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Réu do mensalão recebeu R$ 1,5 milhão de caixa dois, diz advogado

Fernanda Calgaro*

Do UOL, em Brasília

07/08/2012 16h04Atualizada em 07/08/2012 18h45

O advogado Paulo Sérgio Abreu e Silva, que defende Rogério Tolentino, sócio de Marcos Valério, disse, durante sustenção oral no STF (Supremo Tribunal Federal) nesta terça-feira (7), que seu cliente admitiu que recebeu R$ 1,49 milhão da empresa SMP&B em recursos não declarados, prática conhecida como "caixa dois". 

A SMP&B era uma das agências publicitárias que mantinha contratos com o governo federal durante a primeira gestão de Luiz Inácio Lula da Silva e é apontada pela Procuradoria Geral da República (PGR) como envolvida no suposto esquema do mensalão.

"O Rogério me afirmou que recebia honorários da SMP&B no famoso caixa dois, e não contabilizava", disse. O advogado afirmou que alertou Tolentino sobre a ilegalidade da prática. "Caixa dois é perigoso, pode ter ação fiscal e penal depois." 

Ontem (6), advogados de réus petistas admitiram que o partido fez caixa dois para saldar dívidas de campanha, mas negaram que houve a prática de compra de parlamentares, que ficou conhecida como mensalão.

Durante sua sustentação, o advogado de Tolentino ironizou a denúncia apresentada pela Procuradoria Geral da República. "Essa denúncia é um roteiro para novela das oito", disse.

"O que eu já falei dessa denúncia é um horror", afirmou o defensor. Segundo Abreu e Silva, a PGR foi incluindo, à revelia, nomes na denúncia, até "chegar ao astronômico número de 40 [réus]". "A denúncia formou três quadrilhinhas pra formar o quadrilhão", disse, referindo-se aos três núcleos (político, operacional e financeiro) apontados pela Procuradoria.

Rogério era sócio das empresas de Marcos Valério e, de acordo com a denúncia do procurador, Tolentino negociou empréstimos e ajudou a montar o esquema de distribuição de dinheiro a políticos, para que eles apoiassem projetos do governo federal durante a primeira gestão de Luiz Inácio Lula da Silva. Ele afirma que a operação no Banco BMG, na qual pagou encargos e deu garantia, foi lícita.

Abreu e Silva afirmou que "Rogério Tolentino nunca foi sócio ou gestor das empresas do corréu Marcos Valério", contrariando a denúncia do Ministério Público Federal (MPF). 

Segundo ele, Tolentino não distribuiu dinheiro a políticos, embora tivesse dado três cheques em branco à SMP&B. "Ele entregou três cheques em branco à SMP&B e, por ordem de Marcos Valério, Simone Vasconcellos os preencheu para a bônus Banval. Quando os cheques chegam, eles são repassados a três políticos do antigo PP."

Ainda de acordo com o advogado, Rogério Tolentino "confessa que tomou um empréstimo de R$ 10 milhões no banco BMG a pedido da SMP&B".

Tolentino nega que mantivesse relações próximas com a diretoria do Banco Rural ou com a financeira Bônus Banval, acusada pelo Ministério Público de repassar dinheiro a políticos. Ele responde por formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem ou ocultação de dinheiro.

Caixa dois no mensalão é crime prescrito, diz especialista

Hoje, os advogados de quatro réus ligados ao publicitário Marcos Valério, acusado de ser o operador do mensalão, começaram a apresentar a sua defesa no plenário do STF (Supremo Tribunal Federal), no quarto dia de julgamento do suposto escândalo. A sessão de hoje começou por volta de 14h25. Cada defensor tem uma hora para expor seus argumentos.

Análise

O presidente da Comissão de Direito Administrativo da OAB-SP, Adib Kassouf Sad, que acompanha o julgamento do mensalão na redação do UOL nesta terça-feira (7), afirmou que a estratégia da defesa de alguns dos réus do processo de alegar caixa dois faz parte de uma tentativa de remeter o caso à Justiça eleitoral.

"Se houvesse uma mudança brusca de entendimento, a maior parte ou a totalidade desses crimes estaria prescrita, ou seja, a própria ação morreria a partir de agora", disse Sad.

O advogado afirmou ainda que, devido à complexidade da denúncia, que "envolve um número bastante grande de pessoas" e defende a existência três núcleos no esquema criminoso (político, operacional e financeiro), é esperado que a defesa tente desmerecer o trabalho da Procuradoria em busca de pontos fracos na argumentação.

Cristiano Paz

Mais cedo, o advogado Castellar Modesto Guimarães Filho, que defende o publicitário Cristiano Paz, sócio de Marcos Valério nas empresas SMP&B Comunicação e Graffiti, afirmou que seu cliente só atuava na parte de criação nas empresas e não se envolvia em questões financeiras e administrativas.

"Sua atividade como homem de criação o impedia de qualquer outra participação na SMP&B. Ele trabalhava na construção de marcas", disse. Para corroborar sua tese, o defensor citou prêmios recebidos pelo seu cliente e um depoimento do também publicitário Duda Mendonça --um dos réus do mensalão--, ratificando o argumento de que quem atua em criação, em geral, não se dedica a outras atividades nas empresas de publicidade.

