Presidente da Alerj prevê mais impostos, critica Pezão e diz que Cabral é "melhor" do PMDB
Jorge Picciani, 61, está no meio do furacão em que se transformou a crise econômica e fiscal do Rio de Janeiro. Presidente da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio) e do PMDB estadual, o deputado vai comandar a partir desta terça-feira (6) as votações das polêmicas medidas de austeridade enviadas à Casa pelo governador Luiz Fernando Pezão, do seu partido.
Em entrevista ao UOL, Picciani falou sobre o conjunto de projetos --apelidado de "pacote das maldades" por servidores públicos que protestam desde o mês passado contra as iniciativas e que chegaram a invadir a Alerj--, e sinalizou que o aumento de impostos sobre alguns produtos e serviços deve ser aprovado pela Casa.
Dos 22 projetos originais, nove saíram da pauta. Os 13 restantes devem ser votados até o dia 15. As medidas planejadas pelo governo resultariam em saldo positivo de R$ 27,8 bilhões nas contas de 2017 e 2018 e incluíam cortes de gastos, aumento de receita mediante maior contribuição previdenciária e extinção de programas sociais.
Esta previsão agora é ao menos R$ 12 bilhões menor.
Entre diversas e contundentes críticas ao Executivo --chegou a declarar que "o governo não existe"--, o deputado disse ter alertado Pezão há mais de um ano e meio sobre a necessidade de "tomar medidas imediatas" e criticou o governador por não ter se antecipado à crise: "ele nada fez".
PIcciani se esquivou sobre o fato de ser presidente regional do mesmo partido que o governador: "Eu não estou aqui para cuidar da questão do governo. Eu sou o presidente do Parlamento. Tem o líder do governo e o líder do partido do governador, do meu partido."
O UOL solicitou entrevista com o governador para que ele pudesse comentar as declarações de Picciani, mas foi informado por sua assessoria de imprensa que "não há disponibilidade na agenda no momento".
O presidente do PMDB estadual, por sua vez, elogiou o antecessor de Pezão, o ex-governador Sérgio Cabral, preso desde o mês passado e indiciado por suspeita de encabeçar um esquema de pagamento de propina em obras do Executivo.
"É o melhor quadro que o PMDB tem", declarou.
Leia a seguir alguns dos principais trechos da entrevista:
Crise no Rio
"É a maior gravidade que já se viveu. No ano de 2015, nós já vínhamos do país com PIB zero, estagnado em 2014. Naquele ano, o governador Pezão mandou a esta Casa 47 projetos de lei que oneraram a folha de pagamento para o ano seguinte em R$ 11 bilhões.
Os sinais estavam evidentes de uma piora da economia.
E essa situação vai se agravar. Por isso, eu estou com o desgaste de ter que dizer aos sindicatos que eu tenho que levar adiante essas votações. Mas eu acho que tem que ter ajuda da União. O Estado do Rio vai entrar em colapso social e vai arrastar o Brasil."
Votação do pacote de austeridade
"Estou conversando com meus pares, mostrando que é importante a Alerj não ficar com o ônus de que não aprovou. Porque senão fica parecendo que o governo não resolveu porque nós não quisemos. O governo não resolveu por incompetência.
Em abril de 2015, esta Casa votou todas as leis que o governador mandou, dos aumentos de impostos --de ICMS, de IPVA, de ITD--, e ajudou na articulação com o Tribunal de Justiça para o fundo do Judiciário. E aprovamos também mais R$ 7 bilhões.
Nós que contribuímos no ano de 2015 inteiro, e no ano de 2016, devemos contribuir agora no final do ano, mas dentro da coisa razoável.
Uma coisa razoável é o aumento de impostos, onde a gente vai ter que reequilibrar na energia. [No projeto de governo, o limite de consumo sem alteração na taxa] sai de 300 kW para 200 kW. Então nós temos que voltar ao 300 kW para ser mantida a alíquota de 18%
Cerveja, chope, fumo, a pessoa pode equilibrar se vai tomar duas ou uma cerveja, se vai fumar dois maços de cigarro ou um e meio. Então, os tributos, eu acho que nós temos que caminhar no sentido de aprovar.
Nós temos a questão do Renda Melhor Jovem, que atinge as famílias de mais baixo IDH [Índice de Desenvolvimento Humano]. Como é que a gente tira isso de uma hora para outra?
O Estado não tem dinheiro, mas temos que ver onde é possível corrigir.
Hoje está mais radicalizado, mas os deputados jamais deixaram de discutir e aprovar as medidas --com alterações, como vão ter alterações agora."
Governo Pezão
"Eu vim a público e disse que não tem governo, não tem quem coordene, o governador nada entende. O Estado é de uma desorganização... Não era assim não, mas conseguiram fazer uma balbúrdia no Estado que não é simples.
Talvez, se ele tivesse escolhido quatro ou cinco projetos, elaborado bem, e discutido mais transparentemente, fosse mais fácil convencer a maioria aqui.
É o pior momento: salário atrasado, as pessoas recebendo em parcela, sem garantia do mês seguinte, um mês trepando no outro --já estamos em dezembro e ainda não se acabou de pagar o mês de outubro--, sem nenhuma garantia de 13º.
Em abril do ano passado, eu o procurei. A arrecadação federal do último quadrimestre de 2014 havia sido divulgada, e já apontava para o primeiro trimestre de 2014 uma queda brutal. Eu alertei: 'governador, é preciso tomar medidas imediatas.'
Ele disse: 'não, não, não, eu vou esperar porque a [então presidente] Dilma [Rousseff] vai me ajudar e eu vou chegar no zero a zero no fim do ano'."
