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Barbosa atribui corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha a réus do PL

Valdemar Costa Neto, ex-presidente do PL (atual PR), é um dos acusados de cometer os crimes - Sergio Lima/Folhapress
Valdemar Costa Neto, ex-presidente do PL (atual PR), é um dos acusados de cometer os crimes Imagem: Sergio Lima/Folhapress

Camila Campanerut*

Do UOL, em Brasília

19/09/2012 15h37Atualizada em 19/09/2012 18h48

O relator do mensalão, ministro Joaquim Barbosa, afirmou nesta quarta-feira (19), no Supremo Tribunal Federal (STF), que os réus Valdemar Costa Neto, ex-presidente do PL (Partido Liberal, atual PR), Carlos Alberto Rodrigues (Bispo Rodrigues), ex-deputado federal pelo PL, e Jacinto Lamas, ex-tesoureiro da sigla, cometeram crime de corrupção passiva e lavagem de dinheiro ao receberem propina do PT entre 2003 e 2004, no primeiro mandato do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

O magistrado imputou ainda a Costa Neto e Jacinto Lamas o crime de formação de quadrilha.

Barbosa concordou com a tese da Procuradoria Geral da República, autora da denúncia, de que Costa Neto recebeu R$ 10,8 milhões do PT em troca do apoio da bancada do PL no Congresso. "O repasse [aos parlamentares do PL] foi feito por interlocução de Delúbio Soares [ex-tesoureiro do PT], que indicou os nomes dos beneficiários a Marcos Valério [publicitário apontado como operador do mensalão]", afirmou.

O ministro absolveu o réu Antonio Lamas, irmão de Jacinto, da acusação de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha por considerar que ele recebeu uma única vez dinheiro para ser entregue a Costa Neto e não haver provas de que sabia do que se tratava.

Segundo o relator, embora o PL estivesse no governo Lula, já que era a sigla do ex-vice-presidente José Alencar, os parlamentares da legenda ainda não estava fechada com o PT no Congresso. Para embasar o seu argumento de que o PL não apoiava o PT integralmente, Barbosa citou o depoimento de Bispo Rodrigues, em que ele conta que não apoiou a chapa composta por seu partido com o PT.

Barbosa citou ainda que, em depoimento, Marcos Valério confirmou o pagamento ao PL alegando "que se tratou apenas de [despesa de] campanha". Contra o argumento, o ministro afirmou que Costa Neto não apresentou comprovantes de que esse dinheiro tenha sido gasto com despesas eleitorais.

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O ministro afirmou ainda que os pagamentos ao partidos coincidem com as datas das votações das reformas tributária e da previdência na Câmara dos Deputados.

Em seu voto, o relator chamou a atenção para contradições nos depoimentos de Costa Neto. Primeiro, afirmou o relator, o réu disse que pagou seus fornecedores e prestadores de serviço de campanha em dinheiro em espécie oriundo do PT e que não ficou com os recibos, pois os teria repassados ao PT. Depois, Costa Neto teria dito que não tinha as notas e que apenas informou aos petistas o valor final das contas de campanha.

Barbosa rechaçou a alegação da defesa de Jacinto Lamas de que o réu cuidava mais da publicidade do partido do que dos recursos, embora fosse tesoureiro do PL.

"Não só [Jacinto Lamas] tinha conhecimento do caráter criminoso do Valdemar Costa Neto como queria auxiliá-lo na prática criminosa", disse o magistrado. "Ele [Jacinto Lamas] tinha profundo conhecimento da vida e das contas do partido."

O ministro sustentou que os recursos recebidos por Lamas foram todos entregues nas casas de Costa Neto e Bispo Rodrigues e o que dinheiro era para uso pessoal, já que não houve prestação de contas sobre o que foi feito com os montantes.

Para o advogado criminalista e presidente da Academia Paulista de Direito Criminal, Romualdo Sanches Calvo Filho, que acompanha na redação do UOL a sessão do STF, "embora Jacinto Lamas não tenha praticado diretamente a conduta de corrupção passiva, teria aderido dolosamente à conduta de Valdemar Costa Neto".

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"Com efeito, o artigo 29 do Código Penal é aplicável, uma vez que diz que aquele que de qualquer modo contribui para a conduta criminosa, responde por ela na medida de sua culpabilidade. Assim, Jacinto Lamas poderá responder por este crime a título de partícipe consciente da conduta de Valdemar Costa Neto", explica.

Ao tratar da acusação de lavagem de dinheiro, o ministro afirmou que "a estrutura empresarial de Marcos Valério também foi usada para ocultar o real pagador dos recursos, que era o PT".

