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Advogados dizem que, pelos critérios do MPF, Lula deveria ser denunciado por mensalão

Camila Campanerut*

Do UOL, em Brasília

10/08/2012 18h47Atualizada em 10/08/2012 19h57

O advogado Délio Lins e Silva Filho, que faz a defesa do ex-tesoureiro do Partido Liberal, Jacinto Lamas, disse que, se o Ministério Público Federal estendesse o mesmo critério que usou para denunciar seu cliente para outros citados nos depoimentos, deveria pedir a condenação do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. A afirmação foi feita nesta sexta-feira (10), durante o sétimo dia do julgamento do mensalão no STF (Supremo Tribunal Federal), em Brasília.

“Não vou dizer de maneira nenhuma que ele deveria estar nessa denúncia, mas questiono a ausência de critério do MP. Se entre as quatro paredes do Planalto eram feitas as tratativas, quem seria o maior beneficiário? Seria o chefe da nação, o chefe do palácio do governo, o presidente Lula”, disse.

"Por que é tão fácil acreditar no presidente Lula quando ele disse que nada sabia e é tão difícil acreditar em Jacinto?", disse.

A defesa do réu Antônio Lamas, que seguiu-se à de Jacinto Lamas, também questionou a participação do ex-presidente. "Por que o senhor Luiz Inácio Lula da Silva não foi denunciado? Nesse Brasil o cassetete só rola nas costas do humilde", disse o advogado Délio Lins e Silva, pai do defensor que o antecedeu.

Jacinto Lamas é acusado de organizar e intermediar o esquema de entrega de recursos do PT até o PL, a mando do deputado federal Valdemar Costa Neto, então presidente da sigla. Pesam sobre ele as acusações de crimes de formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ele também é acusado de operar o contrato da Guaranhuns com a SMP&B, do publicitário Marcos Valério, supostamente para esconder a origem do dinheiro.

Na sua sustentação oral, Silva Filho disse duas vezes para os ministros separarem no julgamento "mensageiros e mensaleiros" ou o "joio do trigo". Ele também afirmou que seu cliente atuava a mando de Costa Neto e não tinha conhecimento das supostas ilicitudes praticadas. 

"Quem mandava e desmandava no partido e quem manda e desmanda até hoje é Valdemar Costa Neto", disse. Segundo a defesa, "Jacinto Lamas era um zero à esquerda" e seu papel no partido político "era meramente figurativo."

Para refutar a acusação de formação de quadrilha, o advogado de Jacinto Lamas disse que os quadrilheiros precisam ao menos saber quem são os outros quadrilheiros e que seu cliente não tinha ciência do suposto esquema.

O advogado de Jacinto Lamas afirma que ele sempre admitiu os saques, mas que ele "não tinha ciência da origem ilícita desses valores e achava que os valores eram para o Valdemar Costa Neto (pessoa física) e não para o partido", por isso que não precisaria ser contabilizado.

Valdemar Costa Neto

Além de Lula, foi citado na sessão de hoje o julgamento do ex-presidente Fernando Collor de Mello no STF, no qual ele foi inocentado da acusação de corrupção passiva, foi usado como exemplo pelo advogado Marcelo Luiz Ávila de Bessa para livrar o deputado federal Valdemar Costa Neto (PR-SP) no julgamento do mensalão.

No julgamento de Collor, em 1994, o Supremo considerou que não houve provas que comprovassem a ocorrência do chamado “ato de ofício”, quando um servidor público muda a sua postura em determinado ato mediante recebimento de vantagem financeira --pressuposto do crime de corrupção ativa e qualificante de corrupção passivAntono Lamasa. Collor foi inocentado no processo porque não foi comprovado que ele se beneficiou com o desvio de recursos. 

“Na época de Collor, o procurador não apresentava o corruptor, só o corrompido. No recebimento de propina, é necessário especificar a relação entre conduta ativa e passiva”, afirmou Bessa. "O procurador de certa forma forçou, ou pretende forçar uma reavaliação daquela interpretação." Para o advogado, não há comprovação de ato de ofício no suposto esquema, ou seja, não há provas de que houve a compra de votos de Valdemar.

