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Moro manda PF ouvir blogueiro que vazou notícia sobre Lula; defesa fala em arbitrariedade

O blogueiro Eduardo Guimarães (ao centro), do "Blog da Cidadania", deixa a PF em SP depois de ser ouvido por conta de um mandado de condução coercitiva expedido pelo juiz Sergio Moro - Marcos Bezerra/Estadão Conteúdo
O blogueiro Eduardo Guimarães (ao centro), do "Blog da Cidadania", deixa a PF em SP depois de ser ouvido por conta de um mandado de condução coercitiva expedido pelo juiz Sergio Moro Imagem: Marcos Bezerra/Estadão Conteúdo

Janaina Garcia

Do UOL, em São Paulo*

21/03/2017 12h01Atualizada em 21/03/2017 14h59

A Polícia Federal em São Paulo cumpriu na manhã desta terça-feira (21), na capital paulista, mandado de busca e apreensão e de condução coercitiva (quando o indivíduo é levado para depor obrigado) contra o blogueiro Eduardo Guimarães. Ele é editor do “Blog da Cidadania”, defensor de bandeiras da esquerda e crítico de políticos como o presidente Michel Temer (PMDB), da Operação Lava Jato, que acaba de completar três anos, e do juiz federal Sérgio Moro.

Guimarães também concorreu à Câmara de Vereadores de São Paulo, na eleição de 2016, pelo PCdoB --na chapa do então candidato à reeleição, Fernando Haddad (PT).

Segundo a assessoria da PF em São Paulo, o mandado foi expedido pela Justiça do Paraná a pedido da PF paranaense, que pediu ao órgão em São Paulo o cumprimento da medida. Ainda conforme a assessoria, Guimarães prestou depoimento a um delegado federal. Ele foi acompanhado por um advogado. A liberação ocorreu por volta do meio-dia.

Indagada sobre a razão da condução coercitiva, a PF em São Paulo não forneceu detalhes e alegou que só a PF em Curitiba poderia fornecê-los. Procurada, a assessoria da polícia paranaense ainda não se manifestou sobre o assunto.

Em seu perfil no Twitter, Guimarães é crítico ferrenho do juiz federal Sérgio Moro e da Lava Jato. Em sua página no Facebook, um texto publicado hoje de manhã informa que o blogueiro foi levado pela manhã de seu apartamento na zona sul de São Paulo para depor.

"É lamentável viver em um país em que a liberdade de imprensa está sendo pisoteada. E em que pessoas comprometidas com a informação e com a democracia sejam submetidas a todo tipo de constrangimento, por via da lei. A Constituição Federal garante aos jornalistas liberdade de expressão e proteção de suas fontes. Não podemos permitir mais esse arbítrio", diz o texto.

“Não entendi, e meus advogados não entendem a razão da condução coercitiva porque não me recusei a vir aqui depor”, afirmou o blogueiro. Segundo ele, a PF queria informações sobre quem repassara a ele, em maio do ano passado, a informação de que o ex-presidente Luiz  Inácio Lula da Silva seria levado a depor, também coercitivamente, pela PF em São Paulo, pela 24ª fase da Operação Lava Jato.

“Na verdade eles já sabem quem me passou a informação --uma fonte minha --de que Lula seria levado coercitivamente e teria seus sigilos quebrados”, afirmou. “Recebi de uma fonte as informações, antes, e eles queriam saber se eu tenho alguma ligação com a pessoa que vazou, mas não conheço essa pessoa. Disse que divulguei porque é meu trabalho jornalístico – meu trabalho é divulgar”, definiu.

Ao UOL, o advogado de Guimarães, Fernando Hideo, afirmou que a condução coercitiva hoje revelou “duas arbitrariedades bem claras”. “Pelo Código de Processo Penal, esse tipo de medida demanda qualquer intimação prévia, e isso não houve; a segunda arbitrariedade diz respeito à violação do sigilo de fonte, ao buscar essa informação com jornalista. Isso [o direito de manter sigilo sobre a fonte de informação]  está na Constituição”, declarou o advogado. 

Nos mandados de busca e apreensão assinados por Moro, aos quais a reportagem teve avesso, o magistrado não apenas autoriza a apreensão de aparelhos eletrônicos do blogueiro, como o "o exame e a extração de cópias de mensagens eletrônicas armazenadas nos endereços eletrônicos utilizados pelo investigado".

Além disso, o juiz permite aos policiais o acesso a "mensagens eletrônicas armazenadas em eventuais computadores ou em dispositivos eletrônicos de qualquer natureza, inclusive smartphones, que forem encontrados, com a impressão do que for encontrado e, se for necessário, a apreensão de dispositivos de bancos de dados, disquetes, CDs, DVDs ou discos rígidos".

No mandado de condução coercitiva, Moro estabelece que Guimarães não deveria ser levado algemado, salvo se, na ocasião, oferecesse "risco concreto e imediato à autoridade policial".

Procurada, a assessoria de imprensa de Moro, na 13ª  Vara Federal em Curitiba, não se manifestou sobre as críticas ao magistrado.

Em nota, a bancada do PT na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) classificou a ação da PF como "autoritária" e "censura". "A Bancada dos deputados estaduais na Assembleia Legislativa se junta ao elo de protestos e indignação ao atentado à democracia e a liberdade de imprensa que atingiu o blogueiro Eduardo Guimarães, editor do Blog da Cidadania, levado coercitivamente à Superintendência da Polícia Federal de São Paulo, nesta terça- feira, às 6h da manhã".

"Aos moldes dos tempos sombrios da ditadura militar, o blogueiro está incomunicável, sem acesso a advogados e direito de defesa, sob a acusação de supostos vazamentos sobre a condução coercitiva do ex- presidente Lula, em março do ano passado", diz a nota.

Em entrevista coletiva em Brasília, o líder do PT na Câmara dos Deputados, Carlos Zarattini, afirmou que a decisão de Moro, sobre o blogueiro, foi "uma atitude arbitrária".

"Quando os grandes órgãos de notícia vazam notícias que geralmente são contra Lula e contra o PT, não tem problema nenhum. Mas quando um blogueiro que tem informações, vaza essas informações para que o público em geral tenha conhecimento da arbitrariedade das ações da Polícia Federal, o que acontece? Ele é preso. Então, não existe respeito ao direito de imprensa. É um verdadeiro absurdo o que aconteceu hoje", classificou.

* Colaborou Nathan Lopes