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Como a PF descobriu um esquema de fraude na Caixa a partir do celular de Cunha

Geddel foi o sexto ministro de Temer a cair em seis meses

Band Notí­cias

Do UOL, no Rio

13/01/2017 15h29

Com roupas camufladas e grande aparato policial, agentes da PF bateram à porta do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB), em 15 de dezembro de 2015, com objetivo de cumprir mandados da Operação "Catilinárias" --um dos desdobramentos da Lava Jato. A ação resultou na busca e apreensão de três celulares do peemedebista.

Cunha costumava se comunicar por meio de SMS e WhatsApp com jornalistas, políticos e todos com quem se relacionava. O ex-deputado --que seria preso menos de um ano depois, em outubro de 2016-- era tido como usuário "contumaz" desse tipo de tecnologia, informou o UOL, na ocasião.

Os aparelhos apreendidos continham históricos de centenas de conversas mantidas pelo ex-presidente da Câmara ao longo de várias semanas ou meses.

Após análise da perícia, constatou-se uma "intensa troca de mensagens eletrônicas" entre Cunha e o também peemedebista Geddel Vieira Lima, ex-ministro da Secretaria de Governo do presidente Michel Temer --ele renunciou ao cargo depois de uma confusão com o ex-ministro da Cultura Marcelo Calero em novembro do ao passado. Geddel também foi ministros do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa Econômica Federal na gestão Dilma Rousseff.

Em 2015, a PF fez buscas na residência oficial do então presidente da Câmara - Dida Sampaio/Estadão Conteúdo - Dida Sampaio/Estadão Conteúdo
Em 2015, a PF fez buscas na residência oficial do então presidente da Câmara
Imagem: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo

As conversas indicam, segundo a PF, que os caciques peemedebistas e outros investigados obtiveram supostas vantagens indevidas em troca da liberação para grandes empresas de créditos com Caixa.

Com base nessas informações, policiais federais realizam nesta sexta-feira (13) a Operação "Cui Bono?". São sete mandados de busca e apreensão em endereços residenciais e comerciais no Distrito Federal, na Bahia, no Paraná e em São Paulo. As ordens são da 10ª Vara de Justiça Federal, no Distrito Federal.

Na versão da Polícia Federal, o inquérito tem por objetivo apurar se Geddel, então vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa, e os demais cometeram os crimes de corrupção, quadrilha e lavagem de dinheiro.

Em representação enviada à Justiça federal, o MPF (Ministério Público Federal) destaca alguns trechos das conversas entre Cunha e Geddel, com menções nominais a empresas que seriam beneficiárias do esquema. "Os diálogos não deixam dúvidas de que Geddel Vieira Lima e Eduardo Cunha buscavam contrapartidas indevidas junto às diversas empresas mencionadas ao longo da representação, visando à liberação de créditos que estavam sob a gestão da vice-presidência de Geddel (...)", narra trecho.

Em 2012, por exemplo, os dois peemedebistas trocaram mensagens SMS que indicam atuação em favor da empresa Marfrig. Na conversa, Geddel diz a Cunha que "o voto sai hoje", em referência a operações de crédito que estavam em análise.

Depois disso, a Marfrig repassou R$ 469,5 mil à Viscaya Holding, de Lúcio Bolonha Funaro, que seria um dos operadores da propina destinada a Cunha. O executivo da Marfrig à época dos fatos, Marcos Antônio Molina dos Santos, que pleiteava a liberação do dinheiro, está sendo investigado.

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Policiais cumpriram mandados de busca e apreensão em imóveis de Geddel em Salvador
Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Caso tramitava no STF

Segundo as informações, o caso passou a ser da alçada da Justiça Federal do Distrito Federal depois que Cunha e Geddel perderam o foro privilegiado.

Geddel deixou o governo em novembro passado e Cunha teve seu mandato de deputado federal cassado em setembro. Ele está preso em Curitiba desde outubro.

"O caso tramitava no Supremo Tribunal Federal em razão de se tratar de investigação contra pessoas detentoras de prerrogativa de foro por função. Porém, em virtude dos afastamentos dos investigados dos cargos e funções públicas que exerciam, o Supremo decidiu declinar da competência e encaminhar o inquérito à Justiça Federal do DF", lembra a PF.

Direcionamento político

O esquema envolveria a liberação de recursos da Caixa para as companhias por meio de direcionamento político, com participação de Cunha, em troca de pagamento de propina. A PF não identificou as empresas investigadas na operação "Cui Bono?".

Por meio de nota, um dos advogados de Cunha, Pedro Ivo Velloso, informou que a defesa do ex-deputado "não teve acesso até o momento à investigação, mas, desde já, rechaça veementemente as suspeitas divulgadas. Tão logo tenha acesso à investigação, irá se pronunciar especificamente sobre cada acusação."

A defesa de Geddel afirmou, por meio de nota, que a "operação decorre de ilações e meras suposições". O advogado Gamil Föppel disse, no texto, que a investigação "não aponta concretamente qualquer valor que tivesse recebido" pelo ex-ministro. A defesa também negou que Geddel tenha cometido "atos de corrupção ou lavagem de dinheiro".

Ao UOL, a Caixa diz "que o banco está em contato permanente com as autoridades, prestando irrestrita colaboração com as investigações, procedimento que continuará sendo adotado pela Caixa".

A investigação cita os nomes das empresas BR Vias, Oeste Sul, Marfrig, J&F Investimentos, Grupo Bertin, JBS, Big Frango, Digibrás, Inepar, além da Prefeitura de Barra Mansa (RJ).

O gerente jurídico da Inepar, Paulo Franco, afirmou que "da parte da companhia, que tomou conhecimento hoje sobre o assunto, não identificamos nenhuma relação da empresa com as pessoas citadas, com instituições, com a Caixa e com os políticos citados. Não identificamos internamente nenhuma das informações que foram noticiadas".

A Oeste Sul informou, por meio de nota, que não recebeu notificação oficial sobre o assunto, e está à disposição para qualquer esclarecimento. A assessoria de comunicação da BR Vias disse que a empresa está "colaborando com as autoridades para o total esclarecimento dos fatos".

A JBS e a Big Frango informaram que não foram alvos da operação da PF. O grupo empresarial afirmou que "pauta suas relações na ética e profissionalismo e tem convicção da regularidade das suas práticas". Ainda segundo a JBS, a companhia mantém a transparência de todas as suas atividades "que são realizadas dentro da legalidade".

Já a Marfrig afirmou, em nota, que não foi alvo de qualquer medida da PF. Segundo a empresa, a Caixa ou qualquer um de seus fundos não são acionistas relevantes da companhia. A Marfrig nega ter tido privilégios por meio do esquema fraudulento. Ainda segundo o texto, as operações com o banco "sempre foram feitas em condições de mercado, com custos equivalentes aos dos bancos privados, com garantias reais". "Todas as operações contratadas durante o período apurado nas investigações (2011-2013) foram devidamente liquidadas no prazo e condições, não restando em relação a estas quaisquer débitos em aberto."

A J&F afirmou que as relações com a Caixa ocorreram "de forma profissional e na mesma forma de concorrência e tratamento com instituições privadas".

A Prefeitura de Barra Mansa afirmou que pretendia fazer um convênio com a Caixa para a gestão da conta bancária da prefeitura, em 2012. Diante da falta de resposta do banco, o governo municipal desistiu de fazer a proposta.

O UOL entrou em contato com o Grupo Bertin, que não enviou uma nota de posicionamento. A Digibrás não foi encontrada nos telefones da empresa de Manaus ou São Paulo, nem retornou o e-mail.