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O que um presidente pode levar dos palácios quando seu mandato termina?

Líder indígena presenteou Lula com um cocar em 2006 - Eraldo Peres/AP
Líder indígena presenteou Lula com um cocar em 2006 Imagem: Eraldo Peres/AP

Wellington Ramalhoso

Do UOL, em São Paulo

11/03/2016 06h00

A investigação da operação Lava Jato sobre a mudança e o armazenamento do acervo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) levanta algumas questões. O que um presidente pode levar dos palácios de Brasília quando seu mandato termina? Quem paga as despesas da mudança? O que é feito com o acervo de um ex-presidente?

Uma lei assinada em 1991 pelo então presidente Fernando Collor (atual senador pelo PTB-AL) e um decreto de 2002, no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), tratam da preservação, organização e proteção dos acervos dos presidentes.

Um ex-presidente pode levar seus objetos e documentos, inclusive presentes recebidos ao longo do mandato, mas há exceções. Ele não pode transportar documentos produzidos durante a gestão, como originais de leis, nem objetos recebidos em cerimônias de troca de presentes com chefes de Estado e de governo. Documentos produzidos nesses encontros também não podem ser levados.

Ou seja, presentes dados por cidadãos, empresas e entidades ficam com o ex-presidente. Presentes dados por representantes de outros países em cerimônias oficiais ficam com a União. Estes podem permanecer no Palácio do Planalto, em Brasília, ou serem direcionados para o Arquivo Nacional e o Museu da República, no Rio de Janeiro.

Os documentos e objetos devem ser catalogados pela Secretaria de Documentação Histórica da Presidência da República. Ao fim da gestão, cabe à Presidência providenciar e pagar a mudança do ex-presidente.

Empresas podem apoiar ex-presidentes

Feita a mudança, o ex-mandatário passa a ser o responsável pelo acervo e a ter a obrigação de preservá-lo. Apesar de ser particular, o acervo de um ex-presidente é declarado de interesse público e componente do patrimônio cultural brasileiro, inclusive a parte acumulada antes de ele ocupar a presidência. Caso ele decida vender o acervo, a União tem direito de preferência.

De acordo com a legislação, uma comissão destinada a preservar a memória dos presidentes acompanha a manutenção dos acervos dos ex-mandatários. Ela é formada por representantes do Arquivo Nacional, do Iphan (Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e do Departamento de Documentação da Secretaria-Geral da Presidência, entre outros.

A lei afirma que uma das funções da comissão é “estimular a iniciativa privada a colaborar com os mantenedores de acervos, para a preservação, divulgação e acesso público”. Entretanto, o ex-presidente não é obrigado a expor o acervo.

Conforme a legislação, Lula e Fernando Henrique criaram institutos para cuidar das memórias de seus mandatos, entre outros objetivos, e contam com o recebimento de doações em dinheiro para mantê-los. Também existe o Instituto Itamar Franco, em Juiz de Fora (MG)

Os institutos Lula e FHC dizem que as respectivas mudanças foram pagas pela Presidência, como manda a lei. Quando assumiram os acervos, os dois institutos tiveram de pagar pelo armazenamento de parte dos objetos porque seus imóveis não comportavam as coleções completas.

A suspeita sobre Lula

No caso de Lula, o pagamento pelo armazenamento foi feito pela empreiteira OAS, o que levantou a suspeita do Ministério Público Federal. Os objetos ficaram armazenados com a empresa Granero de janeiro de 2011 a janeiro de 2016. Ao longo de cinco anos, a OAS pagou aproximadamente R$ 1,3 milhão pelo serviço, o que dá R$ 21.600 por mês.

Os procuradores dizem que o documento foi falsificado “para dele constar que se tratava de armazenagem de materiais de escritório e mobiliário corporativo de propriedade da construtora OAS”.

De acordo com reportagem da “Folha de S.Paulo”, o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, afirmou à Polícia Federal que o pagamento feito pela OAS foi uma espécie de doação.

Trono dado a Lula em Gana, na África - Divulgação - Divulgação
Trono dado a Lula em Gana, na África
Imagem: Divulgação

Em janeiro, os dez contêineres com objetos do ex-presidente Lula foram transferidos para um depósito do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC Paulista, em São Bernardo do Campo. Na página do instituto na internet, é possível ver parte dos documentos, fotos e vídeos que compõem o acervo do petista, mas a entidade ainda não tem uma solução para organizar todo o memorial.

A assessoria de Lula também informou que partes menores do acervo estão no apartamento em que o ex-presidente mora, em São Bernardo, “e no Sítio Santa Bárbara [em Atibaia], com anuência dos proprietários”.

Após prestar depoimento do dia 4, Lula afirmou em discurso feito na sede do PT, no centro de São Paulo, que foi o presidente que mais ganhou presentes na história e lembrou ter recebido até um trono africano.

FHC também guarda presentes

Gravuras e telas dadas a FHC - Divulgação/Instituto FHC - Divulgação/Instituto FHC
Gravuras e telas dadas a FHC
Imagem: Divulgação/Instituto FHC

Atualmente, o acervo de Fernando Henrique está guardado na sede do Instituto FHC, no centro de São Paulo. Em relação ao período presidencial, há, por exemplo, cerca de 1.500 objetos, incluindo presentes dados ao tucano por cidadãos e autoridades nacionais e estrangeiras.

O acervo também contém documentos e livros acumulados durante toda a trajetória do ex-presidente. Parte dos documentos foi digitalizada e pode ser pesquisada na página do instituto na internet.

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