embarcação pertence à ONG Sociedade Canoa de Tolda e foi vítima de uma subida de nível do rio gerada pelo aumento da vazão da hidrelétrica de Xingó, entre Alagoas e Sergipe.
A canoa ficou submersa em janeiro de 2022 e precisou passar por uma operação de resgate. A embarcação, por decisão judicial, foi levada para Traipu e agora espera ser levada para uma oficina para poder voltar a navegar no maior rio 100% brasileiro.
O caso foi parar na Justiça, e no último dia 10, o juiz da 3ª Vara Federal de Sergipe, Edmilson da Silva Pimenta, deu um prazo de 90 dias para que a canoa seja removida até Penedo, onde deve ser reformada e devolvida ao seu dono.
História
A canoa é uma peça única no patrimônio cultural naval brasileiro. Segundo a ONG, ela é um dos dois últimos exemplares do tipo no Baixo São Francisco (entre Alagoas e Sergipe), sendo a única fielmente restaurada.
Esse tipo de embarcação é uma herança de diversas tradições navais, europeias, africanas, asiáticas e nativas, e tem esse nome devido à cobertura em madeira na zona da proa.
As canoas faziam o transporte de mercadorias na região do Baixo São Francisco no passado, tendo expandido sua zona de navegação para os submédio e médio São Francisco, nas décadas de 1940 a 1960. Esse tipo de barco, ressalte-se, só existe no Brasil. Na época do cangaço, o barco se chamava Rio Branco.
Ela seria hoje foi o mais significativo objeto usado aqui na fase sedentária de Lampião, que foram seus últimos 10 anos, quando ele fazia também agiotagem. Ele tinha por aqui terras e canoas, que faziam transporte.
Carlos Eduardo Ribeiro Junior, fundador e presidente da ONG Canoa de Tolda
Ele lembra que a canoa foi a primeira embarcação tombada no Brasil. "Demos entrada com o processo no Iphan ainda em 2000", diz.
Em 2007, após um rigoroso processo de restauro que durou 10 anos —e foi feito com mestres carpinteiros navais—, a canoa voltou a navegar e passou a ser usada em expedições de monitoramento ambiental. Ela estava prestes a começar a navegar quando foi atingida pela subida de nível do rio.
Tentamos resolver diretamente com o Iphan, mas foi necessária uma ação judicial para fazer o órgão cumprir com seu papel básico de preservar e proteger parte do patrimônio do país.
Carlos Eduardo Ribeiro Junior
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Quero receberA viagem da Luzitânia entre Traipu e Penedo será complexa, já que as estradas são estreitas para que ela seja levada por terra. "A única maneira de realizar o traslado é por água, e o transporte da embarcação será a bordo de uma balsa", destacou Carlos.
Em Penedo, os trabalhos de reparo serão realizados pela Ufal (Universidade Federal de Alagoas).
Mas o Iphan, até o momento, não nos forneceu qualquer previsão de início das obras, término das mesmas e entrega da embarcação para seu retorno à paisagem o Baixo São Francisco. Dois anos e meio desde o início dessa querela judicial, lamentável, mas necessária, a Luzitânia ainda tem seu futuro incerto.
Carlos Eduardo Ribeiro Junior
Recurso já destinado
Em nota, o Iphan diz que, desde 2023, está estruturando uma estratégia nacional denominada "Canteiros Modelo de Conservação" para preservação e a conservação de bens culturais, "especialmente de bens tombados para os quais os seus proprietários são comprovadamente incapazes financeiramente de arcar com os custos da sua manutenção".
A recuperação da canoa, diz, está prevista em uma das etapas desse canteiro. Para isso, afirma que foi assinado um termo de execução descentralizada com a Ufal "para a qual o Instituto destinou recursos de R$ 500 mil".
Trata-se de uma ação idealizada pelo Iphan em diálogo com ONG Canoa de Tolda, Ufal e Prefeitura de Penedo, que visa estabelecer uma iniciativa ampla e continuada de educação patrimonial, pesquisa, revitalização e difusão de conhecimentos tradicionais do Baixo São Francisco, com especial enfoque na manufatura de embarcações tradicionais da região.
Iphan
Sobre o porquê de levar a canoa para Traipu, afirma que ela "permanece fora d'água em condições adequadas de estocagem, abrigada de intempéries climáticas e protegida de eventuais cheias do rio São Francisco". Não foi dado pelo órgão datas para levar a canoa.
Dinheiro não dá, diz Ufal
Segundo o engenheiro de pesca e professor da Ufal em Penedo, Igor da Mata Oliveira, coordenador das obras de reparos da Luzitânia, a embarcação é uma "joia indissociável do ambiente do Baixo São Francisco".
Ele é quem deve receber a canoa para reforma, mas diz que, apesar de ter os recursos iniciais em conta para começar os trabalhos, o dinheiro só é suficiente para preparar espaço e compra de ferramentas e materiais. "Não será suficiente para começar, não dá para contratar mão-de-obra".
Dependemos do Iphan para tratar do lugar onde será instalado o canteiro de obras. Definindo esse lugar, será preparado o traslado para que, efetivamente, a gente possa depois adquirir material.
Igor da Mata Oliveira
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