Protestos na Alerj
"O ambiente é tão inóspito, que é compreensível a angústia, a revolta até, sobretudo de aposentados que estão atrasando mais os salários, os pensionistas. Mas não vai ser com a força física que nós vamos resolver. Isso levou a essa praça de guerra que nós estamos aqui na frente.
Depois que invadiram aqui, destruíram a sala da vice-presidência, eu tive que exigir do secretário de Segurança e do governador que eles pudessem garantir o funcionamento dos outros poderes.
Ele apresentou um plano que dizia que não teria como garantir a segurança se não cercasse e não tivesse uma zona neutra. Não tive outra solução a não ser autorizar e dizer 'a responsabilidade é de vocês'. Estava muito radicalizado.
Estão ameaçando jogar um deputado na lata do lixo. O que é isso?
A primeira coisa que eu quero fazer quando tiver ambiente é tirar as grades. Agora, se tivesse tirado, teriam invadido mesmo. Teria tido morte aqui dentro. Na Alerj nunca se entrou ninguém armado. Na invasão que fizeram aqui, as pessoas estavam armadas.
Tem pessoas desse movimento --que é legítimo, mas desorganizado-- que estavam bebendo o dia todo. E com arma na cintura."
CPI das Isenções Fiscais
"Durante um ano e meio, o governo sonegou informações [sobre os beneficiários de isenções fiscais] a esta Casa e à sociedade. Houve insistência, sempre prometeram, nunca trouxeram. Como são feitos por decreto, [...] é uma caixa preta.
A falta de transparência levou a essa confusão.
A Volkswagen vai anunciar R$ 1,5 bilhão de investimento na MAN, sua fábrica de caminhões. Sem incentivo, não teria vindo para cá. Você tem uma guerra fiscal no país, é preciso discutir isso dentro do pacto federativo. Mas quando você não tem transparência, fica tudo ilegítimo.
[Em novembro] o secretário-geral da Mesa chegou e mostrou o requerimento com 24 assinaturas, que é um terço [dos 70 deputados]. A CPI [Comissão Parlamentar de Inquérito] é um instrumento da minoria.
Em outras circunstâncias, talvez a gente discutisse, tentasse convencer alguns da impropriedade. A base do governo não funcionou. Eu não estou aqui para cuidar da questão do governo. Eu sou o presidente do Parlamento. Tem o líder do governo e o líder do partido do governador, do meu partido."
Sérgio Cabral
"Nós vivemos em um regime democrático conquistado a duras penas. O governador Sérgio Cabral tem o direito a se defender. Ele está amargando uma prisão preventiva sem nenhum processo, nenhuma denúncia, ainda.
Eu tenho a esperança que ele prove sua inocência. Eu torço muito. Sou amigo dele, gosto muito dele. É o melhor quadro que o PMDB tem. Então não há hipótese dentro do PMDB de falar em expulsão do Sérgio Cabral."
Eduardo Paes
"É o candidato do partido e é o meu candidato [ao Governo do Estado]. O Eduardo é preparadíssimo, é o melhor gestor público que eu conheci em termos técnicos, vai pegar em um outro ambiente, que é o início de 2019.
Ele tem capacidade de fazer diagnósticos e tomar as medidas necessárias no início, quando você tem gordura e credibilidade. Esse problema do Rio não vai ser eterno. Agora, que nós vivemos um momento mais angustiante, nós vivemos."
Impeachment contra Pezão
"Os pedidos [protocolados no início do ano] não tinham objeto, se baseavam na questão do parcelamento do 13º salário de 2015, que é uma coisa grave do governo. Isso é perda de credibilidade, mas o objeto caiu, porque era o 13º.
Eu tenho muita cautela com essa questão do impeachment, porque isso não resolve o Rio de Janeiro não. Não tem mágica. Vai entrar o vice [Francisco Dornelles] e vai continuar o mesmo problema. Aliás, o vice ficou aí seis ou sete meses."
Possibilidade de assumir governo
"Não há hipótese, nem que seja por um mês. Quero contribuir com o Estado na posição que estou.
Eu acho que tem quadros muito mais preparados do que eu. Eu espero que o governador e o vice saiam disso, mas se ocorrer o pior, vai ser eleição indireta. E essa Casa saberá escolher um nome da sociedade que possa ajudar o Rio de Janeiro mais do que nós.
Nós vamos ajudar muito."
Filho convidado para a Casa Civil
"O governador o convidou [Rafael Picciani, atual secretário executivo de Coordenação de Governo da Prefeitura do Rio] e conversou comigo dizendo que ele havia pedido um prazo, e perguntou o que eu achava.
Eu disse: 'o senhor já convidou ele, eu não acho nada, mas se o senhor tivesse me perguntado antes, eu diria ao senhor que eu sou contra'."
Governo Temer
"Começa com baixa popularidade porque assume um governo de baixa popularidade, com uma crise econômica e política devastadora. Mas tem uma equipe econômica de primeira linha, que passa credibilidade nacional e internacional.
Eu acho que o [presidente Michel] Temer (PMDB) está no caminho certo, mas com falta de sorte na questão política.
Ele perdeu o [senador e ex-ministro do Planejamento] Romero Jucá (PMDB-RR), que é um 'quadraço', extremamente eficiente, e que continua ajudando, mas que se estivesse no Planejamento, ajudaria o país muito mais.
Ele perdeu o [ex-ministro-chefe da Secretaria de Governo] Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), que apesar deste jeito, do temperamento esquentado, e que cometeu um erro grave, mas primário, era um articulador político importante."
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