Jurista: Bolsonaro pode ser condenado mesmo alegando 'cegueira deliberada'

O argumento usado por Jair Bolsonaro de desconhecer qualquer plano para aplicar um golpe de Estado não é suficiente para livrá-lo de uma eventual condenação, explicou Fernando Neisser, professor de Direito da FGV-SP (Fundação Getúlio Vargas), no UOL News desta quinta-feira (28).

Em entrevista exclusiva ao UOL, Bolsonaro disse "não ter a menor ideia" do que era o plano chamado de "Punhal Verde e Amarelo". Apreendido com o general Mario Fernandes, ele previa o assassinato do presidente Lula, do vice Geraldo Alckmin e do ministro do STF Alexandre de Moraes. O ex-presidente ainda admitiu a possibilidade de se refugiar em uma embaixada caso seja condenado por seu envolvimento com a trama golpista.

Nosso sistema jurídico-penal prevê uma forma de responsabilização que chamamos de 'cegueira deliberada'. É aquela pessoa que está em uma posição de comando e propositalmente se afasta das discussões ilícitas para depois tentar se isentar de responsabilidade. No nosso sistema jurídico, essa pessoa também é condenada como autora dos crimes.

Se ele tentar mostrar que era um bobo e não sabia tudo o que estava acontecendo ao redor dele, sendo o presidente da República e tendo criado essa estrutura, cairia em uma responsabilização por cegueira deliberada.

Não é preciso nem chegar, como foi discutido na entrevista, na chamada teoria do domínio do fato. A própria cegueira deliberada já levaria à condenação do Bolsonaro. É um trabalho difícil, se não impossível, que haverá pela frente perante o Supremo Tribunal Federal. Fernando Neisser, professor de Direito da FGV-SP

Questionado pelo colunista Leonardo Sakamoto se o PL, partido de Bolsonaro, pode ser punido por participar do plano golpista, Neisser afirmou que a sigla pode ter que devolver recursos públicos do fundo partidário e até mesmo ser extinta.

Há duas possibilidades de punições. A mais branda seria considerar que o PL usou recursos públicos para fins ilícitos. Ou seja, se na análise das contas do partido durante o período Bolsonaro, o PL teria usado recursos públicos do fundo partidário e do fundo eleitoral para promover fins ilegais.

Se o Tribunal Superior Eleitoral, ao julgar as contas, assim entender, pode determinar que as pessoas responsáveis, como presidente e tesoureiro, devolvam esses valores do próprio bolso aos cofres públicos. A punição mais pesada que pode existir é o cancelamento do registro do partido perante o TSE.

Aqui, as hipóteses são muito restritas e a única que em tese poderia caber é quando se comprova que um partido estabeleceu uma força paramilitar. Ou seja, um grupo que usava força física ou que pretendia usá-la contra as instituições. Isso dependerá das provas que serão produzidas e se o PL estava diretamente integrado com esses agentes das forças de segurança para obter um golpe de Estado.

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Se isso ficar comprovado, o PL pode, sim, sofrer uma ação específica de cancelamento de registro e estatuto partidário no TSE. Em tese, isso poderia levar à extinção do partido. Fernando Neisser, professor de Direito da FGV-SP

Raquel Landim: Em negação, Bolsonaro acha que não será preso e condenado

Mesmo diante de evidências robustas de seu papel central na trama golpista, Jair Bolsonaro age em negação e insiste em pensar que escapará de uma condenação, disse a colunista Raquel Landim no UOL News ao revelar os bastidores da conversa dela e da colunista Letícia Casado com o ex-presidente.

A minha impressão como repórter é a seguinte: apesar de todas as evidências existentes no indiciamento e de não sabermos qual será a posição do Procurador-Geral [Paulo Gonet], Bolsonaro não conta com a possibilidade de ele ser preso. Ele não conta com isso. Bolsonaro acha que o clima político será revertido lá na frente e não trabalha com essa possibilidade [de ser preso].

Ele está em negação em relação a isso. Perguntamos a ele se não tem medo de ser preso. Ele fala: 'olha, a gente vive em um país de arbitrariedades, mas não posso viver com medo de a PF estar na minha casa todos os dias. Ele realmente acha que não será preso e que alguma coisa vai mudar até o final do processo penal. Raquel Landim, colunista do UOL

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Sakamoto: Bolsonaro pode fugir sem passaporte por ter rede de apoio

O fato de estar com o passaporte retido pouco importa para Jair Bolsonaro, que conta com uma rede de apoio para buscar refúgio caso seja condenado por seu envolvimento na trama golpista, afirmou o colunista Leonardo Sakamoto.

Já vi muita gente dizendo que Bolsonaro está com passaporte retido, mas isso não significa absolutamente nada para uma pessoa que tem recursos financeiros e políticos, tem contatos e uma rede de apoio e diuturnamente planeja a própria fuga desde 2021.

Vimos as conversas vadias dos empresários em grupos de WhatsApp defendendo Bolsonaro, falando que fariam tudo o que fosse possível. O que não falta é apoio. Bolsonaro não é um 'zé ruela' qualquer; é um líder de massas. Ele conseguiria abrigo e fuga.

Se o pessoal executor do 8/1 conseguiu fugir para a Argentina e para o Uruguai estando com tornozeleira eletrônica, com passaporte bloqueada e com condenação colocada, por que não Bolsonaro?

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Uma fuga não precisa ser terrestre. Ele pode embarcar em um jatinho em Mato Grosso do Sul. Há uma fronteira difícil de ser resguardada pelas Forças Armadas e pela Polícia Federal. Ele pode cruzar para o Paraguai ou para outro país e de lá se deslocar para os Estados Unidos. Ele não precisa ficar no frio da Hungria; pode ir para Orlando e abraçar o Pateta. Leonardo Sakamoto, colunista do UOL

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