O defensor argumentou que o comportamento da bancada do PL nas votações no Congresso é prova de que não houve mensalão. "O comportamento é igual quando ele supostamente recebia ou não dinheiro do PT", afirmou. Bessa também disse que Valdemar não votou em algumas das sessões onde a Procuradoria diz ter existido compra de votos.

O advogado e jurista Marcelo Figueiredo, diretor da Faculdade de Direito da PUC-SP e professor de direito constitucional, que comenta na redação do UOL a sessão do STF desta sexta-feira (10), pondera este último argumento. "Sustentou o advogado que o deputado Valdemar Costa Neto não votou ou não compareceu em algumas das sessões onde o MP alega existir 'compra de votos'. Ocorre que não há necessidade de prova de que ele efetivamente recebeu dinheiro nas votações para se caracterizar crime de corrupção. Basta a existência da vantagem indevida, ou a sua promessa", avalia. 

Defensor pede anulação

O defensor público federal Haman Córdova, que foi nomeado para a defesa do réu Carlos Alberto Quaglia, reforçou, nesta sexta-feira (10), o pedido feito anteriormente de nulidade absoluta da ação penal contra o acusado. O argumento de Córdova é que o réu teve o direito de defesa cerceado ao longo do processo por ter ficado sem advogado.

Quaglia trocou de advogado em 2006, quando Haroldo Rodrigues passou a defendê-lo no lugar de Dagoberto Dufau. Segundo a defensoria, o novo advogado não foi intimado para acompanhar o depoimento de testemunhas que incriminaram o réu. O defensor diz ainda que, por conta disso, o acusado não pode arrolar testemunhas a seu favor.

Córdova argumenta ainda que a defesa de Quaglia só foi assumida pela Defensoria Pública em abril de 2011, já na fase das alegações finais, e que apenas nesse momento a defensoria tomou conhecimento do cerceamento da defesa. “Até então houve falha processual”, disse Córdova. “A questão processual passou ao largo de Alberto Quaglia.”

Breno Fischberg

Antes de Quaglia, foi apresentada a defesa de Breno Fischberg, apontado pelo Ministério Público Federal como sócio junto com Enivaldo Quadrado na corretora Bônus Banval. Ele é acusado de lavar dinheiro de Valério e repassá-lo a integrantes do Partido Progressista. Fischberg responde pelos crimes formação de quadrilha e lavagem de dinheiro; assim como seu sócio que apresentou sua defesa ontem (9).

"Tecnicamente não há nos autos nada que se possa deduzir do que a inocência", afirma Nostre. Na nota de rodapé citada pelo advogado afirma-se que Fischberg e Quadrado seriam os interlocutores de Valério na Bônus Banval. "Não há recibos, telefonemas e menção a Breno em outros depoimentos.”

A Procuradoria afirma que Valério citou Fischberg em depoimento à CPI dos Correios. Nostre argumenta que o publicitário não conhecia o corretor e menção feita por Valério não ocorreu perante o contraditório, ou seja, sem a presença do advogado de Fischberg para confrontá-la.

Segundo a Procuradoria, a Bônus Banval foi indicada pelo deputado José Janene (PP-PR), morto em 2010, para fazer a lavagem de R$ 11 milhões do valerioduto, e repassar o montante para parlamentares indicadas por ele.

Entenda o dia a dia do julgamento

Entenda o mensalão

O caso do mensalão, denunciado em 2005, foi o maior escândalo do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. O processo tem 38 réus, incluindo membros da alta cúpula do PT, como o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil). No total, são acusados 14 políticos, entre ex-ministros, dirigentes de partido e antigos e atuais deputados federais.

O grupo é acusado de ter mantido um suposto esquema de desvio de verba pública e pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio ao governo Lula. O esquema seria operado pelo empresário Marcos Valério, que tinha contratos de publicidade com o governo federal e usaria suas empresas para desviar recursos dos cofres públicos. Segundo a Procuradoria, o Banco Rural alimentou o esquema com empréstimos fraudulentos.

O tribunal vai analisar acusações relacionadas a sete crimes diferentes: formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de divisas e gestão fraudulenta.

*Colaboraram Fernanda Calgaro, em Brasília, e Guilherme Balza, em São Paulo