PF indica que Geddel e Cunha intermediaram ao menos R$ 1,2 bi em empréstimos da Caixa
O ex-ministro da Secretaria de Governo Geddel Vieira Lima (PMDB-BA) e o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ) teriam intermediado pelo menos R$ 1,2 bilhão em operações financeiras de empresas privadas junto à CEF (Caixa Econômica Federal). A informação está em um pedido de busca e apreensão feito pela Polícia Federal em novembro de 2016 ao STF (Supremo Tribunal Federal). Nesta sexta-feira (13), Geddel foi alvo da Operação Cui Bono?, que apura um esquema de corrupção que facilitava a concessão de crédito da Caixa para empresas privadas e prefeituras. Segundo o MPF, Geddel e Cunha participavam do esquema.
Em novembro de 2016, a PF enviou um pedido de busca e apreensão ao ministro do STF Teori Zavascki, responsável pela Operação Lava Jato na Suprema Corte. O pedido foi enviado ao STF porque, à época, Geddel tinha foro privilegiado por ser ministro de Estado. Com a saída de Geddel do governo, no dia 25 de novembro, o caso foi então encaminhado à Justiça Federal do Distrito Federal.
Do total de R$ 1,230 bilhão que, segundo a PF, foi intermediado por Geddel e Cunha, R$ 300 milhões teriam sido liberados para a concessionária de rodovias BRVias; R$ 50 milhões para a Oeste-Sul Empreendimentos Imobiliários, R$ 350 milhões para empresa do setor de frigoríficos Marfrig, R$ 500 milhões para a J&F Participações S.A e R$ 30 milhões para a empresa Big Frango. Esse total foi levantado pelo UOL com base nos diálogos reproduzidos pela PF no documento apresentado ao STF e leva em consideração apenas as operações em que os interlocutores demonstram terem atuado diretamente na liberação de recursos.
As investigações sobre a atuação de Geddel em favor de empresas começaram a partir da apreensão de um telefone celular de Cunha durante a Operação Catilinárias, em dezembro de 2015. A PF encontrou mensagens de texto no celular do ex-presidente da Câmara referentes ao período em que Geddel foi vice-presidente de Pessoa Jurídica da CEF, entre 2011 e 2013.
No pedido de busca e apreensão, a PF enumera o que classifica como intervenções de Cunha e Geddel em favor de diversas empresas. As intervenções, segundo a PF, ficaram evidentes a partir da análise de mensagens de texto trocadas entre Geddel, Cunha, o ex-vice-presidente de Fundos de Governo e Loterias Fábio Cleto.
Entre as mensagens reproduzidas pela PF no pedido, estão conversas que evidenciariam a atuação do grupo para agilizar a liberação de R$ 300 milhões para a BR Vias.
De acordo com o relatório da PF, Cunha, usando o codinome “Lopes”, manda uma mensagem no dia 24 de maio de 2012 para Fábio Cleto, que usava o codinome “Gordon Gekko”, para checar se a operação pleiteada pela empresa havia sido concretizada. “Ve para mim se ta pegando algo na br vias la ainda que o maluco ta falando (sic)”, diz a mensagem. Gordon Gekko é o nome do personagem corrupto interpretado por Michael Douglas em dois filmes dirigidos por Oliver Stone e que abordam o sistema financeiro: "Wall Street - Poder e Cobiça", de 1987 (que rendeu o Oscar a Douglas), e "Wall Street - O Poder Nunca Dorme", de 2010.
O “Maluco” citado nesta mensagem, de acordo com a PF, é o doleiro Lúcio Funaro. Cleto responde: “Ok”. Mais tarde, Cleto informa Cunha que a transação estava em ordem. “Processo da BR Vias esta ok, sera assinado amanhã. Desembolso semana que vem (sic)”, disse Cleto. Cunha, então responde: “Ok”.
No dia 2 de junho de 2012, Cleto manda outra mensagem para “Lopes”. “Confirmado que BR Vias sera feito o crédito segunda-feira, de 300mm [R$ 300 milhões] em uma parcela so (sic)”, diz Cleto. “Lopes” responde: “Maravilha. Enfim uma notícia boa”.
Voto e pagamento
O pedido da PF também traz trocas de mensagens entre Geddel, Cunha, Cleto e Funaro em relação à liberação de recursos da Caixa para outras empresas, como a Marfrig.
No dia 1º de agosto de 2012, Geddel envia uma mensagem a Cunha informando que um conselho deliberativo da CEF iria aprovar um pedido de liberação de crédito para a Marfrig.
“Voto Mafrig aprovado hoje em eletrônica (sic)”, disse Geddel. O então vice-presidente da CEF manda outra mensagem alertando Cunha. “Esta em votacao eletrônica no CD [Conselho Deliberativo] duas operações da Marfrig [...] pareceres sem impedimento. Opiniao de voto favorável. Já foi,Agora ´c vc”, diz Geddel. Cunha responde: “Ok”.
Ainda de acordo com o pedido da PF, a informação dada por Geddel de que a liberação do crédito à Marfrig havia sido aprovada coincide com a data em que a empresa depositou R$ 469 mil na conta bancária da Viscaya Holding, empresa de Lúcio Funaro.
A PF sustenta que os “diálogos não deixam dúvidas” de que Geddel e Cunha “buscavam contrapartidas indevidas junto às diversas empresas mencionadas” e que os valores pelas intermediações eram recebidos por meio de empresas de Lúcio Funaro. A PF diz ainda que é preciso aprofundar as investigações para descobrir se esses recursos eram usados para abastecer o PMDB.
Outro lado
Por meio de nota, um dos advogados de Cunha, Pedro Ivo Velloso, informou que a defesa do ex-deputado "não teve acesso até o momento à investigação, mas, desde já, rechaça veementemente as suspeitas divulgadas”.
A defesa de Geddel afirmou, por meio de nota, que a "operação decorre de ilações e meras suposições". O advogado Gamil Föppel diz, no texto, que a investigação "não aponta concretamente qualquer valor que tivesse recebido" pelo ex-ministro. A defesa também nega que Geddel tenha cometido "atos de corrupção ou lavagem de dinheiro".
A CEF, por sua vez, disse, em nota, que o “banco está em contato permanente com as autoridades, prestando irrestrita colaboração com as investigações, procedimento que continuará sendo adotado".
A empresa Oeste Sul Empreendimentos Imobiliários disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que “não recebeu notificação oficial sobre o assunto, mas está à disposição para qualquer esclarecimento".
A BR Vias, também por meio de sua assessoria, disse reafirmar que “que segue colaborando com as autoridades para o total esclarecimento dos fatos".
A JBS enviou nota dizendo que a empresa “não foi alvo da operação Cui Bono? realizada hoje pela Polícia Federal e não foi notificada sobre a decisão judicial referente a essa operação”. A JBS disse que “pauta suas relações na ética e profissionalismo e tem convicção da regularidade das suas práticas”.
Em uma nota específica sobre a Marfrig, o grupo disse que “as operações com tal instituição financeira [CEF] sempre foram feitas em condições de mercado, com custos equivalentes aos dos bancos privados, com garantias reais e sem qualquer tipo de privilégio”.
A J&F Investimentos, por sua vez, disse que todas as relações entre as empresas que fazem parte do conglomerado com a CEF “são feitas sempre de forma profissional e na mesma forma de concorrência e tratamento com instituições privadas”.
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