Segundo Barbosa, os réus decidiram fazer um contrato de mútuo (empréstimo) para justificar a saída de dinheiro da SMP&B para a Guaranhuns Empreendimentos.

"Independentemente de quem tenha sido o mentor desta fraude, o fato é que os réus pretendiam simular um negócio privado entre a SMP&B e a [corretora] Guaranhuns para ocultar o real destinatário do dinheiro que era o réu Valdemar Costa Neto", afirmou.

Sobre a formação de quadrilha, Barbosa entendeu que Costa Neto e Jacinto Lamas atuaram em quadrilha com os sócios da empresa Guaranhuns, José Carlos Dias e Lúcio Funaro, para ocultar o repasse do dinheiro. Barbosa esclareceu que, embora Funaro e Dias não figurem na ação analisada pelo STF, era essencial a citação nesta etapa, para justificar a formação de quadrilha. O ministro lembrou que ambos só não foram denunciados porque estavam negociando acordo de delação premiada na época dos fatos. Posteriormente, os acusados desistiram do acordo e foram denunciados pelos mesmos crimes na Justiça de primeiro grau.

Barbosa retomou hoje seu voto sobre o suposto recebimento do mensalão pelos partidos da base aliada do primeiro governo de Lula. O item 6 da denúncia da Procuradoria Geral da República é o que está em análise no momento e trata dos crimes de corrupção ativa, corrupção passiva, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro envolvendo integrantes do PP, PL, PTB e PMDB .

PP e PTB

Na última segunda-feira (17), Barbosa deu indícios da condenação do deputado federal Pedro Henry (PP-MT), do ex-deputado federal Pedro Corrêa (PE) e do ex-assessor do PP João Cláudio Genú pelos crimes de formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O ex-deputado José Janene, também denunciado e citado no esquema, morreu em 2010.

Depois do PP e do PL, será a vez de o relator analisar a conduta dos parlamentares do PTB. Entre os réus petebistas estão: o ex-deputado e atual presidente do partido, Roberto Jefferson (RJ) –delator do caso–, o ex-deputado Romeu Queiroz (MG) e Emerson Eloy Palmieri, ex-tesoureiro da sigla.

A denúncia cita ainda o ex-deputado e ex-presidente da legenda José Carlos Martinez (PR), que morreu em 2003 e nem chegou a ser incluído no texto da Procuradoria, concluído em 2007. Na parte da denúncia que trata do PTB, aparece também citação ao ex-deputado pelo PL e ex-ministro dos Transportes de Lula, Anderson Adauto, que teria feito “acordo criminoso” com Romeu Queiroz e Jefferson.

O quarto partido denunciado é o PMDB do ex-deputado José Borba, que era líder da bancada da sigla na Câmara na época do mensalão. Ele teria sido beneficiado pelo esquema entre o Banco Rural e a empresa SMP&B e recebido R$ 200 mil para votar a favor de matérias de interesse do governo. Ele deixou o partido em 2007.

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Núcleo petista e núcleo publicitário

Esta parte do julgamento inclui ainda o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e outros réus da cúpula petista –Delúbio Soares e José Genoino. Inicialmente, também foi incluído o ex-secretário do partido, Sílvio Pereira, que fez acordo com o Ministério Público e já cumpriu pena alternativa.

Segundo a Procuradoria, “toda a estrutura montada por José Dirceu, Delúbio Soares, José Genoino e Silvio Pereira tinha entre seus objetivos angariar ilicitamente o apoio de outros partidos políticos para formar a base de sustentação do governo federal”.

Esse apoio, segundo a PGR, viria em troca do pagamento de “vultosas quantias” aos parlamentares e usaria os serviços do publicitário Marcos Valério e suas empresas para concretizar as transações. 

O núcleo publicitário do mensalão –formado pelo publicitário Marcos Valério, acusado de ser o operador do esquema, pelos seus ex-sócios Ramon Hollerbach e Cristiano Paz, pelo advogado Rogério Tolentino e pelas funcionárias da agência de Valério, a SMP&B, Simone Vasconcelos e Geiza Dias –, que já foi, em parte, condenado em fases anteriores do julgamento, também é novamente denunciado neste item.

Apenas ao final do voto desta fatia é que o relator deve apresentar a condenação ou absolvição dos 23 réus. A estimativa é que Barbosa conclua em até duas sessões a apresentação de seu voto referente a este item.

*Colaboraram Fernanda Calgaro, em Brasília, e Guilherme Balza, em São Paulo

Entenda o dia a dia do julgamento