Quem ganha com a última minirreforma eleitoral?
Seguindo triste tradição, o Congresso Nacional promoveu em setembro de 2015 a 11ª minirreforma em 10 ciclos eleitorais de vigência da atual Lei Geral das Eleições. Trata-se da Lei nº 13.165/15, que alterou a Lei nº 9.504/97 e trouxe mudanças para o pleito municipal.
Exatamente, temos mais de uma reforma eleitoral a cada dois anos. Nesta última reforma, as mudanças foram radicais, especialmente no que toca à propaganda eleitoral. A lógica foi reduzi-la ao mínimo possível. O tempo total de propaganda caiu pela metade –de 90 para apenas 45 dias. O horário eleitoral gratuito perdeu dez dias, reduzindo-se ainda o tempo dos blocos.
Ainda quanto ao horário eleitoral, o fantasma das pirotecnias dos marqueteiros segue assustando. Não se espera que o eleitorado, em grande parcela jovem e cada vez mais antenado nas novas tecnologias de comunicação, interesse-se por programas modorrentos, nos quais o candidato exponha suas propostas sem qualquer recurso gráfico.
Nas ruas, praticamente não se vê campanha. Cavaletes, bonecos e outros apetrechos móveis foram banidos. Mesmo na casa das pessoas, bens particulares, estipulou-se a absurda limitação de meio metro quadrado para a publicidade eleitoral.
O resultado de tanta mudança, infelizmente, não é promissor. Se surgem acusações de lesão ao erário, compra de apoio parlamentar e desvios, responde-se com a proibição de brindes, showmícios e com a redução no tamanho das placas de propaganda eleitoral na casa das pessoas. Se uma estrutura sofisticada de corrupção começa a ser identificada, a solução dada é a diminuição do tempo de propaganda.
A cada nova leva de escândalos, como se vê, nosso Parlamento responde com alterações que, longe de serem inócuas, tornam o regramento ainda pior. O problema reside na pergunta que poucos param para se fazer: quem sai ganhando com essas sucessivas mudanças? A resposta, infelizmente, não é a democracia. Ao contrário, promove-se a perpetuação dos mesmos no poder.
O fenômeno pode ser explicado de forma simples: toda vez que se reduz o tempo e os meios para realização de propaganda eleitoral, ganha aquele que já é conhecido e, por isso, não precisa se expor. Estamos falando, em primeiro lugar, dos que ocupam cargos eletivos e, assim, além de já terem sido eleitos antes, recebem ao longo de quatro anos atenção da mídia. Mais do que isso, dispõem, em geral, de recursos de gabinete para promoção de suas atividades — benesse com a qual seus adversários não contam.
Saem na frente também os candidatos que são conhecidos por outros motivos, normalmente alheios à sua atividade política. Ministros religiosos, radialistas, celebridades em geral. Já conhecidos do grande público, agradecem ao fato de que seus concorrentes não disporão da oportunidade de se mostrar ao eleitorado.
A reforma veio embalada em um discurso duplo, que soa bem aos ouvidos da opinião pública: precisamos reduzir os custos das campanhas e, de todo modo, a propaganda eleitoral é uma chatice que ninguém quer ver. Nada mais falacioso.
O custo oculto das campanhas —gasto com a compra de votos e de apoio político dos líderes locais, com o abuso da máquina pública e a troca de cargos por coligações — esse permanece intacto, pago como sempre à margem da legalidade. Seu peso, aliás, tende a subir. Se os recursos oficiais minguam, com a proibição das doações legais pelas empresas, o dinheiro do caixa dois passa a ser cada vez mais valioso. A regra de mercado é implacável. Se antes um candidato não vendia sua alma por trinta dinheiros, quem sabe não o fará agora?
Quanto à propaganda eleitoral ser enfadonha, uma constatação há que se fazer: é apenas por intermédio dela que se torna possível saber quem é quem, quais os defeitos e qualidades dos candidatos, como pretendem solucionar os problemas e, principalmente, por qual razão merecem o seu voto.
Tolerar a propaganda política é parte do custo de se viver em um Estado Democrático de Direito. Não se ouve tanta reclamação quando somos obrigados a aceitar, desde o momento em que nascemos, publicidade comercial de todos os tipos, a todo momento.
Enquanto seguirmos caindo no discurso fácil que vem paulatinamente matando as campanhas eleitorais, estaremos contribuindo para que se torne viva a célebre frase de Tomasi di Lampedusa, quando disse que “algo deve mudar para que tudo continue como está”.
- O texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL
- Para enviar seu artigo, escreva para uolopiniao@uol.com.br
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.