Cristiano Paz é acusado de negociar empréstimos e ajudar na distribuição de dinheiro a políticos em troca de contratos de publicidade. Paz também é acusado de ter feito remessa irregular de dinheiro para o exterior, respondendo pelos crimes de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, corrupção ativa, evasão de divisas e peculato.

Em sua sustentação oral, o advogado de Paz citou testemunhos de várias pessoas ligadas a seu cliente para corroborar a tese de que Paz cuidava apenas dos departamentos de criação e publicidade das agências onde trabalhou.

O advogado disse também que, ao ver a denúncia da Procuradoria Geral da República, ficou otimista porque faltavam provas contra seu cliente. "Em nenhuma vez sequer existe a menção ou a intenção de individualizar a conduta de Cristiano Paz", afirma. "Faltam aos autos instrumentos, provas necessárias para embasar o pedido de condenação [do meu cliente]."

O empresário nega que fosse responsável pelos setores administrativo e financeiro das agências e afirma que os empréstimos e os contratos de publicidade foram regulares. Paz, no entanto, admite ter aceitado ser avalista nos empréstimos do Banco Rural e BMG ao PT, pois queria ganhar a conta publicitária do partido. Ele nega saber do repasse do dinheiro para outros beneficiários, além dos petistas.

A agência onde o publicitário Cristiano Paz trabalha atualmente, de propriedade de seu filho, "não tem, por opção dela, nenhuma conta pública", segundo o advogado Castellar Guimarães.

Próximas defesas

A próxima defesa foi da ré Simone Vasconcelos. Na época do mensalão, ela era diretora financeira da SMP&B, uma das agências de Marcos Valério. Ela é acusada de ter distribuído dinheiro esquema ao instruir o Banco Rural acerca do que fazer, sacar cheques na boca do caixa e fazer pagamentos pessoalmente.

Simone admite ter entregado o dinheiro, mas afirma que não sabia o objetivo dos pagamentos. Ela se defende dizendo que era funcionária e apenas cumpria ordens de Marcos Valério e seus sócios. As acusações contra ela são formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro, corrupção ativa e evasão de divisas.


A quarta defesa a ser ouvida pelos ministros do STF é a de Geiza Dias. Na época, ela era gerente financeira da agência SMP&B e subordinada a Simone Vasconcellos. Ela afirma que apenas cumpria funções do seu cargo, que incluíam realizar saques e fazer reservas para saques em espécie, e nega que soubesse do acordo entre os sócios da agência e o PT.

A última ré a ter a sua defesa apresentada é Kátia Rabello, ex-presidente do Banco Rural. Ela alega que todas as movimentações financeiras da instituição eram registradas, ao contrário do que argumenta o Ministério Público. Diz ainda que as relações com o grupo de Marcos Valério eram apenas profissionais e que os empréstimos concedidos pelo banco eram, de fato, verdadeiros.

O procurador-geral da República afirma que o dinheiro dos empréstimos era destinado para financiar o mensalão, pois o banco sabia que não seriam devolvidos. Além disso, Rabello nega que fizesse os empréstimos com o intuito de beneficiar o banco com a liquidação do Banco Mercantil de Pernambuco.

Primeiro dia de defesas

No primeiro dia dedicado às defesas dos réus do mensalão, nesta segunda-feira (6), cinco advogados foram à tribuna do STF para defender seus clientes. O primeiro a falar foi o advogado de José Dirceu, que disse que o ex-ministro não chefiou nenhuma quadrilha. “José Dirceu não é chefe de quadrilha, não”, disse. “Não há nos autos do processo nenhum depoimento, nenhuma testemunha, que faça essa afirmação, de que José Dirceu, na [chefia da] Casa Civil, tenha beneficiado qualquer instituição financeira”, afirmou José Luís de Oliveira Lima.

O defensor de Genoino alegou que o mensalão "foi uma farsa", enquanto o advogado de Delúbio Soares admitiu o uso de caixa dois, o que também foi proclamado pela defesa de Marcos Valério. O último a apresentar a sustentação oral foi o advogado de Ramon Hollerbach, ex-sócio de Valério. Os ministros do STF Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes foram pegos cochilando durante as defesas dos advogados.

Entenda o dia a dia do julgamento

Entenda o mensalão

O caso do mensalão, denunciado em 2005, foi o maior escândalo do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. O processo tem 38 réus, incluindo membros da alta cúpula do PT, como o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil). No total, são acusados 14 políticos, entre ex-ministros, dirigentes de partido e antigos e atuais deputados federais.

O grupo é acusado de ter mantido um suposto esquema de desvio de verba pública e pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio ao governo Lula. O esquema seria operado pelo empresário Marcos Valério, que tinha contratos de publicidade com o governo federal e usaria suas empresas para desviar recursos dos cofres públicos. Segundo a Procuradoria, o Banco Rural alimentou o esquema com empréstimos fraudulentos.

O tribunal vai analisar acusações relacionadas a sete crimes diferentes: formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de divisas e gestão fraudulenta.

*Colaboraram Fabrício Calado e Guilherme Balza, em São Paulo